30 de maio de 2012

Síndrome Isquêmica Crônica dos Membros Inferiores

Por Artur Bastos Rocha
Estudante da Graduação em Medicina da UFPB


Resumo
A síndrome isquêmica crônica de membros inferiores é um reflexo da doença oclusiva arteriosclerótica periférica, que dentre vários sítios de acometimento, afeta sobretudo a irrigação dos membros inferiores. Caracteriza-se por evolução insidiosa e sua manifestação clínica mais comum é a claudicação intermitente, traduzida clinicamente por dor ou sensação de aperto nos músculos da panturrilha durante a realização de exercícios físicos, cessando ou melhorando com o repouso. Úlceras de membros inferiores também podem ser observadas na doença arterial periférica crônica em percentual que varia de 5 a 10% dos casos das úlceras de perna. Podem ainda ser observadas palidez, hipotermia, cianose e áreas necróticas no membro comprometido nos casos mais graves. O diagnóstico é essencialmente clínico. A parte mais importante do exame físico para confirmação da doença arterial periférica é a palpação de pulsos periféricos. 

Palavras-Chave: Aterosclerose. Claudicação Intermitente. Isquemia.

A síndrome isquêmica crônica dos membros inferiores é a tradução clínica das doenças arteriais oclusivas periféricas, as quais apresentam como principal etiologia a aterosclerose. Sua prevalência na população geral é subestimada, pois uma elevada parcela significativa dos pacientes permanece assintomática nos estágios iniciais da doença. 
A isquemia de membro é qualquer decréscimo agudo ou piora da sua perfusão sanguínea,  que se apresenta como um conjunto de sinais e sintomas decorrentes da insuficiência arterial aos tecidos do segmento comprometido com risco de perda de partes ou de todo membro, se o tratamento não for eficiente (PITTA et al., 2003; BAPTISTA-SILVA; BURIHAN 1999). Mais de 90% dessas condições isquêmicas podem ser diagnosticadas clinicamente. Ao final do exame clínico, pode-se chegar a um diagnóstico anatômico e funcional e ao grau de acometimento. Segundo Baptista-Silva e Moraes-Souza (2010), "existem poucas áreas da Medicina nas quais as condições encontradas levam sozinhas tão rapidamente ao diagnóstico somente com base na história e no cuidadoso exame clínico, como acontece na doença vascular".
A síndrome isquêmica crônica de membros inferiores é definida, conforme o Segundo Consenso Europeu de Isquemia Crítica Crônica de Membros Inferiores (SECOND EUROPEAN CONSENSUS..., 1991) como o quadro de dor em repouso, persistente, requerendo analgésicos regulares por mais de duas semanas, ou ulceração ou gangrena no pé, e a pressão arterial sistólica máxima em nível do tornozelo e dos pododáctilos menor que 50 e 30 mmHg, respectivamente. Esta definição não tem ganho aceitação universal. A dor em repouso indica isquemia crítica.
Assim, a manifestação clínica mais comum e indicativa de síndrome isquêmica crônica de membros inferiores não é a dor persistente e em repouso, mas a claudicação intermitente, traduzida clinicamente por dor em forma de câimbras ou aperto dos músculos da panturrilha, durante a realização de exercícios físicos, cessando ou melhorando a sintomatologia dolorosa com o repouso. Com a evolução do quadro obstrutivo, as manifestações dolorosas se tornam mais frequentes e o tempo de recuperação gradativamente maior. Finalmente, a dor pode se manifestar no repouso, ser muito intensa e afetar os pododáctilos e o pé, principalmente à noite, quando o membro comprometido repousa em posição horizontal e há queda da temperatura ambiente, por mudanças climáticas. Podem ainda ser observados palidez, hipotermia, cianose e áreas necróticas no membro comprometido, nos casos mais graves (ALVES et al., 2003). Estas últimas alterações constituem o quadro sindrômico na isquemia crônica dos membros inferiores, pela insuficiência arterial no leito arteríolo-capilar, distorcendo a hemodinâmica e o metabolismo tecidual muscular.
A aterosclerose, de modo geral, acomete principalmente artérias de grande e médio calibres e, em se tratando de membros inferiores, o sítio mais comum de acometimento oclusivo são as artérias em porção infra-inguinal, com prevalência de 75% nessa topografia, podendo ocasionar variados graus de insuficiência arterial, desde isquemia muscular ao esforço (claudicação intermitente) até dor em repouso (isquemia crítica), com ou sem aparecimento de lesões tróficas (úlceras ou gangrenas). A dor tipo claudicação intermitente, em aperto ou em forma de câimbra, ocorre, com maior frequência, na musculatura posterior da perna, tanto nas obstruções do segmento arterial fêmoro-poplíteo como do eixo aorto‑ilíaco, e, nessa última eventualidade, a manifestação dolorosa pode acometer, também, a musculatura glútea e/ou a musculatura da coxa, adquirindo, então, um caráter de "cansaço" muscular (NEVES, 2010).
Úlceras de membros inferiores ocorrem em um percentual que varia de 5 a 10% dos casos das úlceras de perna (FRADE et al., 2005). Pacientes diabéticos ou com insuficiência renal são mais suscetíveis ao aparecimento de úlceras isquêmicas nos pés. Pequenos traumas no antepé levam à formação de úlcera e ruptura cutânea que, com a diminuição da perfusão tecidual, é incapaz de cicatrizar. O simples atrito entre os dedos isquêmicos adjacentes pode resultar em lesões chamadas de "úlceras se beijando" (HINCHLIFFE et al., 2012). 
Esta claudicação intermitente entra no diagnóstico diferencial da pseudo-claudicação, que ocorre em estenoses de canal lombar e compressões radiculo-medulares, onde não há associação específica com o esforço físico e o quadro álgico, diferente da claudicação vascular típica, onde a dor surge em associação ao esforço físico, sendo de conhecimento do paciente que após determinado movimento de uso exaustivo da musculatura ocorrerá o surgimento daquele quadro álgico, que tende a melhorar após o repouso (BARBOSA; DALE, 2008). 
Contudo, é importante compreender que ocorre frequentemente subdiagnóstico desta síndrome, em virtude da demora do surgimento de sinais e sintomas clínicos que evidenciam sofrimento vascular, devido ao fato da musculatura esquelética possuir uma tolerância relativamente elevada a eventos isquêmicos, devidos a sua baixa taxa metabólica em repouso, seu grande armazenamento de glicogênio e creatina e sua habilidade em manter as funções celulares básicas, na vigência da isquemia, através da glicólise anaeróbica (ALVES et al., 2003). O quadro clínico está intimamente associado à magnitude das alterações metabólicas no tecido muscular, a qual dependerá da evolução temporal do aparecimento da oclusão e da presença de circulação colateral, desenvolvida pelo organismo na tentativa de assegurar o aporte sanguíneo adequado ao membro afetado. 
Como mencionado inicialmente, a principal patogenia da isquemia crônica dos membros inferiores é a doença aterosclerótica, motivo pelo qual esta síndrome possui elevada morbi-mortalidade por ser um reflexo da doença aterosclerótica generalizada, em que a obstrução arterial promove outros quadros patológicos de pior prognóstico concomitantemente, com episódios de infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular encefálico isquêmico. 
A prevalência de isquemia dos membros inferiores é estimada em 2.000 casos por 100 mil habitantes, e aproximadamente 5% irão necessitar de intervenção vascular, dependendo da raça e das variações regionais (BAPTISTA-SILVA; BURIHAN, 1999). Estima‑se que a prevalência da arteriopatia obstrutiva crônica periférica seja inferior a 2% para homens com menos de 50 anos, aumentando para mais de 5% naqueles com mais de 70 anos. Esta condição apresenta um impacto social importante devido aos custos elevados relacionados à internação, perda da capacidade de trabalho e consequente piora da qualidade de vida dos pacientes acometidos. 
Os clássicos fatores de risco para aterosclerose também estão implicados nas arteriopatias obstrutivas crônicas dos membros inferiores, porém sua ordem de importância é diferente da doença coronariana ou carotídea. O tabagismo constitui o principal fator predisponente na doença arterial periférica além da hipertensão arterial e o diabetes melitus, sendo este último foi de maior risco em mulheres do que em homens (NEVES, 2010). 
O diagnóstico é essencialmente clínico, e a claudicação intermitente é patognomônica dessa condição (BARBOSA; DALE, 2008). A parte mais importante do exame físico para confirmação da doença arterial periférica é a palpação de pulsos periféricos. Devem ser palpados os pulsos das artérias femorais, poplíteos, tibial posterior e pediosa. É importante ressaltar que em até 12% das vezes o pulso pedioso não é palpável (KRZESINSKI, 2005). 
Na prática clínica diária, a palpação de pulsos periféricos é a chave para o diagnóstico, pois exclui a doença arterial com alto grau de certeza e identifica o grupo que necessitará da avaliação não-invasiva. O próximo importante passo do exame físico é a medição das pressões de tornozelo, com cálculo do Índice Tornozelo-Braquial (ITB). Este é a relação entre a pressão arterial sistólica dos tornozelos e a pressão arterial sistólica dos braços, medidas com o auxílio do esfigmomanômetro e do doppler vascular (MAKDISSE et al., 2007). Trata-se de um exame simples, útil e custo-efetivo. Em condições normais, a pressão sistólica dos membros inferiores é igual ou ligeiramente superior à dos membros superiores. Na presença de obstruções arteriais em membros inferiores capazes de provocar redução na pressão nos leitos distais à lesão, há queda na pressão sistólica dos tornozelos e, consequentemente, redução dos valores do ITB (DIETER et al., 2003). 
Outros métodos complementares que podem ser utilizados são a ultra‑sonografia duplex (mapeamento duplex ou duplex‑scanning) e a arteriografia, um exame invasivo para nos fornecer dados anatômicos e fisiológicos da árvore arterial. 
Portanto, que a síndrome isquêmica crônica é um importante capítulo nas doenças oclusivas artérias periféricas, cuja principal causa é aterosclerose que surge por mecanismos multifatoriais, e que deve ser sempre o alvo da correção, pois consiste na doença de base para gênese da oclusão arterial periférica, e especificamente nesse caso das artérias abaixo do ligamento inguinal responsáveis pela irrigação dos membros inferiores. O exame clínico tem um papel fundamental no diagnóstico dessa condição.

