27 de fevereiro de 2010

Uso de antihipertensivos e hipotensão ortostática

Hipotensão ortostática em pacientes sob terapia antihipertensiva nas enfermarias de clínica médica do HULW/UFPB 
Rilva Lopes de Sousa-Muñoz, José Luís Simões Maroja, Edson Magno de Macedo Júnior, Xiankarla de Brito Pereira, Chiara Rocha Brandão

INTRODUÇÃO 
Cerca de 10% a 20% dos pacientes hospitalizados apresentam efeitos indesejáveis a medicamentos. A hipotensão ortostática (HO) é um para-efeito comumente atribuído ao uso de drogas vasoativas, sobretudo os antihipertensivos. Tais medicamentos constituem uma prescrição frequente para pacientes hospitalizados, porém a frequência de HO como efeito indesejável neste contexto clínico é pouco investigada.
Drogas como diuréticos, vasodilatadores e bloqueadores adrenérgicos centrais podem predispor à HO por interferirem nos mecanismos reflexos compensatórios da PA. Por isso, o controle do paciente em tratamento anti-hipertensivo deve ser sistematicamente feito em várias posições, pois a queda da pressão arterial (PA) pode determinar HO, especialmente no início da terapêutica (CARVALHO et al., 1994). 
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a PA deve ser rotineiramente medida na posição sentada ou supina seguida pela medida em posição ortostática (NETEA et al., 2002). Carvalho et al. (1994) definem HO como sendo a queda de 30% ou mais da pressão arterial sistólica (PAS), quando se assume a postura vertical após estar em posição sentada ou deitada. Por outro lado, Mader (1997) define como sendo a redução maior ou igual a 20 mmHg na PAS, ou redução maior ou igual a 10 mmHg após passar da posição supina ou sentada para a ereta. Andrade e Silva (1998), bem como Hachul (2002), consideram que apresentam HO aqueles pacientes que apresentam, além da diminuição maior ou igual a 20 mmHg na PAS ou PAD, associação de sintomas como tonturas, visão turva ou síncope, quando da mudança da posição supina para a posição ereta. 
O problema de pesquisa proposto é: se 10% a 20% dos pacientes hospitalizados apresentam efeitos indesejáveis a medicamentos, e os anti-hipertensivos são uma prescrição frequente neste contexto clínico, qual a freqüência de HO em uma enfermaria de clínica médica?

OBJETIVOS 
(1) Determinar os agentes hipotensores mais usados nas enfermarias de clínica médica (CM) do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW)/UFPB, e (2) Avaliar a frequência de hipotensão ortostática (HO) entre os pacientes em uso de tais medicamentos no referido serviço. 

METODOLOGIA 
 O estudo foi observacional e transversal. Foram incluídos no estudo 30 pacientes de sob tratamento anti-hipertensivo nas enfermarias de clínica médica do HULW/UFPB. Os critérios de inclusão foram: hipertensos em uso de anti-hipertensivo (em monoterapia ou associação) e idade acima de 18 anos. Os critérios de exclusão foram: arritmia cardíaca, doenças neurológicas, diabetes mellitus, alcoolismo, anemia, uremia e gravidez. Para coleta dos dados, foi elaborado um formulário para registro das medidas da PA, freqüência cardíaca e sintomas de hipofluxo cerebral. Considerou-se a ocorrência de HO como a redução maior ou igual a 20mmHg na PAS e/ou igual ou maior a 10mmHg na PAD após mudança de posição (NETEA et al., 2002; MADER, 1997), e/ou declínio de mais de 30% na PA média (PLUM, 1997). Foi feita a medida casual da PA pelo método indireto, com técnica auscultatória, empregando-se esfigmomanômetro de mercúrio devidamente calibrado. A pressão foi medida na posição supina e ortostática (sentada e em pé), em ambos os braços. Inicialmente mediu-se a PA na posição supina, e posteriormente mediu-se novamente a PA na posição sentada e em pé, três minutos após cada mudança de postura (CUNHA et al., 1997). A análise estatística foi descritiva e inferencial. As comparações foram feitas através de testes não-paramétricos (Mann-Whitney, Wilcoxon e Kruskal-Wallis) a 5%, usando-se o programa estatístico SPSS, versão 17 para Windows

