Moderação: Profa.
Rilva Muñoz
Discussão com a Turma
2 de Graduação em Medicina da UFPB 2010.2
A discussão realizada com a turma 2 de
Semiologia Médica da UFPB teve início com a recomendação da moderadora de que
se começasse pelo tópico da insuficiência renal aguda (IRA). Luiz deu início à
discussão, comentando o conceito da síndrome da IRA, porém o fez com
sobreposição de aspectos etiopatogênicos referentes às síndromes de
insuficiência renal crônica e de insuficiência renal aguda, ao referir que
havia insuficiência da filtração glomerular associada a processos inflamatórios
crônicos e auto-imunes. Do ponto de vista clínico, ele comentou sobre os
achados à ectoscopia, como anasarca, facies renal, aumento da
pressão arterial e oligúria, não havendo alterações características à palpação
dos rins.
A moderadora comentou, então, que era
preciso fazer a distinção entre os dois quadros, o da síndrome de insuficiência
renal aguda e o da crônica, tanto do ponto de vista etiopatogênico,
fisiopatológico quanto evolutivo e clínico-semiológico. Esperou-se que, na
discussão, surgisse a expressão-chave para caracterizar a insuficiência renal
aguda (IRA), a necrose tubular aguda (NTA), mas ainda demorou um pouco para que
esta fosse mencionada e se chegasse à discussão da IRA propriamente dita,
distinguindo-a da insuficiência renal crônica (IRC).
Primeiro, Graziela comentou os
mecanismos auto-reguladores dos rins, afirmando que o principal papel da
auto-regulação era manter a filtração glomerular relativamente constante e
permitir o controle da excreção renal de água e solutos. Referiu ainda que
havia auto-regulação do fluxo sanguíneo renal e da filtração glomerular, em
resposta a mudanças da pressão arterial e da intensidade do fluxo do líquido
tubular, partindo do túbulo, da mácula densa, e gerando feedback para
o glomérulo, como a diminuição da resistência das arteríolas aferentes, com
elevação da pressão hidrostática glomerular, contribuindo para normalizar a
filtração. Lembrou que arteríolas aferentes e eferentes dos rins são inervadas
por fibras simpáticas, que também inervam as células justaglomerulares
produtoras de renina. Mencionou também o sistema
renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), que é tão importante na manutenção da
homeostase, e também, por outro lado, é responsável pela fisiopatologia de
muitos quadros clínicos envolvendo o rim. Acrescentou também que existe no rim
um importante balanço entre estes agentes vasoconstritores e os
vasodilatadores, na regulação da filtração glomerular. Dentre os agentes
vasodilatadores, citou peptídeos como bradicinina, prostaglandinas e peptídeos
natriuréticos. Ela disse ainda que a vasodilatação da arteríola aferente e
a vasoconstrição de arteríola eferente eram capazes de alterar a taxa de
filtração. Afirmou, por fim, que a falência
renal se apresenta clinicamente quando a filtração glomerular cai abaixo de 30
mL/min. Contudo, finalizou declarando que havia um processo de
“necrose glomerular aguda ”, onde cometeu um equívoco
fisiopatológico. E continuamos esperando pela expressão-chave da fisiopatologia
da IRA...
Nicole passou, então, a discorrer sobre a
classificação fisiopatológica da IRA, em pré-renal (diminuição da filtração
glomerular acompanhada de lesão renal intrínseca, como ocorre nos quadros de
desidratação grave, cirrose, insuficiência cardíaca, hipotensão grave, hemorragias,
grandes queimaduras, choque cardiogênico), renal (necrose tubular aguda,
glomerulonefrite, hipertensão arterial maligna, infecções, intoxicação por
drogas anti-inflamatórias) e pós-renal (obstruções do fluxo urinário
como cálculos, tumores e coágulos). Foi aí apareceu a expressão-chave esperada:
necrose tubular aguda (NTA). Em virtude do grande predomínio da NTA como causa
de IRA intrínseca, essa entidade serve de base para o estudo fisiopatológico do
quadro.