Referências
ALVES, W. .; GUIMARAES, S. B.; VASCONCELOS, P. R.  et al.  Repercussões da L-alanil-glutamina sobre as concentrações de lactato e lactato desidrogenase (LDH) em pacientes com isquemia crítica dos membros inferiores submetidos a revascularização distal. Acta Cir. Bras. 8 (3): 0-0, 2003.
BAPTISTA-SILVA, J. C.; MORAES-SOUZA, M. R. Propedêutica Vascular. 2010.  Disponível em: http://endovasc.med.br/wp/wp-content/uploads/2012/03/propedeutica-vascular.pdf. Acesso em: 30 mai. 2012.
BAPTISTA-SILVA, J. C. C.; BURIHAN, E. Diagnóstico clínico da isquemia crítica dos membros. Rev. bras. clín. ter, 25(2): 71-9, 1999.
BARBOSA, E.C.; DALLE, R. D. M. Benefícios do condicionamento físico como tratamento da claudicação intermitente. Acta Fisiatr, 15 (3): 192 – 194, 2008.
DIETER, R. S. et al. Lower extremity peripheral arterial disease in hospitalized patients with coronary artery disease. Vasc Med, 8(4): 233-6, 2003.
FRADE, M. A.; CURSI, I. B.; ANDRADE, F. F. et al. Úlcera de perna: um estudo de casos em Juiz de Fora-MG (Brasil) e região. An. Bras. Dermatol., 80 (1): 41-46, 2005. 
HINCHLIFFE, R. J.; ANDROS, G.; APELQVIST, J. A systematic review of the effectiveness of revascularization of the ulcerated foot in patients with diabetes and peripheral arterial disease. Diabetes Metab Res Rev, 28 Suppl 1:179-217, 2012.
MAKDISSE, M. et al. Escore para rastrear idosos (75 anos) de alto risco para doença arterial periférica. Arq. Bras. Cardiol. 88 (6): 630-636, 2007.
KRZESINSKI, J.M. Management of high blood pressure in peripheral arterial disease. Acta Chir Belg, 105(6):560-6, 2005.
NEVES, C. R. B. Obstrução Arterial Crônica de Membros Inferiores. 2010. Disponível em: http://celsoneves.sites.uol.com.br/obstrucaoarterialmembros.html. Acesso em: 30 mai. 2012.
PITTA, G. B. B.; CASTRO, A. A.; BURIHAN, E. Angiologia e cirurgia vascular: guia ilustrado. Maceió: UNCISAL/ECMAL & LAVA; 2003. Disponível em: http://www.lava.med.br/livro. Acesso em: 30 mai. 2012.
SECOND EUROPEAN CONSENSUS DOCUMENT ON CHRONIC CRITICAL LEG ISCHEMIA. Circulation, 84 (4 Suppl): IV1-26, 1991.