RESULTADOS 
Estes são os resultados preliminares do estudo, que se encontra em fase de coleta de dados, atingindo-se 30% da amostra final calculada. A idade variou dos pacientes variou entre 19 e 83 anos, com média de 42,69 (±20,42) anos; 65,5% na faixa etária de 19 a 50 anos e 34,5% com idade superior a 50 anos, sendo 20% com 60 anos ou mais ; 55,2% do sexo masculino; 34,5% tinham como diagnóstico principal de doença renal, 27,6% de doença cardiovascular e 24,1% de doença endócrina. O número de anti-hipertensivos prescritos variou de 1 a 4 (1,66±0,77); 14 (48,3%) usavam monoterapia e 15 (51,7%) faziam uso de duas ou mais drogas. Em regime de monoterapia, um inibidor da enzima conversora (captopril) foi o mais empregado (34,5%), sendo seguido pelo diurético furosemida (31%), pelo beta-bloqueador propranolol (30%) e pela nifedipina (4,5%). Em associação, 60% usavam furosemida associada ao captopril, enquanto 40% usavam furosemida (ou hidroclorotiazida), captopril e nifedipina. 
Observou-se HO em sete pacientes (24,1%), sendo sintomática em 42,8% destes (visão turva, tontura). Houve diminuição significativa da PA média (p=0.02), e da PAS (p=0.0001) na mudança da posição supina para a sentada, conforme pode ser observado na figura 1. Não foi observada diferença entre a posição sentada e a posição em pé, assim como não se observou nenhuma alteração estatisticamente significativa na PAD. Não se observou relação estatisticamente significativa entre a ocorrência de HO e as variáveis idade, sexo e tipo de hipotensor usado. 

DISCUSSÃO 
A frequência de HO encontrada nesta amostra foi significativamente menor que a prevalência relatada por Potocka-Plazak & Plazak (2001), que observaram HO assintomática em 53.3% de uma amostra de mulheres hospitalizadas. No entanto, estas pacientes usavam vasodilatadores de ação direta em 30% dos casos. Na nossa amostra, predominou o uso de captopril, diuréticos, propranolol e associações destas drogas que, apesar de não apresentar um potente efeito direto, também podem levar a HO. 
Por outro lado, Panayiotou et al. (2002) não observaram significativa queda na PAM com a mudança de posição supina para ortostática em 40 pacientes hospitalizados em uso de terapia anti-hipertensiva. O mecanismo antihipertensivo dos diuréticos está relacionado, numa primeira fase, à depleção de volume e, a seguir, também pode levar à redução da resistência vascular periférica decorrente de mecanismos diversos. O propranolol tem um mecanismo anti-hipertensivo complexo, e além de envolver a diminuição do débito cardíaco (ação inicial), reduz a secreção de renina, leva à readaptação dos barorreceptores e diminuição das catecolaminas nas sinapses nervosas. O captopril age fundamentalmente pela inibição da enzima conversora, bloqueando, assim, a transformação da angiotensina I em II, com efeito vasodilatador. Assim, o efeito dessas drogas sobre a PA é determinada pela combinação de efeitos no tônus vascular e um efeito indireto mediado pelo reflexo barorreceptor. Diferenças no efeito da função barorreflexa afeta a responsividade a essas drogas, embora a sua magnitude não seja conhecida (JORDAN et al., 2002). É preciso salientar que há diferenças entre as características das amostras dos estudos citados e a nossa. Além disso, diferentes critérios foram usados para definir HO. 
Além disso, efeitos de alguns anti-hipertensivos sobre a PA casual sofrem influência de variações do ritmo circadiano em pacientes com hipertensão essencial, observando-se maior queda da PA à tarde e à noite (HAYASHI et al., 1995). Esta variável não foi controlada no nosso trabalho, pois as avaliações dos pacientes foram realizadas tanto no período da manhã como à tarde. 
A redução que foi observada na PA média da posição supina para a posição sentada foi acompanhada por um aumento significativo da FC, indicando uma HO simpaticotônica do ponto de vista fisiopatológico, como uma resposta cardíaca compensatória apropriada, sugerindo que os mecanismos autonômicos dos pacientes avaliados estão intactos (CUNHA et al., 1997). 
A ausência de relação de HO com a idade pode ter sido resultante do pequeno tamanho da amostra, uma vez que estes são resultados parciais do presente estudo. É possível que, com o aumento da amostragem, possam ser detectadas diferenças na redução da PA com a mudança de posição. No entanto, para Ferrari (2002), embora o envelhecimento seja acompanhado de significativas modificações cardiovasculares, tanto do ponto de vista estrutural quanto funcional, o controle barorreceptor da PA é relativamente preservado na meia-idade. 
Nesse sentido, Wang et al. (2002) compararam a função reguladora autônoma sobre o sistema cardiovascular entre homens jovens e de meia-idade para avaliar o efeito do envelhecimento sobre esta variável, não encontrando diferença na variação da PAS nem da PA média com a mudança de posição entre os dois grupos etários. No entanto, para os pacientes jovens a variação na sensibilidade barorreflexa correlacionou-se com variações na FC, enquanto que para os pacientes de meia-idade estas correlações não foram observadas, o que levou os autores a concluírem que entre pacientes de meia-idade correlações entre FC e função barorreflexa são reduzidas. No entanto, diferenças etárias nos mecanismos reguladores provavelmente devem ter contribuído para este achado. Não encontramos estudos abordando a relação entre ocorrência de HO e o sexo dos pacientes. 
Quanto à ausência de relação entre HO e tipo de antihipertensivo, tal achado também pode ser devido ao pequeno tamanho da amostra, pois os dados indicam um maior decréscimo da PA média em pacientes que usavam captopril e associações de drogas, embora esta diferença não tenha alcançado significância estatística.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 
(1) Os antihipertensivos mais usados nesta amostra foram os IECA e os diuréticos, observando-se igual frequência entre uso de monoterapia e associação de hipotensores; 
(2) A ocorrência de HO foi freqüente sendo assintomática em cerca de metade dos casos; A redução da PA com a mudança de posição ocorreu nos dados referentes à PA média e à PAS; 
(3) Em virtude das complicações que podem advir deste para-efeito dos hipotensores, esses pacientes deveriam ter como rotina o controle sistemático do tratamento anti-hipertensivo em posição ortostática. 

