Os professores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) estão em greve desde o dia 17 de maio de 2012, assim como os colegas docentes de 44 universidades federais brasileiras.
Como parte do "programa não-oficial da greve no Semioblog", o GESME registra na presente postagem a discussão ocorrida hoje no Centro de Ciências Médicas (CCM) da UFPB sobre a situação dos graduandos do Internato médico da UFPB durante o movimento paredista em curso.
Com a presença de vários professores do CCM, incluindo coordenadores setoriais do Internato, Vice-Coordenador do Curso de Medicina (e Coordenador Geral do Internato), quatro chefes de Departamentos, dois professores do Comando de Greve da Adufpb (Sindicato dos Docentes da UFPB) e a Diretoria do CCM, além de estudantes do curso, a reunião ocorreu na sala 127 do primeiro andar do Hospital Universitário Lauro Wanderley.
A presente postagem consiste em uma síntese narrativa da referida reunião. Esta teve início de maneira informal, como uma discussão em grupo, representando a continuidade da reunião ocorrida na quinta-feira passada, no mesmo centro, sobre o movimento grevista e o posicionamento dos docentes do CCM.
O Prof. Henrique Gil começou a discussão falando sobre a interrupção do Internato frente à iminente greve dos funcionários da UFPB. Afirmou que enquanto não houvesse definição sobre a paralisação do Internato, este continuaria no Departamento de Pediatria e Genética, em um modelo emergencial de funcionamento. Disse ainda que o Internato funcionava atrelado à residência médica em Pediatria. Mencionou que as faculdades particulares estavam tomando os espaços dos hospitais públicos da cidade como campo de estágio e que, do ponto de vista legal, como chefe de departamento, não tinha como articular diretamente com essas instituições (os hospitais) sobre a manutenção dos internos que estavam no rodízio de Pediatria. Nesse sentido, ponderou que só a Coordenação do Curso teria condições de gerir oficialmente esta conexão com os outros hospitais. Lembrou que foi quase consenso entre os coordenadores setoriais do Internato que este continuaria apesar da greve em andamento, com exceção do Departamento de Promoção da Saúde.
O Prof. Vladimir, representante do Comando de Greve e professor do Departamento de Promoção da Saúde, afirmou que este departamento não havia tido nenhuma reunião para decidir sobre tal questão, e que a opinião expressa por ele sobre a interrupção do Internato fora como membro do Comando de Greve e como professor.
Iniciaram-se inscrições para participação dos presentes na discussão.
A Profa. Rilva perguntou se quando o reitor da UFPB reconheceu a legitimidade da greve na semana anterior - o que seria oficializado pelo Consuni (Conselho Superior da UFPB) provavelmente ainda naquela semana - se isso representaria automaticamente uma suspensão do calendário acadêmico, e que repercussão esta suspensão teria sobre o Internato. O Prof. Vladimir respondeu que sim, e que representando um terço do curso de graduação em medicina, o Internato também seria suspenso, pois Internato era graduação. O Prof. Fernando, também do Comando de Greve e professor do Departamento de Educação Física, completou que quando a greve terminasse, o Consepe (Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão) da UFPB iria refazer o calendário acadêmico.
O Prof. Marco Antônio, diretor do CCM, declarou que a instância para decisão sobre a continuidade do Internato era o Colegiado do Curso de Medicina, assim como a Coordenação Geral do Internato. Continuou afirmando que o Internato não deveria parar, e que isso envolvia a assistência a pacientes, o que constituía uma peculiaridade do curso de Medicina e do treinamento curricular em serviço, o Internato.
O Coordenador Geral do Internato, Prof. Felipe, disse que consultou os coordenadores de áreas (do Internato) e o posicionamento geral destes foi o de manter as atividades curriculares dos internos durante a greve. Disse ainda que o Internato era diferente dos outros períodos do curso, embora o que estivesse em pauta não fosse a assistência, pois os internos não eram responsáveis por ela, e sim alunos em formação.
O Prof. Felipe declarou que havia dois pontos complicadores na atual greve: os convênios institucionais (como o da Prefeitura de João Pessoa, por exemplo) e o calendário das provas de residência médica. Opinou que a saída dos internos dos espaços de estágios na rede hospitalar pública da cidade implicaria em enfraquecimento dessa ocupação, que já sofria problemas, o que abriria mais espaço para as faculdades particulares. Quanto ao calendário das provas de residência, não haveria como os atuais internos (referindo-se aos períodos 100 e 110) recuperarem o acesso às inscrições da seleção do final do ano, objetivando as residências médicas de 2013.