Na IRA pré-renal, haveria
vasoconstricção, chegando menos sódio e havendo ativação do SRAA. Nicole
comentou ainda que a IRA apresentava geralmente quatro fases: isquemia, com
“leve uremia”, seguida por uma segunda fase oligúrica, pela redução da
reabsorção e diminuição da volemia, uma terceira fase, com poliúria, e ainda
uma quarta fase, de recuperação.
A IRA pré-renal é essencialmente
reversível se o distúrbio volêmico for corrigido em tempo. No entanto, a
manutenção prolongada dessa hipoperfusão renal pode causar lesão e necrose de
células tubulares, principalmente nos segmentos renais localizados na medula
externa (pars recta do túbulo proximal e porção espessa da alça de
Henle).
Nicole citou ainda algumas repercussões do quadro
de IRA: uremia, encefalopatia urêmica, hipertensão arterial sistêmica, edema pulmonar,
distúrbios hidreletrolíticos (hiponatremia, hipervolemia, hipercalemia).
A moderadora interveio para corrigir o
sentido que havia sido atribuído à palavra uremia. Esta é conceituada como uma
síndrome consequente à perda, geralmente lenta e progressiva, da capacidade
excretória renal, ou seja, é uma redução arrastada e insidiosa da filtração
glomerular, não devendo ser um termo empregado para os casos de IRA. Como
consequência da perda progressiva, há elevação das concentrações plasmáticas
dos catabólitos derivados do metabolismo proteico, levando ao aumento da ureia
e da creatinina, o que se denomina azotemia; este último termo, sim, é um
achado laboratorial, e pode ser empregado tanto nos casos de IRA e IRC.
Roberta comentou que o exame físico do
paciente com IRC depende da causa básica. Se a causa for doença policística
renal, por exemplo, os rins serão palpáveis.
Então, Lojoama mencionou termos
importantes para definir a fisiopatologia da IRA: hipoperfusão e isquemia.
Edilza complementou afirmando que, além da isquemia, a IRA poderia decorrer de
agressão nefrotóxica. Esta última pode ocorrer por ação de toxinas exógenas
(antibióticos, anestésicos, contrastes radiológicos, solventes, venenos de animais peçonhentos) ou endógenas (mioglobina, hemoglobina,
ácido úrico e paraproteínas). A moderadora lembrou que os pigmentos derivados
do heme (hemoblobina e mioglobina) podem ser causa de agressão nefrotóxica.
Uma lesão muscular extensa, com liberação de substâncias intracelulares na circulação,
pode ser causada por trauma muscular, hipertermia
maligna e exercício físico extenuante, e que pode levar tanto obstrução tubular por cilindros de mioglobina
quanto lesão tóxica direta nos túbulos. Graziela lembrou que a
hemoglobinúra, que ocorre em quadros de hemólise intravascular, também pode
levar a necrose tubular aguda, por agressão tóxica.
Ana Carolina questionou por que há
poliúria no quadro de IRA. Explicou-se que, apesar da persistência da
incapacidade tubular em reabsorver água, sódio e potássio, passa a haver um
quadro de “diurese osmótica”, consequente à eliminação de ureia e outros
solutos retidos na fase oligúrica anterior, além da incapacidade parcial dos
túbulos em reabsorver água e eletrólitos. Por outro lado, há um quadro de “hiperidratação”,
com excesso de água e sódio, retidos na fase oligúrica.
Gabriela falou sobre a IRA pós-renal
obstrutiva. Esta pode ser decorrente de
obstrução secundária a cálculos, neoplasias de bexiga e órgãos pélvicos,
prostatismo, edema uretral secundário à instrumentação urológica e ligaduras
inadvertidas dos ureteres.