As referências bibliográficas mencionadas no texto acima podem ser solicitadas através de comentários após esta postagem ou pelo e-mail: rilva@ccm.ufpb.br.

Figura da postagem: Netter's Internal Medicine - 2nd Edition - http://www.netterimages.com/

24 de fevereiro de 2010

Publicação do Livro "Iniciação ao Exame Clínico" do GESME

Publicação do nosso livro "Iniciação ao Exame Clínico: Guia para o Estudante de Medicina", produzido no Grupo de Estudos em Semiologia Médica (GESME).

Apresentando o Livro

Esse trabalho consiste na exposição didática de elementos psicomotores e cognitivos essenciais para o aprendizado da semiotécnica médica, no que concerne ao exercício do exame clínico do paciente adulto. Esse texto tem por finalidade precípua servir de apoio à Disciplina de Semiologia Médica do curso de graduação em Medicina (Departamento de Medicina Interna, Centro de Ciências Médicas, Universidade Federal da Paraíba – UFPB).

Trata-se de um livro voltado para a graduação, para o aluno de Medicina, o monitor de Semiologia Médica e de outras disciplinas clínicas, assim como para o aluno do internato médico, visando ao exercício da prática e ao desenvolvimento das habilidades semiotécnicas requeridas para a formação do clínico generalista.

O estudante de Medicina tem os primeiros contatos com os pacientes no contexto clínico através da Disciplina de Semiologia Médica. Desta experiência inicial surgem, por meio do exercício da observação clínica e do contato inicial com os fundamentos do raciocínio diagnóstico, os elementos que permitirão ao estudante seguir os demais módulos didáticos da graduação, tanto de clínica médica quanto cirúrgica. Nessa perspectiva, o elemento pedagógico basilar é o aprendizado da realização da anamnese e do exame físico, aptidões psicomotoras que serão aperfeiçoadas durante as etapas posteriores do curso médico.

A Disciplina de Semiologia Médica é ministrada em um momento ímpar da formação médica, quando se dá a construção dos alicerces sobre os quais irá assentar toda a formação médica.