28 de maio de 2012

O Internato Médico e a Greve na UFPB

Os professores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) estão em greve desde o dia 17 de maio de 2012, assim como os colegas docentes de 44 universidades federais brasileiras.
Como parte do "programa não-oficial da greve no Semioblog", o GESME registra na presente postagem a discussão ocorrida hoje no Centro de Ciências Médicas (CCM) da UFPB sobre a situação dos graduandos do Internato médico da UFPB durante o movimento paredista em curso.
Com a presença de vários professores do CCM, incluindo coordenadores setoriais do Internato, Vice-Coordenador do Curso de Medicina (e Coordenador Geral do Internato), quatro chefes de Departamentos, dois professores do Comando de Greve da Adufpb (Sindicato dos Docentes da UFPB) e a Diretoria do CCM, além de estudantes do curso, a reunião ocorreu na sala 127 do primeiro andar do Hospital Universitário Lauro Wanderley.
A presente postagem consiste em uma síntese narrativa da referida reunião. Esta teve início de maneira informal, como uma discussão em grupo, representando a continuidade da reunião ocorrida na quinta-feira passada, no mesmo centro, sobre o movimento grevista e o posicionamento dos docentes do CCM.
O Prof. Henrique Gil começou a discussão falando sobre a interrupção do Internato frente à iminente greve dos funcionários da UFPB. Afirmou que enquanto não houvesse definição sobre a paralisação do Internato, este continuaria no Departamento de Pediatria e Genética, em um modelo emergencial de funcionamento. Disse ainda que o Internato funcionava atrelado à residência médica em Pediatria. Mencionou que as faculdades particulares estavam tomando os espaços dos hospitais públicos da cidade como campo de estágio e que, do ponto de vista legal, como chefe de departamento, não tinha como articular diretamente com essas instituições (os hospitais) sobre a manutenção dos internos que estavam no rodízio de Pediatria. Nesse sentido, ponderou que só a Coordenação do Curso teria condições de gerir oficialmente esta conexão com os outros hospitais. Lembrou que foi quase consenso entre os coordenadores setoriais do Internato que este continuaria apesar da greve em andamento, com exceção do Departamento de Promoção da Saúde.
O Prof. Vladimir, representante do Comando de Greve e professor do Departamento de Promoção da Saúde, afirmou que este departamento não havia tido nenhuma reunião para decidir sobre tal questão, e que a opinião expressa por ele sobre a interrupção do Internato fora como membro do Comando de Greve e como professor.
Iniciaram-se inscrições para participação dos presentes na discussão.
A Profa. Rilva perguntou se quando o reitor da UFPB reconheceu a legitimidade da greve na semana anterior - o que seria oficializado pelo Consuni (Conselho Superior da UFPB) provavelmente ainda naquela semana - se isso representaria automaticamente uma suspensão do calendário acadêmico, e que repercussão esta suspensão teria sobre o Internato. O Prof. Vladimir respondeu que sim, e que representando um terço do curso de graduação em medicina, o Internato também seria suspenso, pois Internato era graduação. O Prof. Fernando, também do Comando de Greve e professor do Departamento de Educação Física, completou que quando a greve terminasse, o Consepe (Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão) da UFPB iria refazer o calendário acadêmico.
O Prof. Marco Antônio, diretor do CCM, declarou que a instância para decisão sobre a continuidade do Internato era o Colegiado do Curso de Medicina, assim como a Coordenação Geral do Internato. Continuou afirmando que o Internato não deveria parar, e que isso envolvia a assistência a pacientes, o que constituía uma peculiaridade do curso de Medicina e do treinamento curricular em serviço, o Internato.
O Coordenador Geral do Internato, Prof. Felipe, disse que consultou os coordenadores de áreas (do Internato) e o posicionamento geral destes foi o de manter as atividades curriculares dos internos durante a greve. Disse ainda que o Internato era diferente dos outros períodos do curso, embora o que estivesse em pauta não fosse a assistência, pois os internos não eram responsáveis por ela, e sim alunos em formação. 
O Prof. Felipe declarou que havia dois pontos complicadores na atual greve: os convênios institucionais (como o da Prefeitura de João Pessoa, por exemplo) e o calendário das provas de residência médica. Opinou que a saída dos internos dos espaços de estágios na rede hospitalar pública da cidade implicaria em enfraquecimento dessa ocupação, que já sofria problemas, o que abriria mais espaço para as faculdades particulares. Quanto ao calendário das provas de residência, não haveria como os atuais internos (referindo-se aos períodos 100 e 110) recuperarem o acesso às inscrições da seleção do final do ano, objetivando as residências médicas de 2013. 
O Prof. Felipe afirmou ainda que, sobre a complementação dos 75% das aulas do oitavo período, uma polêmica que agitara a reunião da semana anterior, aquele teria que parar, e que depois da greve, os alunos teriam o período de férias para fazer a reposição correspondente às aulas perdidas durante a greve.
O Prof. Henrique Gil pediu aparte para uma questão de ordem. Repetiu que a instância para decidir sobre interrupção ou manutenção das atividades do Internato era o Colegiado do Curso, como fora mencionado pelo Prof. Marco Antônio, mas opinou que isso deveria ter um registro formal, passando por reunião do próprio Colegiado.
O Prof. Luciano disse que aquela discussão deveria ser mais política que administrativa, pois decidir sobre paralisação de atividades não era atribuição do Colegiado nem do Consuni, e sim da assembleia dos docentes, que já decidira pela greve. Prosseguiu afirmando que era necessário que houvesse um fortalecimento da categoria dos professores, e que havia ônus inerente a qualquer posicionamento político. Lembrou que já passara por três greves de mais de 100 dias como estudante da UFPB, e que naquelas greves apoiara os professores na luta que era pela defesa da universidade, não apenas da categoria docente. Disse ainda que concordava que a residência médica não parasse, mas que na sua atividade deveria ser inserida uma discussão política com a comunidade, quando se poderia esclarecê-la sobre os motivos da greve.