O Prof. Felipe afirmou ainda que, sobre a complementação dos 75% das aulas do oitavo período, uma polêmica que agitara a reunião da semana anterior, aquele teria que parar, e que depois da greve, os alunos teriam o período de férias para fazer a reposição correspondente às aulas perdidas durante a greve.
O Prof. Henrique Gil pediu aparte para uma questão de ordem. Repetiu que a instância para decidir sobre interrupção ou manutenção das atividades do Internato era o Colegiado do Curso, como fora mencionado pelo Prof. Marco Antônio, mas opinou que isso deveria ter um registro formal, passando por reunião do próprio Colegiado.
O Prof. Luciano disse que aquela discussão deveria ser mais política que administrativa, pois decidir sobre paralisação de atividades não era atribuição do Colegiado nem do Consuni, e sim da assembleia dos docentes, que já decidira pela greve. Prosseguiu afirmando que era necessário que houvesse um fortalecimento da categoria dos professores, e que havia ônus inerente a qualquer posicionamento político. Lembrou que já passara por três greves de mais de 100 dias como estudante da UFPB, e que naquelas greves apoiara os professores na luta que era pela defesa da universidade, não apenas da categoria docente. Disse ainda que concordava que a residência médica não parasse, mas que na sua atividade deveria ser inserida uma discussão política com a comunidade, quando se poderia esclarecê-la sobre os motivos da greve.
O Prof. Luciano acrescentou que, em relação especificamente ao Internato, era preciso entender que "o interno era um aluno", e portanto, não era responsável por pacientes, e que o Internato "não segurava" serviço; disse ainda que se o internato estava "segurando" serviço, havia alguma coisa errada. Concluiu dizendo que, enquanto atividade acadêmica, o Internato deveria parar; ressaltou ainda o fato de que em outros cursos de graduação os estudantes que iriam se formar no final do ano também perderiam períodos de inscrição em mestrado e oportunidades profissionais em virtude da greve.
O Prof. Vladimir declarou que a greve já fora deflagrada, e os professores que se encontravam desenvolvendo atividades didáticas naquele momento estavam "furando" a greve. Acrescentou que era necessário parar o Internato também. Concluiu sua fala dizendo que "se era para continuar o Internato, que se continuasse o oitavo período também". Ainda em relação ao oitavo período, entretanto, disse que era preciso lembrar que o argumento de que faltavam 25% para alcançar os 75% da carga horária mínima necessária para considerar o semestre ganho tinha efetivamente um conteúdo apenas parcial, não era 100%.
O Prof. Maroja afirmou que a greve era danosa para os professores e para os estudantes. Ponderou que se houvesse manutenção das atividades do Internato, os alunos que estavam nessa fase iriam concluir a tempo, enquanto os demais não. Nesse sentido, lembrou que havia uma tendência de não haver reposição de aulas após a greve.
O Prof. Fernando falou da magnitude da adesão nacional de professores de universidades federais à atual greve. Ele fez uma analogia da manutenção das atividades no Internato com a de outros setores da universidade que ainda não pararam, mas que inevitavelmente suspenderiam suas atividades também com a continuidade do movimento grevista. Em relação ao Internato, afirmou que se este representava um terço do curso médico, a continuidade dele enfraqueceria o movimento grevista.
O Prof. Agostinho concordou que o Internato "não segurava" serviço, mas discordou de que houvesse interrupção dos rodízios que já estavam em andamento, e que era possível fazer isso, pois com a greve, três professores poderiam atuar em cada rodízio. Propôs que o Internato continuasse até a próxima reavaliação da situação, e que não se podia perder o apoio dos estudantes, embora tenha reconhecido que este último argumento não obteria a concordância de muitos colegas. Declarou também que "o governo não está nem aí se o internato vai parar ou não".
A Profa. Rilva afirmou que quando o reitor reconheceu a legitimidade da greve, esse não foi apenas um ato de proselitismo político, e que esse reconhecimento iria ser oficializado ainda naquela semana pelo Consuni, como o próprio Prof. Vladimir afirmara. Supôs que o passo seguinte seria a suspensão do calendário acadêmico, pois aquela seria uma medida para proteger os alunos no sentido de que o semestre fosse retomado após o término da greve, caso preponderasse a ideia de não reposição de aulas, que já havia sido ventilada na reunião passada no CCM. Ponderou que a greve atual provavelmente seria longa e questionou a hipótese do Prof. Agostinho de manter o Internato com apenas cerca de três professores em cada clínica, na vigência da greve iminente dos funcionários.
