Por Bruno Melo Fernandes
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB, Campus I (Período 10)
Resumo O diabetes mellitus (DM) representa um grupo de distúrbios metabólicos marcados pela presença de hiperglicemia. O descontrole glicêmico e a desregulação metabólica do DM implicam uma série de manifestações sistêmicas, incluindo também alterações dermatológicas. É de importância clínica conhecer as alterações do tegumento associadas ao DM, assim como reconhecer as dermatoses mais prevalentes dos paciente diabéticos. Palavras-chave: Diabetes mellitus, dermatopatias, endocrinologia.
O Diabetes Mellitus (DM) constitui uma síndrome clínica caracterizada pelo fenótipo da hiperglicemia, a qual agrupa uma série de distúrbios metabólicos distintos cujas etiologias provêm de complexas interações entre fatores genéticos e ambientais. A depender do fator etiológico do DM, o quadro de hiperglicemia é propiciado pela secreção reduzida ou ausente de insulina, pela menor utilização da glicose a nível periférico, e/ou ainda pela maior produção orgânica de glicose.
Apesar de ser uma patologia de caráter basicamente endócrino, a desregulação metabólica do indivíduo com DM, em especial no metabolismo dos carboidratos, acarreta uma série de alterações fisiopatológicas secundárias em todos os outros sistemas orgânicos, sendo a pele, ou melhor, o tegumento em geral, um dos órgãos mais afetados.
Segundo FOSS (2005), cerca de 80% de todos os diabéticos apresentam alguma alteração dermatológica associada ao DM. As afecções dermatológicas associadas ao DM estão especialmente relacionadas à maior predisposição a infecções, à resistência insulínica periférica e à maior dificuldade de cicatrização tecidual; alterações essas tipicamente encontradas em portadores de DM.
Em todas as formas de diabetes mellitus (DM tipo 1, DM tipo 2, DM gestacional), há descrição bem documentada e evidenciada de um aumento da incidência de infecções que, em diabéticos, apresentam um curso clínico mais grave e constituem uma das complicações crônica frequentes na evolução da doença (SHAH; HUX, 2003). As causas dessa maior suscetibilidade não são totalmente esclarecidas, mas estudos sugerem relação com o defeito imunológico característico do diabético, assim como com as complicações degenerativas vasculares e nervosas.
As lesões cutâneas de origem infecciosa mais comuns em pacientes diabéticos, segundo Foss (2005), são as piodermites e as micoses superficiais, sendo as dermatofitoses as alterações dermatológicas mais comuns do DM. Entre as piodermites, os casos mais prevalentes são de foliculites, furunculoses, ectima e, em menor grau, erisipela. Entre as dermatomicoses, os quadros mais comuns são de onicomicose, tinea pedis e candidíase interdigital, com prevalência também aumentada de tinea cruris, tinea corporis e ptiríase versicolor. Foi evidenciado ainda que as afecções dermatológicas de origem infecciosa estão presentes principalmente naqueles pacientes diabéticos sem controle metabólico adequado.
Além das alterações de fundo infeccioso, o paciente diabético também é predisposto a alterações de pele de caráter degenerativo e metabólico, as quais se apresentam em geral de maneira mais crônica e insidiosa que os quadros infecciosos.
Nesse sentido, uma das alterações mais prevalente é a acantose nigricans, caracterizada pela presença de placas hiperpigmentadas aveludadas observadas em regiões do pescoço, axila ou superfícies extensoras. A acantose nigricans resulta tipicamente da acentuada resistência periférica à insulina, sendo mais comum nos diabéticos tipo 2, especialmente nos obesos. Muitas vezes, a acantose surge antes da instalação do quadro de DM propriamente dito, sendo uma alteração sinalizadora do descontrole metabólico, e possuindo, portanto, uma valor semiológico significativo.
Nos pacientes diabéticos com controle metabólico adequado, predominam as alterações dermatológicas de fundo degenerativo e metabólico como dermatite seborréica, elastose solar, ceratose seborréica e, especialmente, xerose cutânea. A pele xerótica, isto é, a pele seca, espessada e descamante, constitui a mais prevalente das alterações dermatológicas não-infecciosas associadas ao DM.
O diabetes mellitus também acelera o envelhecimento da pele e aumenta a incidência de doenças de pele normalmente relacionadas ao envelhecimento, como a xerose cutânea e as ceratoses.
A dermopatia diabética (pápulas pré-tibiais pigmentadas) começa como áreas eritematosas, que se transformam em regiões de hiperpigmentação circular. São resultantes de pequenos traumatismos mecânicos na região pré-tibial e mais comuns em homens idosos com DM.
Outras afecções dermatológicas mais comuns no paciente com DM, mas de prevalência pouco significativa, são o vitiligo, necrose lipóide diabética, o escleredema, o granuloma anular e a bullosa diabeticorum.
Além da alterações citadas, o DM implica ainda o aparecimento de uma variedade extremamente vasta de patologias dermatológicas, sendo impossível ao clínico conhecer todas de maneira aprofunda. O que é necessário então, é que o médico saiba reconhecer a lesões elementares da pele e o seus principais significados, e que tenha a iniciativa de fazer periodicamente um exame dermatológico detalhado e minucioso em todos os pacientes diabéticos, mesmo que não haja queixas, visto a maior parte das dermatoses apresentadas serem assintomáticas ou oligossintomáticas.
O exame do tegumento no paciente diabético tem valor diagnóstico e evolutivo na condução do DM, e o controle do próprio distúrbio metabólico é fator fundamental para que sejam evitadas complicações dermatológicas.
Referências
FOSS, N T et al. Dermatoses em pacientes com diabetes mellitus. Rev. Saúde Pública 39 (4): 67-682, 2005.
POWERS, A. C. Diabetes melito. In: FAUCI, A. S. et al. (Ed.) Harrison: Medicina Interna. 17. ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill, 2008, Cap. 338, p. 2275-2293.
SHAH, B. R.; HUX, J. E. Quantifying the risk of infectious disease for people with diabetes. Diabetes Care, 26:510-3., 2003
UK Prospective Diabetes Study Group (UKPDS). Intensive blood-glucose control with sulphonylureas or insulin compared with conventional treatment and risk of complications in patients with type 2 diabetes (UKPDS 33). Lancet, 352 (9131): 854-65, 1998.
Crédito da imagem: http://www.grupocompostela.org/