O Prof. Luciano acrescentou que, em relação especificamente ao Internato, era preciso entender que "o interno era um aluno", e portanto, não era responsável por pacientes, e que o Internato "não segurava" serviço; disse ainda que se o internato estava "segurando" serviço, havia alguma coisa errada. Concluiu dizendo que, enquanto atividade acadêmica, o Internato deveria parar; ressaltou ainda o fato de que em outros cursos de graduação os estudantes que iriam se formar no final do ano também perderiam períodos de inscrição em mestrado e oportunidades profissionais em virtude da greve.
O Prof. Vladimir declarou que a greve já fora deflagrada, e os professores que se encontravam desenvolvendo atividades didáticas naquele momento estavam "furando" a greve. Acrescentou que era necessário parar o Internato também. Concluiu sua fala dizendo que "se era para continuar o Internato, que se continuasse o oitavo período também". Ainda em relação ao oitavo período, entretanto, disse que era preciso lembrar que o argumento de que faltavam 25% para alcançar os 75% da carga horária mínima necessária para considerar o semestre ganho tinha efetivamente um conteúdo apenas parcial, não era 100%.
O Prof. Maroja afirmou que a greve era danosa para os professores e para os estudantes. Ponderou que se houvesse manutenção das atividades do Internato, os alunos que estavam nessa fase iriam concluir a tempo, enquanto os demais não. Nesse sentido, lembrou que havia uma tendência de não haver reposição de aulas após a greve.
O Prof. Fernando falou da magnitude da adesão nacional de professores de universidades federais à atual greve. Ele fez uma analogia da manutenção das atividades no Internato com a de outros setores da universidade que ainda não pararam, mas que inevitavelmente suspenderiam suas atividades também com a continuidade do movimento grevista. Em relação ao Internato, afirmou que se este representava um terço do curso médico, a continuidade dele enfraqueceria o movimento grevista.
O Prof. Agostinho concordou que o Internato "não segurava" serviço, mas discordou de que houvesse interrupção dos rodízios que já estavam em andamento, e que era possível fazer isso, pois com a greve, três professores poderiam atuar em cada rodízio. Propôs que o Internato continuasse até a próxima reavaliação da situação, e que não se podia perder o apoio dos estudantes, embora tenha reconhecido que este último argumento não obteria a concordância de muitos colegas. Declarou também que "o governo não está nem aí se o internato vai parar ou não".
A Profa. Rilva afirmou que quando o reitor reconheceu a legitimidade da greve, esse não foi apenas um ato de proselitismo político, e que esse reconhecimento iria ser oficializado ainda naquela semana pelo Consuni, como o próprio Prof. Vladimir afirmara. Supôs que o passo seguinte seria a suspensão do calendário acadêmico, pois aquela seria uma medida para proteger os alunos no sentido de que o semestre fosse retomado após o término da greve, caso preponderasse a ideia de não reposição de aulas, que já havia sido ventilada na reunião passada no CCM. Ponderou que a greve atual provavelmente seria longa e questionou a hipótese do Prof. Agostinho de manter o Internato com apenas cerca de três professores em cada clínica, na vigência da greve iminente dos funcionários.
O Prof. Marco Antônio ponderou que havia condições novas permeando a atual greve, diferentemente das greves anteriores, e que nunca havia ocorrido uma greve nessas circunstâncias: a existência da lei dos estágios; o crescimento exponencial das faculdades particulares; o Internato de dois anos (no antigo currículo, era de dez meses). Finalizou dizendo que era necessário "entender a importância de a gente estar aqui, engajado nesse movimento".
Rebeca, aluna do quinto período e membro do centro acadêmico de medicina (Centro Acadêmico Napoleão Laureano - CANAL), afirmou que se solidarizava com o movimento grevista dos docentes. Disse que era necessário acrescentar à pauta da greve dos professores, a iminente greve dos médicos do hospital universitário e a atual situação de crise que vivenciava aquele hospital. Finalizou afirmando que a própria demanda por atendimentos no hospital pela população iria diminuir ao ser difundida a notícia de que estava ocorrendo uma greve. Informou ainda que o CANAL está promovendo a SECSS (Semana de Educação, Currículo, Saúde e Sociedade).
O Prof. Vladimir perguntou quem, dentre os professores presentes, vivia apenas do salário como docente. A partir do ângulo de visão da repórter do GESME, levantaram as mãos três professores. Ele então considerou que a greve era uma questão de sobrevivência para os professores, que deveriam dizer não à "auto-exploração". Mostrou então diapositivos que exibiam características da ascensão funcional na carreira docente no magistério superior em comparação com outras carreiras docentes, e disse que o sindicato nacional propunha que, independente da titulação, o professor iniciante deveria começar na categoria de auxiliar de ensino. Afirmou ainda que aquela greve não era apenas pela questão salarial, mas também pela melhoria da carreira.
O Prof. Vladimir discordou do Prof. Agostinho, como este previra, quanto à questão da perda do apoio dos alunos em caso de suspensão do Internato. Afirmou ainda que os alunos costumavam deixar as atividades do Internato "para ir ao Medcurso". Finalizou declarando que "este é um momento ímpar, com a adesão de professores de 44 universidades à greve!", e que as pessoas tinham que estar presentes no campus durante o movimento grevista. Repetiu ainda o que já afirmara na reunião ocorrida quinta-feira passada: "Não participar da luta é uma contradição pedagógica!"