A parte prática do aprendizado de Semiologia ocorre em pequenos grupos, que são acompanhados por um professor durante todo o curso. O estudante de Semiologia aprende a fazer anamneses nas enfermarias, sob supervisão docente. É dessa forma que o estudante também desenvolve técnicas cognitivas no aprendizado do exame físico. Posteriormente, cada aluno, sozinho, fará anamneses e exames físicos, quando apenas ele e o paciente se encontrarão frente a frente.

Poder perceber o paciente e refletir sobre sua doença é uma das propostas dessa disciplina. É nesse contexto que o ensino da relação médico-paciente começa, pois o encontro estudante-paciente e, posteriormente, o encontro médico-paciente, constituem um fenômeno rico de significados.

O conteúdo do trabalho é resultado da execução de um projeto didático-pedagógico na Disciplina de Semiologia Médica, e inserido na programação acadêmica dos seus monitores, com o objetivo primário a padronização do ensino do exame clínico na disciplina.

Como forma de aperfeiçoamento das próprias habilidades na execução do exame clínico, exercitadas em sessões de discussão das técnicas de exame com os professores, os estudantes que exerciam a monitoria acadêmica de Semiologia Médica produziram inicialmente um conjunto de módulos didáticos referente às programações curriculares da disciplina. Esta revisão prática ocorreu simultaneamente a uma pesquisa bibliográfica sobre semiotécnica.

Posteriormente, a monografia assim produzida foi inteiramente revisada e aprimorada pelos professores da disciplina e de outros professores do Departamento de Medicina Interna, que agregaram ao trabalho sua experiência de ensino.

Os monitores graduandos do curso de Medicina que colaboraram na elaboração do material instrucional deste livro foram Adenylza Flávia de Paiva e Luana Dias Santiago (exame de cabeça e pescoço), Daniel Macedo de Lucena (exame do sistema respiratório), Mariana Honório de Azevedo (exame do sistema cardiovascular), Daniel Espíndola Ronconi (exame do abdome), Camila de Oliveira Ramalho (exame do sistema urinário), Bruna Nadiely Veloso (exame do sistema osteoarticular) e George Caldas Dantas (exame neurológico).

Em consonância com o conteúdo programático da disciplina, esta obra abrange temas de Semiologia Médica distribuídos em nove capítulos: (1) Anamnese; (2) Ectoscopia; (3) Exame de cabeça e pescoço; (4) Exame do sistema respiratório; (5) Exame do sistema cardiovascular; (6) Exame do abdome; (7) Exame do sistema urinário; (8) Exame do sistema osteoarticular; e (9) Exame do sistema nervoso.

No capítulo 1, a anamnese é apresentada de forma didática e detalhada, passo-a-passo, conduzindo o estudante no início de seu aprendizado da arte de entrevistar, além de instruir a maneira de como elaborar um relatório escrito do resultado de sua história.

O capítulo 2 versa sobre o exame físico geral do paciente. A descrição do exame físico começa com a explanação dos elementos da inspeção geral, para posteriormente, em unidades subsequentes, proporcionar o encadeamento do estudo de cada região. No capítulo 3 começa o exame segmentar, abordando-se o exame da cabeça e do pescoço. Os capítulos seguintes referem-se aos exames dos sistemas respiratório, cardiovascular, digestório, urinário, osteoarticular e nervoso. Todos os capítulos são iniciados por uma breve revisão da topografia anátomo-clínica própria daquele sistema, seguindo-se de informações relevantes de semiotécnica.

Na produção desse material didático, está implícita a idéia de que a tarefa didática exige um trabalho de preparação e organização de textos instrucionais, e tal tarefa deve ser feita predominantemente pelos próprios professores da disciplina em questão, considerando que o objetivo central é a formação adequada de profissionais médicos para a prática clínica, e não apenas a educação de pesquisadores.

Ressalta-se, por fim, que é preciso receber essa proposta como passível de contínuo aperfeiçoamento e permanente construção, pois o objetivo do presente trabalho começará a ser atingido se esse esforço conjunto possibilitar um subsídio inicial efetivo para a excelência do ensino de Semiologia Médica da UFPB e de todos que dele se servirem.

SOUSA-MUÑOZ, R. L. (Org.). Iniciação ao Exame Clínico: Guia para o Estudante de Medicina. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2010, 168 p.