O Prof. Marco Antônio ponderou que havia condições novas permeando a atual greve, diferentemente das greves anteriores, e que nunca havia ocorrido uma greve nessas circunstâncias: a existência da lei dos estágios; o crescimento exponencial das faculdades particulares; o Internato de dois anos (no antigo currículo, era de dez meses). Finalizou dizendo que era necessário "entender a importância de a gente estar aqui, engajado nesse movimento".
Rebeca, aluna do quinto período e membro do centro acadêmico de medicina (Centro Acadêmico Napoleão Laureano - CANAL), afirmou que se solidarizava com o movimento grevista dos docentes. Disse que era necessário acrescentar à pauta da greve dos professores, a iminente greve dos médicos do hospital universitário e a atual situação de crise que vivenciava aquele hospital. Finalizou afirmando que a própria demanda por atendimentos no hospital pela população iria diminuir ao ser difundida a notícia de que estava ocorrendo uma greve. Informou ainda que o CANAL está promovendo a SECSS (Semana de Educação, Currículo, Saúde e Sociedade).
O Prof. Vladimir perguntou quem, dentre os professores presentes, vivia apenas do salário como docente. A partir do ângulo de visão da repórter do GESME, levantaram as mãos três professores. Ele então considerou que a greve era uma questão de sobrevivência para os professores, que deveriam dizer não à "auto-exploração". Mostrou então diapositivos que exibiam características da ascensão funcional na carreira docente no magistério superior em comparação com outras carreiras docentes, e disse que o sindicato nacional propunha que, independente da titulação, o professor iniciante deveria começar na categoria de auxiliar de ensino. Afirmou ainda que aquela greve não era apenas pela questão salarial, mas também pela melhoria da carreira.
O Prof. Vladimir discordou do Prof. Agostinho, como este previra, quanto à questão da perda do apoio dos alunos em caso de suspensão do Internato. Afirmou ainda que os alunos costumavam deixar as atividades do Internato "para ir ao Medcurso". Finalizou declarando que "este é um momento ímpar, com a adesão de professores de 44 universidades à greve!", e que as pessoas tinham que estar presentes no campus durante o movimento grevista. Repetiu ainda o que já afirmara na reunião ocorrida quinta-feira passada: "Não participar da luta é uma contradição pedagógica!"
Homero, aluno do período 120 período, afirmou que não havia como derrubar a lógica dos professores do Departamento de Promoção da Saúde, que segundo sua opinião, eram os mais militantes do CCM, tendo ajudado muito sua turma no início da graduação, turma que fora pioneira na nova grade curricular e que se formaria em novembro próximo (em seis meses). Sobre a participação dos alunos do Internato no andamento dos serviços do hospital universitário, afirmou que "tudo aqui dependia dos internos" (referiu-se ao funcionamento das enfermarias do hospital). Supôs que, com a greve dos funcionários no próximo dia 11, cuja deflagração era "100% de certeza", e a decorrente parada da atividade ambulatorial, a greve iria aparecer na mídia.
Homero declarou que com a greve dos funcionários no dia 11 de maio, ele e seus colegas de turma iriam tentar "contingenciar" (ou seja, tinham um plano alternativo), e que a lei os resguardaria. Mencionou que em Campina Grande (Universidade Federal de Campina Grande), o Internato continuaria na vigência da greve dos professores. Afirmou ainda que tem recebido orientação do Prof. Severino (Pró-Reitor de Assistência Estudantil) e que aquela orientação estava sendo fundamental.
O Prof. Marco Antônio declarou que "temos que pensar bem, pois esse momento é muito peculiar". Disse ainda que o momento atual era resultado de uma nova conjuntura que se formara, embora não se tencionasse retardar o processo de formação dos estudantes.
O Prof. Maroja considerou a situação contraditória da baixa cobertura da greve nacional dos docentes pela imprensa, em comparação com a repercussão midiática do recente e bizarro episódio envolvendo uma atriz de telenovelas. Afirmou que tanto a imprensa quanto o governo divulgavam inverdades sobre a situação dos professores federais e sobre a greve. Mencionou que o Ministro da Educação até já exibira, através da imprensa, um contra-cheque de um docente de universidade federal, referente ao salário que sairia apenas no próximo mês...