Homero, aluno do período 12período, afirmou que não havia como derrubar a lógica dos professores do Departamento de Promoção da Saúde, que segundo sua opinião, eram os mais militantes do CCM, tendo ajudado muito sua turma no início da graduação, turma que fora pioneira na nova grade curricular e que se formaria em novembro próximo (em seis meses). Sobre a participação dos alunos do Internato no andamento dos serviços do hospital universitário, afirmou que "tudo aqui dependia dos internos" (referiu-se ao funcionamento das enfermarias do hospital). Supôs que, com a greve dos funcionários no próximo dia 11, cuja deflagração era "100% de certeza", e a decorrente parada da atividade ambulatorial, a greve iria aparecer na mídia.
Homero declarou que com a greve dos funcionários no dia 11 de maio, ele e seus colegas de turma iriam tentar "contingenciar" (ou seja, tinham um plano alternativo), e que a lei os resguardaria. Mencionou que em Campina Grande (Universidade Federal de Campina Grande), o Internato continuaria na vigência da greve dos professores. Afirmou ainda que tem recebido orientação do Prof. Severino (Pró-Reitor de Assistência Estudantil) e que aquela orientação estava sendo fundamental.
O Prof. Marco Antônio declarou que "temos que pensar bem, pois esse momento é muito peculiar". Disse ainda que o momento atual era resultado de uma nova conjuntura que se formara, embora não se tencionasse retardar o processo de formação dos estudantes.
O Prof. Maroja considerou a situação contraditória da baixa cobertura da greve nacional dos docentes pela imprensa, em comparação com a repercussão midiática do recente e bizarro episódio envolvendo uma atriz de telenovelas. Afirmou que tanto a imprensa quanto o governo divulgavam inverdades sobre a situação dos professores federais e sobre a greve. Mencionou que o Ministro da Educação até já exibira, através da imprensa, um contra-cheque de um docente de universidade federal, referente ao salário que sairia apenas no próximo mês... 
Por outro lado, o Prof. Maroja fez menção aos textos escritos pelo Prof. Climério*, que embora parecesse um tanto radical segundo ele, "tinha toda razão". [...] "Nessa universidade tudo corre frouxo", declarou o Prof. Maroja. Finalizou dizendo que a presença de apenas uma dúzia de professores naquela reunião dava um testemunho vívido do que denunciara o colega Climério.
A Profa. Rilva afirmou que embora fosse importante mostrar naquele momento a situação dos docentes como trabalhadores explorados, a questão já era bem conhecida, sobretudo por quem tinha vínculo de dedicação exclusiva com a universidade e que não podia ter outro emprego, vivendo apenas daquele salário. A questão dialética sobre ser  a greve justa ou não já havia sido discutida na assembleia de decretação de greve e divulgada também pelo sindicato. Assim, seria melhor se ater ao objetivo daquela discussão, que havia sido marcada precisamente para avaliar a possibilidade de continuação das atividades do Internato.
O Prof. Jacicarlos discordou, afirmando que era contrário à busca da objetividade. Também se declarou avesso à meritocracia, e criticou artigos científicos em que apenas dois dos que figuravam como autores realmente participaram da sua elaboração. Disse ainda que "nós não nos reunimos para discutir educação". Por outro lado, afirmou que a "universidade não tinha que dar satisfação à sociedade". Finalmente, disse: "sou pelo radicalismo". Segundo ele, a parada das atividades era tanto pela situação da educação quanto pela medicina.
O Prof. Vladimir afirmou que considerava que a atual greve estava tendo um espaço maior na mídia, pois o assunto já fora objeto de publicações no site da Uol (Universo Online), no Jornal Folha de São Paulo e na Revista Veja.
O Prof. Felipe disse que em sua primeira fala naquela reunião havia considerado a dimensão "organizativa", e naquele momento final faria uma síntese do que se estava propondo para o Internato em vista daquela greve e da greve dos funcionários que se antevia. Afirmou que não havia como continuar o Internato durante a greve dos funcionários. Contudo, a Comissão do Internato previa a antecipação dos estágios optativos para a turma do 12período, pois embora os optativos devessem ser cumpridos apenas ao final do Internato, "estava previsto no currículo" e era possível tal prática diante da situação de greve. Os alunos do 12período entrariam então no cumprimento dos optativos e, ao término destes, retornariam para concluir o rodízio em que se encontravam no momento do início da greve dos funcionários. Portanto, só seriam mantidas as atividades do 12período do Internato, "em virtude de todo o contexto".
O Prof. Felipe lembrou que embora o Internato representasse um terço do curso, naquele momento havia "apenas" 150 alunos (ou seja, três turmas), passando por aquela última fase da grade curricular. Disse ainda que as turmas dos demais períodos do Internato não poderiam antecipar o estágio optativo pois não haveria possibilidade de englobar todo o contingente de 150 alunos naquela solução que fora encontrada. "Não há como colocar 150 em optativos", disse ele.
O Coordenador Geral do Internato declarou ainda que aquele fórum (reunião) era soberano para a tomada de uma decisão, embora tivesse afirmado inicialmente que a instância para deliberar sobre qualquer medida fosse a Comissão do Internato, formada por ele, coordenador geral, e pelos coordenadores das quatro áreas básicas, além de um representante de cada turma de alunos cursando o Internato e um representante do Centro Acadêmico de Medicina.
O Prof. Henrique Gil afirmou que considerava razoável a proposta do Coordenador Geral do Internato. 
O Prof. Maroja sugeriu que as reuniões para discussão do movimento grevista deveriam ser realizadas semanalmente, como parte da programação da greve no CCM. O Prof. Marco Antônio considerou esta sugestão pertinente e afirmou que iria promover tais discussões periodicamente, convidando os membros do centro por correio eletrônico.
A Profa. Rilva questionou se não haveria votação da proposta colocada pela Coordenação do Internato, e o Prof. Fernando, da Adufpb, respondeu que, como esta fora "consensual", não seria necessário submetê-la à votação.
O Prof. Marco Antônio encerrou a reunião.

* Os referidos textos do Prof. Climério também foram postados no Semioblog:

25 de maio de 2012

Repercussões Sistêmicas da Doença Periodontal

Resumo
A doença periodontal é um quadro infeccioso e inflamatório extremamente prevalente na população e está associada a maior risco de doenças cardiovascularesresultados adversos da gravidez, artrite reumatóide, hiperlipidemia e diabetes mellitus. Vários patógenos periodontais foram detectados em placas de ateroma. A manifestação inicial da doença periodontal é a gengivite que, se não tratada precocemente, pode evoluir para periodontite crônica, com risco de repercussões sistêmicas importantes. O clínico deve conhecer a existência dessa associação mórbida.

Palavras-Chave: Periodontite. Inflamação. Aterosclerose.

A doença periodontal associa-se a risco aumentado de doenças cardiovasculares, resultados adversos da gravidez, artrite reumatóide, hiperlipidemia e diabetes mellitus. Muitos estudos de coorte, estudos in vitro e em animais sugerem que a inflamação sistêmica devida a agentes patogênicos da doença periodontal pode desempenhar um papel importante na iniciação e progressão dessas doenças. Portanto, infecções periodontais devem ser consideradas como fator de risco importante para várias doenças sistêmicas, e o clínico deve estar ciente disso (MANJUNATH et al., 2011).
A doença periodontal é uma enfermidade infecciosa muito comum, afetando cerca de 50%  da população europeia (BELSTROM et al., 2012) e 93% da brasileira (CHAMBRONE et al., 2008). Assim, quase todas as pessoas apresentam algum grau de doença periodontal inflamatória crônica. Esta ocorre inicialmente na gengiva em resposta a antígenos bacterianos da placa dentária que se acumulam ao longo da margem gengival, a placa bacteriana, que é um biofilme constituído por bactérias, proteínas salivares e células epiteliais descamadas. Sua manifestação inicial é a gengivite que, se não tratada precocemente, pode evoluir para periodontite. Assim, em uma primeira fase, os sinais e sintomas clínicos são "surdos", sem qualquer tipo de dor e que, por isso, passam despercebidos ao próprio paciente. A hemorragia gengival associada é um dos primeiros sintomas que chama realmente a atenção (ALMEIDA et al., 2006).
Inicialmente ocorre um desequilíbrio entre bactérias e defesas do hospedeiro, o que leva a alterações vasculares e à formação de exsudado inflamatório. Esta fase manifesta-se clinicamente por alteração da cor da gengiva, hemorragia e edema, sendo uma situação reversível se a causa for eliminada. Esta situação, definida como gengivite, possibilita um maior acesso dos agentes bacterianos agressores e/ou seus produtos às áreas subjacentes, podendo resultar na formação de bolsas periodontais, com perda óssea e uma contínua migração apical do epitélio. Este tipo de epitélio oferece menos resistência aos agentes agressores, o que perpetua o processo inflamatório (ALMEIDA et al., 2006). Portanto, a gengivite é precursora da doença periodontal, e apresenta-se como hiperemia e edema gengival (Figura), decorrentes da má higiene oral. 

Figura. Sinais de gengivite. Foto: nycomprehensivedentistry.com

ligação entre saúde oral e doenças cardiovasculares tem sido proposta há mais de um século. Recentemente, a preocupação com possíveis ligações entre doença periodontal e doença vascular aterosclerótica intensificou-se e está dirigindo um campo ativo de investigação sobre uma possível associação dcausalidade. Os dois transtornos compartilham vários fatores de risco comuns, como o tabagismo, idade e diabetes mellitus (LOCKHART et al., 2012).
A teoria de que a aterosclerose passa por um processo inflamatório acentuou o interesse no papel que alguns agentes infecciosos podem ter no início, ou mesmo na modelação, da aterogênese. Dentre os principais agentes destacam-se Chlamydia pneumoniae, citomegalovírus e Helicobacter pylori. As infecções desencadeariam alterações na biologia das células endoteliais e do músculo liso, predispondo à aterogênese. 
Nesta perspectiva, colocou-se a hipótese de as doenças periodontais, como doenças infecciosas, terem um papel na formação de ateromas. Vários agentes patogênicos periodontais foram detectados em placas de ateroma, principalmente Porphyromonas gengivalis, Prevotella intermedia, Tannerella orsythensis e o Actinobacillus actinomycetemcomitans (ALMEIDA et al., 2006).
Há uma forte ligação entre doença periodontal e diabetes mellitus. A doença periodontal tem incidência aumentada em indivíduos diabéticos, e sua progressão e gravidade são maiores nesses pacientes (ALMEIDA et al., 2006). A fisiopatologia da doença periodontal associada ao diabetes mellitus está ilustrada na figura abaixo (ALVES et al., 2007).


Figura: Fisiopatologia da periodontopatia associada ao diabetes mellitus
Fonte: ALVES et al. (2007)

Por outro lado, pacientes diabéticos com periodontite grave podem apresentar maior dificuldade em alcançar o controle glicêmico (MAEHLER et al., 2011). A associação epidemiológica entre ambas remete à necessidade de verificação de tratamento periodontal regular no paciente diabético e à relevância de enfatizar a importância de o clínico conhecer essa associação.
A periodontite também está associada à hiperlipidemia. Esta seria induzida pela periodontite, e parece estar associada à liberação de citocinas, em resposta à infecção por gram-negativos, principalmente a interleucina-1 e o fator de necrose tumoral. Ambas as citocinas podem alterar o metabolismo lipídico e produzir hiperlipidemia (ALMEIDA et al., 2006).
Há evidências de que a periodontite está associada com um risco aumentado de acidente vascular cerebral. No entanto, os resultados deste meta-análise devem ser interpretados com cautela, devido à heterogeneidade dos estudos, assim como a diferenças na definição de periodontite (SFYOERAS et al., 2012).
Atualmente, há uma grande controvérsia acerca da possibilidade de condições inflamatórias crônicas como a periodontite não tratada, condicionarem também a ocorrência de artrite reumatóide (ALMEIDA et al., 2006).
Recentemente foi sugerido também que a doença periodontal na gravidez seja uma causa determinante de baixo peso ao nascer (LOURO et al., 2001).
A doença periodontal  é  considerada um problema de saúde pública em todo o mundo devido à sua alta incidência e prevalência,  e por estar associada a doenças sistêmicas importantes. O clínico deve conhecer a existência dessa associação mórbida.

Referências
ALMEIDA, R. F.; PINHO, M. M.; LIMA, M. C. et al. Associação entre doença periodontal e doenças sistêmicas. Rev Port Clin Geral, 22: 379-90, 2006.
ALVES, C.; ANDION, J.; BRANDAO, M. et al. Mecanismos patogênicos da doença periodontal associada ao diabetes melito. Arq Bras Endocrinol Metab. 51 (7): 1050-1057, 2007. 
BELSTROM, D.; DAMGAARD, C.; NIELSEN, C. H. et al. Does a causal relation between cardiovascular disease and periodontitis exist? Microbes Infect, 14(5): 411-8, 2012.
LOCKHART, P. B.; BOLGER, A. F.; PAPAPANOU, P. N,e t al. Periodontal Disease and Atherosclerotic Vascular Disease: Does the Evidence Support an Independent Association?: A Scientific Statement From the American Heart Association. Circulation, 125 (20): 2520-2544, 2012.
SFYOERAS, G. S.;N.; SALEPTSIS, V. G. et al. Association between periodontal disease and stroke. Vasc Surg,  55 (4): 1178-84, 2012. 
CHAMBRONE, L.; LIMA. L. A. P. A.; CHAMBRONE, L. A. Prevalência das Doenças Periodontais no Brasil. Parte II. 1993-2003, Revista Odonto, 16 (31): 69-63, 2008.
LOURO, P. M.; FIORI, H. H.; LOURO FILHO, P. et al. Doença periodontal na gravidez e baixo peso ao nascer. J Pediatr (Rio J) 77(1): 23-28, 2001.
MAEHLER, M.; DELIBERADOR, T. M.; SOARES, T. M. F, et al. Doença periodontal e sua influência no controle metabólico do diabetes. RSBO, 8(2): 211-8, 2011.  
MANJUNATH, B. C.; PRAVEEN, K.; CHANDRASHEKAR, B. R. Periodontal infections: a risk factor for various systemic diseases. Natl Med J India, 24 (4): 214-9, 2011.

Imagem: perio.org.

21 de maio de 2012

"Caça" aos Professores que Trabalham

Por Climerio Avelino de Figueredo
Professor do Departamento de Fisiologia e Patologia da UFPB

Ontem, sexta-feira, 18/05/2012, nós, professores sindicalizados da ADUFPB, recebemos um e-mail desta entidade sindical, com diversos informes sobre a greve, deflagrada no dia 17/05/12.
Entre os informes, destaco:
Ficou acertado também na reunião desta quinta-feira que toda a atividade docente nos campi da UFPB será afetada pelo movimento. Em casos especiais, algumas atividades que estejam programadas para o período de greve serão analisadas pelo Comando.”
 É este: 
GREVE: orientações sobre manutenção de atividades
A ADUFPB solicita às pessoas que querem denunciar a manutenção de atividades docentes durante a greve (aulas, provas, trabalhos etc.) e aos professores que possuem atividades cuja continuidade consideram necessária, que comuniquem o fato ao sindicato por meio de ofício ao Comando de Greve.

Em síntese, o comando local de greve (CLG) decidiu que todas as atividades docentes dos campi da UFPB devem ser paralisadas, exceto algumas que ele considerar necessárias e para que isto ocorra o professor responsável deverá solicitar ao comando a sua análise e aprovação.
E, através de um formulário, de responsabilidade da ADUFPB, as pessoas são estimuladas a “denunciar” atividades docentes como aulas, provas, trabalhos etc. que estejam sendo realizadas.
O que isto significa?
Todos nós, do meio universitário, sabemos o que significa denunciar. É levar ao conhecimento da autoridade competente e/ou ao público, em geral, um ato ou uma conduta transgressora até então desconhecida ou pouco conhecida.
Fui ao Houaiss e busquei o significado mais preciso da palavra denúncia. Aqui, o transcrevo.
Denúncia: ato verbal ou escrito pelo qual alguém leva ao conhecimento de autoridade competente um fato contrário à lei, à ordem pública ou a algum regulamento, sendo suscetível de punição.
A adesão à greve é um ato voluntário. A sua decretação não obriga moralmente, muito menos legalmente, que todos a sigam. Os que o fazem têm seus motivos. Os que não aderem a ela, também.
Poderia enumerar uma série de motivos que justificaria a não adesão (em diferentes níveis) a esta greve. Não os elencarei porque me deterei a outro aspecto da questão. Também não discutirei se a maioria dos professores queria a greve ou não, nem a forma como a vontade da maioria deve ser aferida. Muito menos a delicada questão de, na assembleia, poder votar apenas os professores filiados a ADUFPB e o que nela é decidido ser imposto a todos.
É certo que a maioria dos docentes aderiu à greve, no que tange às atividades de aulas, nos cursos de graduação, muitos deles por não terem outra saída diante do fato de os alunos haverem desaparecido das salas de aula. No entanto, em relação à pesquisa e à pós-graduação, isto não ocorre. Historicamente, o movimento grevista é muito condescendente com estas e outras atividades que, se paralisadas, muito prejudicaria os professores. Sobre o porquê disto, não discutirei, aqui.
Os professores que continuam realizando atividades docentes (aula, provas, trabalhos), é plausível supor, são professores comprometidos com suas atividades.  Do contrário, não as estariam realizando, durante a greve.
A pergunta que se coloca é a seguinte: Por que estes professores devem ser denunciados?
As lideranças de uma categoria não deveriam valorizar aqueles que executam suas obrigações com responsabilidade, pois, assim, estariam fortalecendo a categoria na luta pelos seus direitos? No meu entendimento, o lógico seria a ADUFPB e as lideranças docentes incentivarem a denúncia dos professores que não trabalham.
É por todos sabido, e pelos alunos em especial, que a maioria dos professores não tem compromisso com a universidade e, por extensão, com o interesse público. Este descompromisso se apresenta de diferentes formas. De antemão, aviso que isto que direi a seguir não se aplica a todos.
A maioria dos professores aparece na UFPB apenas para dar as aulas e muitas vezes utilizam apenas parte do tempo destinado a elas. Nem todos se preocupam com a qualidade da aula. Muitas vezes o material didático utilizado não é atualizado, por muito tempo. Outros colocam monitores e orientandos para dar aula em seu lugar ou distribuem os assuntos em seminários para os alunos darem a aula. O número de aulas por semana é muito pequeno, para a maior parte dos professores. Há até aqueles que não gostam de ministrá-las. A correção das provas e a publicação dos resultados demoram muito, atrapalhando a vida acadêmica dos alunos. O horário das aulas é definido pelo professor, de acordo com sua conveniência, acarretando prejuízos ao aluno que fica com aulas descontínuas. A pesquisa e a extensão são tocadas mais pelos alunos, muitas vezes sem orientação do professor. Muitos professores que têm dedicação exclusiva (pela qual ganham uma gratificação) exercem atividades privadas, o que é ilegal. Provas, trabalhos, seminários etc. são definidos e aplicados em desacordo com o tempo e o interesse dos alunos. Professores sempre exigem boas condições de trabalho, mas nem sempre se preocupam em bem utilizar e conservar espaços, equipamentos e materiais que as proporcionam. Nem os compartilha com os demais (“Esta sala é minha! Este computador é meu!”).
E a lista continua!...
Por que para esses não se faz um formulário para denúncia?
No meu dia a dia com os alunos, escuto histórias e histórias absurdas que demonstram o descompromisso da maioria dos professores. São muitas! Fico imaginando: quantas existem, em toda a UFPB? Postas no papel e se as folhas fossem empilhadas, que altura atingiria?
Citarei duas, para não alongar o texto, mas poderia citar muito mais.
Um aluno que participou de um projeto de extensão, por mim coordenado, me falou que ele se matriculou em uma disciplina e, no início do semestre letivo, por três vezes seguidas, ele e os demais alunos da turma foram à sala de aula e o professor não apareceu. Ele desistiu da disciplina, mas perdeu o prazo de trancamento.
Ao final do período letivo, para sua surpresa, ao tirar o histórico escolar, ele estava aprovado com nota 7,0 (sete). A ele fiz algumas perguntas para entender o que poderia ter ocorrido e ele me disse que seus colegas haviam lhe dito que, durante todo o semestre letivo, o professor apareceu apenas duas vezes. Em ambas, para recolher o trabalho passado para os alunos (professor descompromissado com a universidade adora passar trabalho, no entanto nem todo professor que passa trabalho o é).
Mas, se o aluno não fez o trabalho, como ele recebeu nota sete? Acredito (não tenho certeza) que o professor que não apareceu para dar aulas, também não corrigiu os trabalhos (corrigir trabalho dá muito trabalho!) e deu nota aleatória a todos os alunos que no sistema apareciam como matriculados, tal qual se dar milhos para os pombos, em uma praça.  Assim: sete para este; oito para aquele; oito e meio para aquele outro. Nenhuma nota baixa para não haver reclamação, nem nota alta para não haver ciúmes e brigas.
Agora, o outro caso.
O período letivo 2010.2 foi programado para se encerrar no dia 11 de dezembro de 2010 e os exames finais estavam programados para serem realizados entre 13 e 18 de dezembro. Desta forma, com folga, os alunos poderiam retornar as suas cidades de origem, algumas delas em outros estados da federação. Os que moravam em João Pessoa, poderiam iniciar o gozo das férias escolares coincidindo com o período natalino. No entanto, uma turma do curso de Medicina, para a qual lecionei uma disciplina, não teve este direito. Tudo porque os professores de uma disciplina, mesmo após o dia 18/12/201, não haviam publicado as notas parciais e ninguém sabia quem precisaria ou não fazer a prova final, que deveria ter ocorrido até o dia 18/12.
Os alunos ficaram em vigília, a todo instante abrindo o e-mail da turma na esperança de ver as notas publicadas, já que os professores da referida disciplina não atendiam os telefonemas dados pelos alunos. Desta forma, alguns alunos tiveram que remarcar a passagem, comprada com antecedência, e alguns passaram o Natal longe de suas famílias. 
Estas histórias parecem e são absurdas, mas há algo mais absurdo ainda a elas relacionado que é o fato de isto ser costumeiro. 
Pararam os absurdos? Não! O mais absurdo é o fato de esses professores que produzem essas pérolas nunca serem sequer repreendidos, pois não há, na UFPB, uma sistemática de avaliação que detecte estes problemas e os resolvam.  
Esta é a realidade da UFPB.  Por culpa de todos nós (de uns mais do que de outros, pelo fato de terem cargos de direção), na UFPB, cada um faz o que quer e quando quer e não o que é do interesse público, na hora que é recomendável. 
Se alguém achar que estou exagerando, convido-o a aferir, comigo, estes absurdos.
Voltando à caçada!
A ADUPB e o CLG está “caçando” os professores que não aderiram à greve, isto é, estão trabalhando.
Greve não é férias, certo?
Greve é um estado de mobilização! Do contrário, a categoria não teria forças para conseguir a pauta de reivindicação. Então, não seria de se esperar que a UFPB estivesse cheia de professores em atividades de mobilização: reuniões, seminários, discussões, passeatas, panfletagem etc? Ou isto ocorrendo em outros pontos da cidade?
O que se passa é que a universidade está vazia de professores. A propósito disto, junto com este texto, anexo uma foto de uma mobilização que ocorreu após a assembleia que decretou a greve no dia 15/05/12, em frente a UFPB, a cerca de 300 metros do auditório onde a assembleia se realizou.
Na foto (enviada e titulada pela ADUFPB), consigo contar apenas 35 pessoas, admitindo que onde há um pescoço, uma cabeça ou duas pernas o resto do corpo está junto. Deste total, a maioria é de alunos (além de serem usados para dar aulas, fazer extensão e pesquisa no lugar dos professores, os alunos ainda se prestam para aumentar o número de pessoas, nas esvaziadas atividade de mobilização).
Sugiro à ADUFP ao CLG que, a invés de mandarem um formulário para as pessoas denunciarem professores que estão trabalhando, na UFPB, mandem um formulário que se preste para a denuncia de professores que não estão mobilizados  e não estão na UFPB e sim em suas casas, em seus negócios, nas praias, nos shoppings etc.   
Se a temporada é de “caça”, então, cacemos o “animal” apropriado. E este não é o professor que trabalha de forma adequada, por não ser um “animal” muito abundante na UFPB e por ser um “animal” muito útil à sustentabilidade do meio universitário. O “animal” apropriado é o professor que não trabalha como deveria. Este, sim, é abundante em nossa universidade e, além disto, é um predador (de recursos públicos e da credibilidade da universidade) e um fugitivo (pois aderiu à greve e fugiu da UFPB).      
A bem da verdade, é preciso dizer que os professores que militam no movimento docente (Diretoria da ADUFPB, comando de greve e coisas afins) são pessoas comprometidas com a universidade e que não concordam com os "malfeitos" dos professores. Mas, a meu juízo, cometem um grande equívoco quando centram a luta apenas na melhoria salarial do professores, sem dar ênfase à avaliação do trabalho docente e à gestão da universidade.
Comentem equívoco, também, quando atribuem ao governo e ao “neoliberalismo” todas as mazelas das universidades. É lógico que o governo é responsável por muitos dos problemas que nelas ocorrem. Mas muitos deles são provocados por nós, e por nós devem ser solucionados.
Se considerarmos apenas a minoria que trabalha, o vencimento do docente é baixo. Mas, e a maioria que não trabalha? Ela merece aumento de vencimento? Se todos os professores cumprissem sua jornada de trabalho e o fizesse com dedicação e com qualidade, com o número de professores que temos, faríamos o dobro do que fazemos.
Discordo da visão maniqueísta, dicotômica e corporativista do movimento docente que está à frente do ANDES e da ADUFPB, pois, na prática, penaliza o professor que trabalha e é conivente com o professor que não trabalha por se opor à avaliação do trabalho docente. Por isto eu e outros colegas votamos contra a greve.
O serviço público, custeado com os tributos pagos por toda a população, deve estar a serviço do interesse de todos e não dos interesses corporativistas dos servidores.
Nós, pela formação e pelo conhecimento que temos, devemos ter mais respeito para com a sociedade que nos paga.
Climerio Avelino de Figueredo
Professor do Departamento de Fisiologia e Patologia/CCS/UFPB
climerioaf@bol.com.br
Imagem: Foto do Prof. Climerio Avelino de Figueredo.