Por Jailson de Sousa Oliveira
Estudante de Graduação em Medicina da UFPB
O ensino do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), instituição da qual faço parte como aluno desde 2007, vem buscando formar profissionais que atendam as necessidades de saúde do país.
A busca de inserção dos estudantes em cenários de prática clínica torna-se limitada, entretanto, devido ao fato de haver poucos serviços de referência no Estado que se disponibilizem a receber estudantes em estágios extracurriculares, conforme preconiza a Lei nº 11.788/08, chamada "Lei do Estágio", que mantém a característica do estágio como atividade sem vínculo empregatício e a necessidade do auxílio dos agentes de integração.
A realização de estágios extracurriculares, a meu ver, faz-se necessária para a aquisição de experiência no tocante ao cotidiano de um médico. É nos estágios que o estudante de medicina tem a possibilidade de aprender “fazendo”, sob a orientação de profissionais do próprio serviço.
Em relação a isso, o Professor Sérgio Rego (REGO, 1998) salienta que a valorização da prática em estágios constitui-se um componente essencial da transformação do estudante em médico. É a busca pela aquisição dessa experiência uma das principais forças que mobilizam os alunos em seu período de formação - eles valorizam a experiência clínica e procuram adquiri-la sempre que possível.
O estágio que acabei de realizar no Serviço de Cardiologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) foi muito enriquecedor, tanto no tocante à aquisição de experiência na prática em Cardiologia, quanto em relação à possibilidade de vivenciar como funciona o internato em Medicina na Escola Paulista, uma vez que nesse mês em que estive lá, acompanhei junto com os internos do quinto ano médico o rodízio em Cardiologia.
O estágio era realizado no Hospital São Paulo, um hospital universitário que tinha uma estrutura muito boa, tanto fisicamente como em relação ao andamento do serviço. O andar da Cardiologia era composto pela enfermaria de Cardiologia Clínica, que totalizava 25 leitos, pela UTI Cardiológica, que possuía dez leitos, e pela UTI de Cirurgia Cardíaca, que também tinha dez leitos.
A infraestrutura em era muito boa, no entanto senti falta de uma sala de prontuários, uma vez que estes eram guardados em um móvel específico e não existia um ambiente onde pudessem ser discutidos os casos dos pacientes.
De início ocorreu uma apresentação do estágio por um dos professores da Disciplina de Cardiologia, que ressaltou que este seria eminentemente prático, mas que seriam realizados seminários pelos alunos e ministradas algumas aulas teórico-práticas sobre eletrocardiografia e arritmias cardíacas. O mesmo citou ainda que seríamos responsáveis pelas evoluções diárias dos pacientes e posterior discussão com os residentes de Clínica Médica e de Cardiologia.
O estágio funcionou da seguinte maneira: todos os dias pela manhã fazíamos as evoluções e discutíamos com os residentes os casos. Às 9h30, o professor chegava e eram escolhidos dois casos para serem discutidos com ele. As discussões eram realizadas à beira do leito dos pacientes, sendo estas baseadas na apresentação do caso por algum interno. O professor responsável realizava novamente o exame clínico, discutia as hipóteses diagnósticas, ressaltava os aspectos imprescindíveis a abordagem do paciente cardiológico, assim como discutia as condutas tomadas até então para aquele paciente.
O andamento das discussões dependia do professor, alguns discutiam mais o caso em si e as condutas, ao passo que outros preferiam discutir a doença de um modo mais geral. Aprendi muito nessas discussões, principalmente em relação às condutas colocadas para cada paciente, uma vez que realizava o exame clínico destes e podia discutir dúvidas e condutas com os residentes e com o professor.
Em um dia da semana, na terça-feira pela manhã tinha a reunião da Cardiologia. Nesta se reuniam professores, residentes de clínica médica e de cardiologia, médicos do serviço e internos para discussão de dois casos escolhidos pelos residentes e apresentação por alguns dos profissionais sobre o que tem de mais novo na área de Cardiologia. Essa reunião era muito interessante, desde os casos que eram levados à discussão até os assuntos apresentados pelos cardiologistas.
Dentre os assuntos discutidos durante o estágio destacaram-se os seguintes: novas diretrizes de hipertensão arterial, novas medicações para tratamento de fibrilação atrial, tratamento do paciente com insuficiência cardíaca e novas medicações no tratamento das síndromes coronarianas agudas.
Em uma dessas reuniões foi mencionado por um pós-graduando que a Escola Paulista de Medicina está incluída em 11 estudos multicêntricos em Cardiologia, alguns deles liderados pela Universidade de Duke, dos Estados Unidos.
Pude perceber que lá se tem uma maior oportunidade de crescimento em relação à participação em pesquisas de grande porte. Além disso, ocorre uma valorização muito grande por parte dos alunos, uma prova disso é que a maioria deles são alunos do Programa de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC).
Outro aspecto que me chamou atenção no estágio foi a realização das práticas de arritmias em um laboratório específico. Nesse laboratório, havia bonecos (manequins) e monitores acoplados a eles. O professor explicava então o ritmo que aparecia no monitor, assim como ensinava a conduta a ser tomada diante de cada ritmo referido. A prática de reanimação cardiopulmonar também foi realizada nesse laboratório de simulação.
No turno da tarde acompanhávamos os ambulatórios de Válvulas, Arritmias e Coronariopatia. Dividíamo-nos em grupos de três e realizávamos o atendimento. Quando da chegada do professor, discutíamos todos os casos, que totalizavam cinco ou seis casos por turno. Além disso, no fim da tarde, voltávamos para a UTI cardiológica e discutíamos pelo menos um caso de paciente que se internou na UTI recentemente. Pude ver muitos casos e conhecer o cotidiano do atendimento em Cardiologia.
Em dois dias da semana íamos para o serviço de Hemodinâmica, onde acompanhávamos os casos de pacientes que eram encaminhados para a realização de Cateterismo Cardíaco. Essa discussão ocorria junto com os residentes (R5) de Hemodinâmica, o que foi uma experiência muito interessante para conhecimento mais aprofundado dessa subespecialidade da Cardiologia.
A realização desse estágio na Cardiologia da UNIFESP foi, sem dúvida, uma vivência riquíssima, tanto do ponto de vista de aprendizado clínico, como na questão de crescimento pessoal, pelo desenvolvimento da habilidade em lidar com os pacientes com doença cardíaca, pelo contato com grandes cardiologistas e com o que tem de mais novo sendo estudado em Cardiologia.
Considero que a realização de estágios extracurriculares deve sim ser realizada e estimulada pelas Faculdades de Medicina, uma vez que permite ao aluno ter contato com serviços de referência e com o cotidiano médico.
Referência
REGO, S. Currículo paralelo em Medicina, experiência clínica e PBL: uma luz no fim do túnel?. Interface (Botucatu), v. 2, n. 3, p. 35-48, 1998 .
Foto da postagem: Arquivo pessoal de Jailson de Sousa Oliveira [Ligiana Leite, Jailson de Sousa e Mabel Soares].