18 de fevereiro de 2010

SEMIO-QUIZ: Monoartrite aguda

Paciente de 59 anos, sexo masculino, apresenta dor súbita e intensa, edema, rubor, calor e rigidez na articulação interfalangiana distal do segundo quirodáctilo.
Referência e diagnóstico serão adicionados posteriormente, após postagem de uma hipótese diagnóstica.
21/02/2010
Diagnóstico: Tofo gotoso.
Trata-se de uma manifestação da gota úrica. O paciente negava etilismo, diabetes mellitus, doenças renais e antecedentes familiares de gota. Referia hipertensão arterial sistêmica, mas não fazia uso de diuréticos. Há duas semanas fazia uso de terapia para câncer renal. Um dos principais fatores do surgimento do tofo gotoso é o controle inadequado do quadro hiperuricêmico. Neste caso, o tratamento para a neoplasia. Entram no diagnóstico diferencial artrite séptica, osteoartrite, celulite, artrite reumatóide. Referência da publicação original: WIESNER, T.; FRIED, I. Images in clinical medicine. Gouty tophi. N Engl J Med 361 (21): e49, 2009. Medical University of Graz, Graz, Austria.

16 de fevereiro de 2010

A obesidade é fator de risco independente para sobrecarga de átrio esquerdo

STRITZKE, J. et al. The aging process of the heart: Obesity is the main risk factor for left atrial enlargement during aging. The MONICA/KORA (Monitoring of Trends and Determinations in Cardiovascular Disease/Cooperative Research in the Region of Augsburg) study. J Am Coll Cardiol 54: 1982–1989, 2009.

Resumo (tradução nossa)

OBJETIVOS: Este estudo prospectivo avaliou a associação entre obesidade e hipertensão, com volume atrial esquerdo (AE) por mais de 10 anos.

JUSTIFICATIVA: Apesar de sobrecarga atrial esquerda (SAE) ser um fator de risco independente para fibrilação atrial, acidente vascular cerebral e morte, existe pouca informação disponível sobre os determinantes do tamanho do AE na população em geral.

MÉTODOS: Os participantes (1.212 homens e mulheres, idade 25 a 74 anos), procedentes de uma amostra aleatória estratificada de residentes da área Augsburg da Alemanha (Estudo MONICA/KORA). O volume atrial esquerdo foi determinado pela ecocardiografia no início e novamente depois de 10 anos. O volume atrial esquerdo foi ajustado à altura do corpo.

RESULTADOS: No início do estudo, a prevalência de SAE foi de 9,8%. Tanto obesidade quanto hipertensão foram preditores independentes de SAE, obesidade (odds ratio [OR]: 2,4, p = 0,016) apresentando risco superior que a hipertensão (OR: 2,2; p = 0,001). O maior volume ajustado foi encontrado no grupo de obesos hipertensos. Esse grupo também apresentou o maior aumento no volume atrial e a maior incidência (31,6%) de SAE durante o seguimento.

CONCLUSÕES: Na população em geral, a obesidade parece ser o fator de risco mais importante para a SAE. Dada a crescente prevalência da obesidade, intervenções precoces, especialmente em jovens obesos, são essenciais para prevenir o aparecimento precoce de remodelação do átrio esquerdo.

Fonte da figura desta postagem: www.burnham.org

13 de fevereiro de 2010

Um "guia" para a relação médico-paciente

Resenha do livro "Relación clínica: Guía para aprender, enseñar e investigar" organizado por Roger Ruiz Moral; apresentada por Perosa (2008) na Revista "Interface: Comunicação, Saúde, Educação"
Segundo Perosa (2008), neste livro o autor se propõe a abordar um tema recorrente dos manuais de Psicologia Médica: a relação médico-paciente. Cumpre tal objetivo com qualidade e tem particularidades que recomendam sua leitura e uso nas práticas de ensino e educação permanente em saúde. Dentre estas, pode-se apontar o fato de ter sido elaborado e orientado para a atenção primária à saúde, por docentes e médicos de família que atuam neste campo. Ainda que voltado especialmente para médicos de família, não se restringe a estes e, certamente, será útil a médicos de qualquer especialidade, bem como a enfermeiros e residentes. Diferentemente de outros compêndios, como guia, sugere exercícios em habilidades comunicativas e traz situações que permitem ao leitor refletir sobre sua própria experiência, à luz de novos conhecimentos e habilidades. Estruturado com base em metodologia aplicada em oficinas e cursos de formação, o autor pretende apoiar a aquisição de habilidades comunicativas essenciais à prática médica, ao aprimoramento da relação com pacientes e alunos e a uma práxis reflexiva na rotina do exercício profissional, a qual os autores propõem em oposição a uma prática automatizada. Coerente com tal assertiva, seus autores entendem cada encontro médico-paciente como único e singular, exigindo do profissional, a todo momento, habilidades na escolha e no desempenho de estratégias que estabeleçam uma boa relação. O organizador, Roger Ruiz-Moral, é docente e médico de uma unidade de saúde da família, em Córdoba, Espanha, onde pôs em prática e aplicou as estratégias propostas, em centenas de cursos de formação médica continuada, seminários e oficinas, por todo o território espanhol. Ruiz-Moral toma como premissas, na construção deste guia: o entendimento de que, na atenção primária, uma boa relação comunicativa é tão importante quanto uma atuação clínica "tecnicamente" correta; que a comunicação e a relação médico-paciente podem ser aprendidas, ou seja, são áreas de capacitação e, portanto, elementos-chave na formação do profissional de saúde. Por fim, reconhece que a forma mais efetiva de adquirir e modificar atitudes é promovendo comportamentos, ao invés de oferecer recomendações bem-intencionadas sobre como o médico deve se comportar e o que deve fazer. Estruturado em três partes bem definidas e articuladas, Relación clínica apresenta, inicialmente, o marco conceitual que orientou sua elaboração: as evidências científicas que fundamentam a relevância da relação médico-paciente e seu lugar na Clínica. Com base no conceito de "semiosis ilimitada" de Umberto Eco, Ruiz-Moral define a entrevista clínica como um espaço semiótico, no qual uma imensa variedade de signos são interpretados de múltiplas formas pelos participantes podendo, assim, levar a ações bem diversas por seus interlocutores. A esta noção incorpora o conceito de estrutura rizomática, na qual a comunicação é acêntrica, seus sujeitos ocupam posições intercambiáveis, definidas apenas pelo seu estado, em um momento dado. Sob esta articulação "semiótico–rizomático" Ruiz-Moral define a relação clínica como:
um ato relacional, que se produz em um contexto institucional, histórico, cultural, social, temporal e físico, entre protagonistas com bagagens históricas, culturais, sociais, e físicas diversas que, neste processo e em função de tudo o que ocorreu anteriormente, se comunicam a partir de um tipo particular de signos, construindo e selecionando significados. (p.28)
Contrariamente à forma como se estrutura a maioria dos cursos de Semiologia, em que o aluno aborda o paciente com um roteiro, a definição acima implica uma prática diversa. Considerando que os objetivos principais da consulta não se apresentam de modo linear ou hierárquico, e que o ato clínico não se limita a um encontro ou ação pontual, a consulta deve ser vista como ponto de partida de novos processos relacionais. O núcleo principal do livro, por sua vez, está organizado em quatro capítulos, nos quais se detalha uma estrutura básica de currículo de habilidades relacionais, que inclui: acolher o paciente, escutar, mostrar empatia, finalizar, perguntar, verificar o entendimento, integrar as informações, informar, negociar, motivar e facilitar a adesão. (...) Para ensinar a finalizar uma consulta, os autores fazem uma analogia com o modo como os apresentadores televisivos encerram seus programas, provocando o leitor a contrastar sua atuação como médico, nessa situação, à atuação do apresentador. Assim, lista os seguintes passos para um bom encerramento: orientar sobre a finalização, resumir a sessão, verificar a compreensão dos objetivos, oferecer apoio, despedir-se cordialmente. Cada uma destas etapas é tratada detalhadamente, com exercícios e relatos de sessões, conformando-se num excelente material para o treinamento dessas habilidades. As habilidades básicas (ouvir, perguntar, informar etc.) são, também, tratadas e assumem diferentes nuances em função dos objetivos estabelecidos em cada capítulo. Escutar o paciente, por exemplo, tem determinadas características quando o interesse é manter uma relação terapêutica de confiança ou quando se busca identificar e compreender os problemas de saúde do paciente. Da mesma forma, a habilidade de informar não é a mesma quando se quer partilhar decisões com o paciente e sua família, ou, ainda, quando se pretende ajudar o paciente e seus familiares a compreender o processo que vivem e a fazer escolhas. "Relación clínica" contempla, ainda, em sua última parte, a qualificação para ensinar a relação clínica, o desenvolvimento de pesquisas sobre a relação médico-paciente, e a avaliação da comunicação na relação clínica, com fins pedagógicos e de pesquisa. Deste modo, as bases da psicologia da aprendizagem, especialmente do adulto, são abordadas orientando-se por seu objeto: a relação clínica. Os princípios motivacionais de autores clássicos são aí tratados: Carl Rogers (aprendizagem significativa e ensino centrado no aluno), Maslow (o papel das motivações internas e externas) e Knowles (o papel da experiência prévia); bem como as metodologias de aprendizagem centradas no professor ou aluno. A avaliação das atividades profissionais, acadêmicas e de pesquisa é tratada com destaque, com reconhecimento da importância da avaliação contínua, envolvendo diferentes sujeitos: estudantes, professores, monitores, pacientes (simulados ou reais) e os próprios métodos de avaliação e seus instrumentos. Resenha (resumida) do livro "Relación clínica: guía para aprender, enseñar e investigar". Barcelona: Sociedad Española de Medicina de Familia y Comunitaria, 2004. Autoria da resenha: PEROSA, G. B. Interface (Botucatu), 12 (24): 211-213, 2008.

6 de fevereiro de 2010

O processo saúde-doença é um fenômeno social

A saúde e a doença não se reduzem a uma evidência “orgânica”, “objetiva”, mas estão intimamente relacionados com as características de cada sociedade.

Segundo Minayo (1991), cada sociedade tem um discurso sobre saúde-doença, que corresponde à coerência ou às contradições de sua visão de mundo e de sua organização social. A linguagem da doença não é, portanto, linguagem em relação ao corpo, mas à sociedade e às relações sociais. Seja qual for a dinâmica efetiva do “ficar doente”, no plano das representações, o indivíduo julga seu estado, não apenas por manifestações clínicas, mas a partir de seus efeitos. Nesse contexto, ele busca no médico, a legitimidade da definição de sua situação. Disso retira atitudes e comportamentos em relação ao seu estado e assim se torna doente para o outro, para a sociedade. Se o processo saúde-doença, enquanto fenômeno social, tem seu esquema interno de explicações que parte de um marco referencial do médico, mas também compõe o quadro da experiência do dia-a-dia, que se expressa através do senso comum. Essas duas modalidades de representação do fenômeno se influenciam mutuamente de forma dinâmica, embora o saber do médico seja dominante. Para a ciência positivista, a doença resulta de desvios para mais (hiper) ou para menos (hipo) das funções fisiológicas de órgãos e tecidos. Porém, para o paciente, a percepção da doença pode variar em função de sua inserção na sociedade e de sua visão de mundo condicionada por construções sociais. Nesse sentido, a doença e sofrimento humano não podem ser vistos por uma única perspectiva e que as posições teóricas atuais continuam desenvolvendo conversações que fazem avançar a discussão dessa questão. O conceito de experiência ganha, então, uma outra perspectiva, a de experiência socialmente constituída, na qual se apresentam estratégias que só são passíveis de análise quando se expressam como narração individual e intersubjetiva (portanto, social), mas entendendo nessa condição a presença de uma situação dialógica, levando à reflexão sobre como cada sujeito e comunidade exercitam o lugar da enfermidade.

Referência MINAYO, M. C. S. Um desafio sociológico para a educação médica. Rev Bras Educ Méd, 15 (1): 25-32, 1991.

4 de fevereiro de 2010

Semio-Quiz: Lesão cutânea ulcerada

A lesão cutânea do jovem paciente mostrado na figura acima começou há quatro meses como uma pápula indolor que evoluiu para nódulo com ulceração central. Não houve melhora com uso de creme à base de corticosteróide. A ulceração aumentou e apareceram lesões-satélites posteriormente. Qual é a sua hipótese diagnóstica com base nesses dados? Referência e etiologia serão adicionadas nesta postagem após chegada de uma hipótese diagnóstica.
(...)
10/02/2010
Diagnóstico: Leishmaniose Tegumentar
Referência da publicação original: Massachusetts Medical Society, NEJM v. 362, n. 5, fev 2010.