Por outro lado, o Prof. Maroja fez menção aos textos escritos pelo Prof. Climério*, que embora parecesse um tanto radical segundo ele, "tinha toda razão". [...] "Nessa universidade tudo corre frouxo", declarou o Prof. Maroja. Finalizou dizendo que a presença de apenas uma dúzia de professores naquela reunião dava um testemunho vívido do que denunciara o colega Climério.
A Profa. Rilva afirmou que embora fosse importante mostrar naquele momento a situação dos docentes como trabalhadores explorados, a questão já era bem conhecida, sobretudo por quem tinha vínculo de dedicação exclusiva com a universidade e que não podia ter outro emprego, vivendo apenas daquele salário. A questão dialética sobre ser a greve justa ou não já havia sido discutida na assembleia de decretação de greve e divulgada também pelo sindicato. Assim, seria melhor se ater ao objetivo daquela discussão, que havia sido marcada precisamente para avaliar a possibilidade de continuação das atividades do Internato.
O Prof. Jacicarlos discordou, afirmando que era contrário à busca da objetividade. Também se declarou avesso à meritocracia, e criticou artigos científicos em que apenas dois dos que figuravam como autores realmente participaram da sua elaboração. Disse ainda que "nós não nos reunimos para discutir educação". Por outro lado, afirmou que a "universidade não tinha que dar satisfação à sociedade". Finalmente, disse: "sou pelo radicalismo". Segundo ele, a parada das atividades era tanto pela situação da educação quanto pela medicina.
O Prof. Vladimir afirmou que considerava que a atual greve estava tendo um espaço maior na mídia, pois o assunto já fora objeto de publicações no site da Uol (Universo Online), no Jornal Folha de São Paulo e na Revista Veja.
O Prof. Felipe disse que em sua primeira fala naquela reunião havia considerado a dimensão "organizativa", e naquele momento final faria uma síntese do que se estava propondo para o Internato em vista daquela greve e da greve dos funcionários que se antevia. Afirmou que não havia como continuar o Internato durante a greve dos funcionários. Contudo, a Comissão do Internato previa a antecipação dos estágios optativos para a turma do 120 período, pois embora os optativos devessem ser cumpridos apenas ao final do Internato, "estava previsto no currículo" e era possível tal prática diante da situação de greve. Os alunos do 120 período entrariam então no cumprimento dos optativos e, ao término destes, retornariam para concluir o rodízio em que se encontravam no momento do início da greve dos funcionários. Portanto, só seriam mantidas as atividades do 120 período do Internato, "em virtude de todo o contexto".
O Prof. Felipe lembrou que embora o Internato representasse um terço do curso, naquele momento havia "apenas" 150 alunos (ou seja, três turmas), passando por aquela última fase da grade curricular. Disse ainda que as turmas dos demais períodos do Internato não poderiam antecipar o estágio optativo pois não haveria possibilidade de englobar todo o contingente de 150 alunos naquela solução que fora encontrada. "Não há como colocar 150 em optativos", disse ele.
O Coordenador Geral do Internato declarou ainda que aquele fórum (reunião) era soberano para a tomada de uma decisão, embora tivesse afirmado inicialmente que a instância para deliberar sobre qualquer medida fosse a Comissão do Internato, formada por ele, coordenador geral, e pelos coordenadores das quatro áreas básicas, além de um representante de cada turma de alunos cursando o Internato e um representante do Centro Acadêmico de Medicina.
O Prof. Henrique Gil afirmou que considerava razoável a proposta do Coordenador Geral do Internato.
O Prof. Maroja sugeriu que as reuniões para discussão do movimento grevista deveriam ser realizadas semanalmente, como parte da programação da greve no CCM. O Prof. Marco Antônio considerou esta sugestão pertinente e afirmou que iria promover tais discussões periodicamente, convidando os membros do centro por correio eletrônico.
A Profa. Rilva questionou se não haveria votação da proposta colocada pela Coordenação do Internato, e o Prof. Fernando, da Adufpb, respondeu que, como esta fora "consensual", não seria necessário submetê-la à votação.
O Prof. Marco Antônio encerrou a reunião.
* Os referidos textos do Prof. Climério também foram postados no Semioblog: