Girolamo Fracastoro foi um médico e poeta italiano, nascido em Verona, Itália, que elaborou uma teoria racional sobre a infecção ainda em 1546, tornando-se pioneiro na afirmação de que várias doenças eram causadas por germes. Isso ocorreu 300 anos antes da comprovação experimental da existência de micróbios por Antoine Béchamp, Louis Pasteur e Robert Koch.
Coube, então, a Girolamo Fracastoro o mérito da primeira tentativa de analisar e compreender o contágio. Suas idéias acerca do contágio, que define como "uma infecção que passa de um ser vivo a outro ser vivo", são inspiradas na doutrina atomística de Leucipo e Demócrito. Aceitando que o corpo humano é constituído por um conjunto inumerável de partículas invisíveis e em constante movimento, Fracastoro, mesmo sem abandonar a teoria humoral, afirma que quando o indivíduo é atacado por uma doença infecciosa, ocorre no seu organismo uma "putrefação especial", que libera os "germes da doença", aos quais ele chamou de seminaria morbi (FERREIRA et al., 1996), ou "sementes da doença".
A sua principal contribuição para a Medicina foi o livro De contagione et contagiosis morbis ("Acerca do contágio e das Doenças Contagiosas"), publicado em 1546 e no qual afirmou que o contágio era causado por corpos minúsculos do agente causador da doença, facilmente multiplicáveis, passavam de um organismo infectado para o indivíduo sadio e aí, estes hipotéticos corpúsculos teriam o poder de se multiplicar no organismo do novo portador. Esta passagem se daria pela transmissão através de agentes inanimados ou fômites (roupas, objetos de uso manual, etc.) e à distância, pelo ar.
Em carta de Fracastoro a René Descartes, em 1547, lê-se o relato de suas idéias sobre o contágio:
Publiquei no início de 1546 o livro De contagione et contagiosis morbis et curatione, onde pela primeira vez foram descritas as enfermidades que podem classificar-se como contagiosas, incluindo a peste, a lepra, a tisis, a sarna, a raiva, a erisipela, a varíola, o antrax e o tracoma. Incluí ainda, como contagiosas, o tifo exantemático e a sífilis. (FRACASTORO, apud FERREIRA et al., 2010).
Em 1530 publicou seu poema com 1300 versos intitulado Syphilis Sive Morbus Gallicus, nos quais descreveu uma doença que assolava o mundo, a sífilis. No poema em três volumes, descreveu a sífilis e fez uma das primeiras descrições sobre o tifo exantemático, deu nome à doença, descreveu sua natureza e prescreveu seu tratamento.
Portanto, Girolamo Fracastoro foi um cientista do século XVI que descreveu detalhes de doenças e sua transmissão, comprovados somente alguns séculos depois, adotando para tanto a observação, o entendimento, a imaginação, a intuição e a dedução. De acordo com Ferreira et al. (1996), este "foi o primeiro passo, ainda incerto e tateante, numa longa caminhada", que continua ainda nos nossos dias.
Fracastoro teve pouca influência com suas idéias sobre o contágio, mas o interesse no seu trabalho foi reavivada no século XIX, quando surgiu a moderna teoria microbiana.
Referências
FERREIRA, L. A. P.; RAMOS, F. R.; ASSMANN, S. O encontro de Fracastoro com Descartes: reflexão sobre a temporalidade do método. Texto contexto - enferm. 19 (1): 168-175, 2010.
SOUSA, A. T. Curso de História da Medicina: Das Origens aos Fins do Século XVI. Lisboa: Calouste-Gulbenkian, 1996.
Figura: Retrato de Girolamo Fracastoro ("Dottore Fracastoro") feito por Tiziano Vecellio. Disponível em: http://www.nationalgallery.org.uk. Acesso em: 28 set. 2010.