A moderadora comentou ainda a existência
de nefrite tubulointersticial aguda, que pode causar diminuição da filtração
glomerular por processo inflamatório na região intersticial do rim. As causas
são uso de fármacos (principalmente penicilinas), infecções ou infiltrações
celulares (doenças auto-imunes, inflamatórias etc). Portanto, a NTA,
isquêmica ou nefrotóxica, constitui-se na principal causa de IRA, mas em
adultos, o diagnóstico diferencial deve incluir as e as glomerulonefrites.
Passou-se, então, à discussão sobre a
insuficiência renal crônica (IRC). Stefano começou comentando que há redução de
taxa de filtração glomerular, inflamação, depósito de crescentes,
imunocomplexos, leucócitos, anticorpos, complemento, na cápsula de Bowman,
havendo azotemia, que é a retenção de substâncias nitrogenadas no plasma,
paralela à redução população néfrons. As crescentes mencionadas ocorrem na
glomerulonefrite rapidamente progressiva, e são constituídas por células
proliferadas do folheto parietal da cápsula de Bowman e monócitos, que reduzem
ou obliteram o espaço desta cápsula e se fundem com os tufos capilares,
diminuindo ou impedindo a filtração glomerular.
A moderadora referiu que o quadro
fisiopatológico descrito acima foi o da síndrome nefrítica, que geralmente culmina
com quadro de IRA ou IRC, o que foi diretamente relacionado à IRC na fala de
Stefano consistiu na menção da redução da população de néfrons funcionais. A IRC consiste, na verdade, em perda progressiva e
irreversível das funções renais, e portanto, da função glomerular, função
tubular e função endócrina. Em sua fase mais avançada, os rins não conseguem
manter a normalidade (uremia).
A moderadora explicou
que o termo insuficiência renal crônica foi substituído recentemente pela
expressão doença renal crônica (DRC), que designa tanto condições nas quais há
perda insidiosa da função renal, quanto condições nas quais há lesão renal com
função ainda preservada. A DRC é dividida em seis estágios funcionais de acordo
com o grau de função renal do paciente. Estes estágios compreendem desde a fase
em que os indivíduos não apresentam lesão renal e mantêm sua função renal
normal, porém se encaixam dentro do grupo de risco, até a fase cinco, que
inclui o indivíduo com lesão renal e insuficiência renal terminal ou dialítica.
Dado que a função de excreção de
catabólitos é resultante principalmente da filtração glomerular, a IRC
consiste, assim, em uma perda progressiva da filtração glomerular, que pode ser
avaliada pela medida do “clearance” de creatinina em urina de 24 horas.
Na fase chamada "zero", existe aumento de risco de lesão renal,
mas o paciente não apresenta anormalidades urina e o clearance (depuração) de
creatinina está acima de 90 mL; na fase 1, há anormalidades urinárias, mas
clearance ainda acima de 90; fase 2, clearance entre 60 e 89; fase 3, clearance
entre 30 e 59; fase 4, clearance entre 15 e 29; fase 5 ou terminal, abaixo de
15.
Os participantes da
discussão passaram, então, a citar as várias causas de IRC. Diversas doenças
sistêmicas e primárias renais culminam em agressão lenta do parênquima renal,
que fica danificado de forma irreversível.
Renan Fernandes mencionou a pielonefrite
crônica e a nefrite intersticial crônica. Samuel citou a hipertensão arterial
sistêmica como causa de IRC; a principal repercussão morfológica renal da
hipertensão é genericamente denominada nefroesclerose, que pode ser
caracterizada como benigna ou maligna. A moderadora lembrou que na hipertensão arterial, o rim pode, ao mesmo tempo,
ser a causa da hipertensão, ou sofrer seus efeitos lesivos, como um órgão-alvo
do aumento crônico da pressão arterial. Assim, o rim e a hipertensão arterial
interagem de maneira íntima e complexa, sendo a hipertensão causa ou
consequência da doença renal.
Mateus Dantas lembrou do diabetes
mellitus como causa de IRC. A moderadora comentou que o diabetes mellitus (DM)
é uma das causas mais importantes de IRC no mundo, sendo responsável por
aproximadamente 45% dos casos de terapia de substituição renal nos Estados
Unidos. No Brasil, as estatísticas são menos precisas, mas segundo a Sociedade
Brasileira de Nefrologia, as causas mais frequentes de IRC são hipertensão
arterial sistêmica, seguida pelo DM.
Mateus Vinicius comentou que o depósito
de lipídeos nos vasos renais ocasionava IRC. A moderadora lembrou, entretanto,
que o depósito de lipídeos relaciona-se à macroangiopatia e à microangiopatia,
levando, portanto, a doença arterial obstrutiva periférica, doença coronariana
e acidentes vasculares encefálicos. Contudo, o nexo destas situações com o rim
seria a síndrome metabólica, que tem na lesão endotelial um mecanismo
fisiopatológico importante. A relação que existe entre doença renal
crônica e depósito de colesterol nos vasos renais é que aumenta o risco de dano
renal com o número de fatores de risco da síndrome metabólica, e que também
podem levar ao comprometimento renal crônico, com possível hipertensão
renovascular, mas não levando diretamente à IRC.
Lojoama lembrou que o aumento de pressão hidrostática glomerular aumenta a
taxa de filtração, mas a autorregulação permite uma constância relativa da taxa
de filtração glomerular e do fluxo plasmático renal dentro de um intervalo de
pressões, prevenindo que alterações sistêmicas da pressão arterial repercutam
de modo intenso sobre a filtração. Ou seja, embora a ocorrência de variações na
pressão arterial exerça influência sobre o fluxo sanguíneo renal, os rins
dispõem de mecanismos eficazes para manter este fluxo sanguíneo renal e a
filtração glomerular relativamente constantes. Este processo é denominado
auto-regulação, que foi mencionada no início desta discussão.
Samuel comentou que a hiperinsulinemia
era um fator importante no desenvolvimento da nefropatia diabética.
A resistência insulínica e a hiperinsulinemia compensatória constituem
importantes fatores associados ao desenvolvimento da lesão renal. Além dos
efeitos clássicos relacionados ao metabolismo da glicose, a insulina exerce
ação vasodilatadora da arteríola aferente e aumenta a expressão de fatores de
crescimento sobre as células mesangiais. A moderadora completou que, entre
esses fatores, o fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1) promove
proliferação de vasos renais e células mesangiais.
Ana Carolina comentou que existe
associação entre hepatites virais B e C e glomerulopatia e que este quadro pode
evoluir para IRC.
Daniel mencionou que a nefropatia
diabética é uma glomerulopatia, já que os
efeitos da doença no rim ocorrem nos
glomérulos. A nefropatia diabética é uma das principais causas de
nefropatia terminal em vários países, e é antecedida em muitos anos pela
presença de hiperfiltração glomerular, alteração ainda reversível, mas que
anuncia o risco de instalação da nefropatia crônica propriamente dita.
Lojoama questionou qual a relação entre
cirrose hepática e insuficiência renal. A moderadora mencionou, a propósito,
a síndrome hepatorrenal, uma forma grave de insuficiência renal.
Trata-se de uma insuficiência renal
funcional (não há lesão morfológica), ocasionada por redução do fluxo sanguíneo
para os rins e inversão do fluxo córtico-medular, nos pacientes portadores de
cirrose hepática. Não se conhece a causa precisa da síndrome hepatorrenal,
mas possivelmente este quadro ocorra pelo fato de os pacientes com
doença hepática, hipertensão portal ou ascite, terem volume plasmático
aumentado, mas volume arterial efetivo baixo, devido à vasodilatação e ao
desvio do sangue na circulação portal, havendo um quadro de vasodilatação
arterial esplâncnica.
Luiz aludiu à existência da
glomerulonefrite lúpica como causa de IRC, e Edilza, às doenças infecciosas,
como esquistossomose, varicela e malária, como causa de glomerulonefrites
secundárias, as quais podem acabar culminando com IRC.
Graziela passou a falar sobre as
manifestações hematológicas da IRC, afirmando que a deficiência de
eritropoetina é o fator principal responsável pela anemia, que resulta da
depressão da medula óssea resultante da redução de produção desse hormônio na
IRC. Joanna complementou afirmando que a alteração na eritropoiese também se
devia a outros fatores que acompanham a síndrome urêmica, como as alterações
qualitativas das plaquetas, redução da vida média das hemácias e sangramentos
originários de lesões do trato digestório, que são comuns na IRC. A moderadora completou que a anemia é
relativamente incomum em pacientes nos estágios iniciais da DRC, mas sua
prevalência aumenta significativamente quando o clearance de
creatinina está abaixo de 60 mL/min e torna-se mais frequente e grave quando se
aproxima de 30 mL/min.
Dened mencionou o edema pulmonar e a
pericardite como complicações cardiovasculares da IRC. A moderadora
complementou que estas são a principal causa de óbito dos pacientes portadores
de doença renal crônica. Além do edema pulmonar, pode ocorrer derrame pleural,
principalmente no paciente com IRC terminal. Descreve-se ainda o quadro chamado
de “pulmão urêmico”, decorrente de insuficiência ventricular esquerda.
Ana Carolina comentou a ocorrência da
osteoporose na IRC, referindo-se ao quadro chamado de osteodistrofia renal. A
moderadora corrigiu o termo usado, que deveria ser osteomalácia, caracterizada
pelo excesso de osteoide (colágeno ósseo não-mineralizado) devido a uma
incapacidade de mineralização, enquanto a
osteoporose é a diminuição da densidade mineral óssea, com deterioração da
microarquitetura do osso, levando a um aumento da fragilidade esquelética e do
risco de fraturas. O ponto de partida da osteodistrofia renal é a redução da
produção da vitamina D3 pelo rim, à medida que a massa renal vai sendo
reduzida, do que decorre a redução da absorção intestinal de cálcio pelo
intestino.
O
processo de osteodistrofia renal geralmente tem início com a retenção de fósforo
devido à incapacidade de sua excreção ocasionada pela queda na filtração
glomerular (clearance em torno de 60 mL/min). Associado a isso, há
diminuição da conversão da vitamina D em sua forma ativa pelo rim e consequente
hipocalcemia. Estas alterações iniciais acarretam elevação do paratormônio
(PTH), que é o hormônio responsável pela manutenção da calcemia numa estreita
faixa, dita fisiológica.
Os
estados de hipocalcemia e hiperfosfatemia crônicos são estímulos para o
desenvolvimento de hiperplasia das paratireoides, que, por conseguinte,
diminuem a expressão dos receptores de cálcio e calcitriol, tornando-se a
glândula menos responsiva às elevações séricas do cálcio e desta vitamina.
Outros fatores que contribuem para patogênese do hiperparatireoidismo
secundário são a resistência óssea à ação do paratormônio e a acidose
metabólica.
Germano comentou que ocorre hipocalcemia
no quadro da IRC. A hipocalcemia resulta de redução da absorção intestinal
deste mineral, alteração do intercâmbio de cálcio do osso para o sangue e
hipofosfatemia. Em decorrência da hipocalcemia, passa a haver
hiperparatireoidismo secundário, que aparece precocemente, quando a taxa de
filtração glomerular encontra-se entre 60-90 mL/min; são, na verdade, a
hiperfosfatemia e hipocalcemia crônicas que estimulam a hiperplasia das
glândulas paratireoides.
Dened mencionou as manifestações
digestórias da IRC, que são náuseas, vômitos e diarreia. A moderadora
complementou afirmando que os sintomas digestórios são os mais comuns e
numerosos, e os que trazem mais desconforto aos pacientes. As mais temíveis são
as decorrentes de erosões da mucosa, levando a hemorragia digestiva.
Depois de se terem descrito tantas
manifestações aa IRC, Luana perguntou, então, como suspeitar de IRC, se há
tantos sinais e sintomas?... Realmente a função renal diminuída está associada
com complicações em virtualmente todos os sistemas e órgãos. A presença de
fatores de risco, o acompanhamento evolutivo do paciente e os exames
complementares (ureia, creatinina, proteinúria, sedimento urinário, clearance de
creatinina, ultrassonografia renal) contribuem para estabelecer o diagnóstico
de uremia.
Renan Fernandes mencionou ainda os
sintomas e sinais neurológicos que ocorrem paralelamente à azotemia, tais como
apatia, agitação, redução da capacidade cognitiva e coma. Portanto, a
encefalopatia urêmica apresenta-se como um complexo de sintomas que progride
desde uma leve obnubilação sensorial até delirium e coma. Nos casos não tratados, o coma é precedido por
confusão e períodos alternantes de sonolência e agitação, acompanhados de
movimentos involuntários anormais caracterizados por tremor, asterixis,
mioclonias e crises convulsivas. Renan Fernandes citou também a
síndrome das pernas inquietas, que resulta
dos efeitos da uremia sobre o sistema nervoso periférico, havendo uma
necessidade compulsiva e intensa de movimentar os membros inferiores, sobretudo
à noite. Este quadro não é exclusivo da insuficiência renal.
Dened perguntou o que seria asterixis.
Asterixis ou flapping é um transtorno motor caracterizado
por tremor grosseiro, como um “bater de asas”, quando o antebraço é
mantido fixo e o punho é hiperestendido. Esse sinal foi primeiramente descrito
na encefalopatia hepática, mas significa uma alteração difusa do córtex
cerebral e pode ser observado também na encefalopatia urêmica e em intoxicações.
Ranulfo mencionou que na IRC pode
ocorrer hipertrofia cardíaca e insuficiência cardíaca congestiva. Os
fenômenos ligados à hipertrofia ventricular esquerda têm sido bem
descritos como um componente frequente da doença renal crônica. Renan
Figueiredo comentou que havia polaciúria na IRC, o que foi corrigido, o que
ocorre, na verdade, é poliúria. Mesmo na fase inicial da IRC, a alteração
principal é a incapacidade de o rim concentrar a urina. Além disso, o estado de
azotemia conduz a uma espécie de diurese osmótica, clinicamente exteriorizada
por poliúria. Paralelamente, manifesta-se nictúria, que é o aumento do volume
urinário noturno com inversão do ritmo nictemérico. Só na fase terminal,
instala-se oligúria e retenção hídrica.
Mateus Dantas comentou que a oligúria da
fase terminal é acompanhada pelo aumento da creatinina no sangue, porém é
preciso lembrar que, mesmo havendo poliúria nas fases anteriores da IRC, já
existe azotemia.
Mateus Leite mencionou que a poliúria
era desencadeada também pelo aumento do retorno venoso. Na verdade, é a
nictúria que resulta deste mecanismo, pois
o líquido retido na periferia durante o dia retorna à
circulação com o decúbito noturno e, desse modo, aumenta o fluxo plasmático
renal.
Mateus Vinicius comentou que há acidose
metabólica na IRC, decorrente da queda da filtração
glomerular, com acúmulo de íons hidrogênio gerados a partir do
metabolismo de aminoácidos, além da
incapacidade renal de excretar íons hidrogênio.
Dened lembrou-se da chamada “neve
urêmica” na pele. Ocasionalmente, pode-se observar uma camada de escamas esbranquiçadas
constituídas por cristais de ureia presentes no suor, a “neve urêmica”, embora
esta alteração seja mais rara atualmente. Observa-se mais frequentemente palidez, atribuída à anemia, pele amarelada, devido à
retenção de pigmentos lipossolúveis na derme e subcutâneo, como carotenoides e
urobilinogênios, o que confere à pela uma tonalidade amarelo-palha. A
pele também se torna seca (xerose urêmica) e pruriginosa. É comum discreta
infiltração edematosa da face.
Há necessidade dessa
acentuada redução da filtração glomerular, correspondente a 25% da função
normal para que a ureia e a creatinina plasmáticas se elevem acima das taxas
normais. Nessa fase, as alterações hematológicas, endócrinas, neurológicas,
gastrintestinais, dermatológicas e hidroeletrolíticas são mais evidentes.
Passou-se, então, à discussão sobre a
síndrome nefrótica, começando por Renata, que conceituou a síndrome como a
presença de proteinúria e hipoalbuminemia. Ela mencionou ainda as causas de
síndrome nefrótica, como as primárias (lesões mínimas, glomeruloesclerose
segmentar, entre outras) e as secundárias (diabetes mellitus, amiloidose, lupus
eritematoso sistêmico), e também explicou sua fisiopatologia, expondo a
alteração da filtração da membrana basal glomerular com a consequente perda de
proteínas e hipoalbuminemia, redução da pressão oncótica e edema. A moderadora
citou ainda a hiperlipidemia e complementou que a proteinúria é do tipo maciça.
Jérsica explicou que a queda na pressão
oncótica associava-se ao aumento da pressão hidrostática, com ativação do SRAA,
para produzir a anasarca presente na síndrome nefrótica. Ana Carolina completou
que a proteinúria maciça alcança níveis acima de 3,5 g/24h.
Luiz comentou que o fígado só tem
capacidade de produzir até 3,5g de albumina. A moderadora não pôde confirmar
esta assertiva, embora a hipoalbuminemia resultante da síndrome nefrótica seja
geralmente da ordem de menos de 3,0 g/dL. Sabe-se que a faixa ideal dos
níveis de albuminemia é de 4,0-5,0g/100 mL, e o fígado é o principal local de
produção de albumina, ocorrendo hipoalbuminemia por déficit de produção hepática quando há uma
redução de mais de 80% da massa funcional do órgão.
Ivana comentou que a membrana basal glomerular tem carga
elétrica negativa (aniônica). Esta a carga elétrica é um fator que influencia a permeabilidade da membrana
basal glomerular. Moléculas do tamanho da albumina tem carga negativa e, pelo
seu tamanho, poderiam atravessar a membrana basal, porém o fato de apresentar
carga negativa faz com que a sua passagem através desta membrana seja
desprezível. Nas glomerulopatias, existe perda de cargas aniônicas e aumento da
densidade de poros não-discriminantes da membrana basal glomerular, o que leva
ao aumento da sua permeabilidade com consequente proteinúria. Nas
glomerulopatias onde ocorre apenas perda de carga (glomerulonefrite por lesões
mínimas), as proteínas encontradas na urina são basicamente albumina e transferrina,
portanto, trata-se de uma proteinúria seletiva.
Jader explanou que a elevação da colesterolemia na
síndrome nefrótica ocorre às custas de aumento dos níveis de LDL (colesterol de
baixa densidade). A moderadora complementou que na síndrome nefrótica, também
está elevada a concentração plasmática e diminuída a depuração de VLDL
(colesterol de muito baixa densidade) e de quilomicrons, que são aterogênicos.
Mateus Dantas mencionou outros tipos
histológicos relacionados à ocorrência de síndrome nefrótica, tais como a
membranosa, a proliferativa e a esclerose focal, que são confirmadas por
biópsia renal.
Maurício citou o mieloma múltiplo como
causa de síndrome nefrótica secundária.
Jader comentou também que na
síndrome nefrótica a lesão à célula endotelial da membrana basal
glomerular é acompanhada por ativação de vias inflamatórias e aumento na
expressão de citocinas, fatores de crescimento e recrutamento de células
inflamatórias, fator de necrose tumoral e consumo de complemento.
Edilza esclareceu que no substrato
patológico chamado de lesões mínimas, que ocorre mais em síndrome nefrótica que
acomete crianças, ocorre alteração nos podócitos, células epiteliais
glomerulares, que são células terminalmente diferenciadas que revestem a
membrana basal glomerular. Por conseguinte, constituem a barreira final para a
perda de proteína.
Em seguida, a discussão passou para o
tópico da síndrome nefrítica. Jader apresentou os componentes semiológicos da
síndrome: hematúria, oligúria, proteinúria, edema e azotemia. Ele comentou
ainda que a lesão glomerular associa-se a hipercelularidade, que produz
hipertensão capilar e aumento da filtração glomerular. Há ainda liberação de
mediadores inflamatórios (citocinas e quimiocinas), que induzem ao acúmulo de
células mononucleares no interstício renal e redução do espaço mesangial. Isso
significa que a reação inflamatória é de causa imunológica e produz lesão renal
por vários mecanismos: ativação do complemento, infiltração celular, ativação
de fatores de coagulação e produção de linfocinas. Jader falou também sobre a
dismorfia eritrocitária observada no exame de urina, na interpretação de
um quadro de hematúria, para determinar se sua origem é glomerular ou
não glomerular. No primeiro caso, a suspeita de glomerulonefrite como causa
da hematúria é sustentada pela presença de eritrócitos dismórficos em uma
contagem de, pelo menos, 20%, em campo de grande aumento.
Vários alunos citaram ainda que as
síndromes nefríticas incluem também as seguintes etiologias, além das já
mencionadas: glomerulonefrite pós-estreptocócica, endocardite bacteriana
subaguda, nefropatia por IgA (doença de Berger), púrpura de
Henoch-Schönlein e síndrome de Goodpasture.
Seguindo a discussão, passou-se à
conversação sobre as síndromes urinárias infecciosas. A infecção sintomática do trato urinário é uma das
mais frequentes de infecções bacterianas, a segunda infecção mais comum na
população em geral, predominando entre os adultos do sexo
feminino. No adulto do sexo masculino, geralmente acima dos 50 anos,
favorecem a infecção a instrumentação das vias urinárias – incluindo-se o
cateterismo vesical (inserção de sonda) - e a hiperplasia prostática.
A mediadora comentou que há autores que consideram as
uretrites e as prostatites, mesmo que de origem infecciosa, não se incluem no
conceito de infecção urinária. No entanto, os processos que acometem desde o
meato uretral ao córtex renal, além de estruturas adjacentes às vias urinárias,
como próstata e glândulas uretrais, cujo denominador comum é a invasão de
microrganismos em quaisquer desses tecidos, deve entrar no conceito de infecção
do trato urinário.
Luana afirmou que as estas infecções poderiam ser
classificadas de várias maneiras: alta e baixa; aguda, crônica e recorrente; reinfecção
(infecção que se repete com outro agente etiológico) e recidiva (infecção que
se repete pelo mesmo agente); complicada e não complicada. A infecção urinária é complicada quando ocorre em um
aparelho urinário com alterações estruturais ou funcionais. Por exemplo, infecção urinária coexistindo com litíase ou com outro tipo de obstrução.
Discutiu-se que a síndrome infecciosa é decorrente da
invasão do trato urinário por microrganismos que desencadeiam uma
resposta inflamatória. Essa invasão é em geral bacteriana,
atingindo o trato urinário por via ascendente, hematogênica ou
linfática. A maior parte dos casos é causada pela E. coli e outras enterobactérias.
Para as enterobactérias produzirem infecção, precisam
aderir às células do introito vaginal, multiplicar-se, colonizar
estes locais e, finalmente, invadir a uretra e a bexiga. O fator
bacteriano mais importante nas enterobactérias é o
seu poder de adesão à mucosa da bexiga para que não sejam
eliminadas pela micção.
Joanna falou sobre as prostatites. A prostatite bacteriana aguda geralmente
afeta homens jovens, que apresentam febre, disúria, polaciúria e dor
pélvica ou perineal. A infecção é geralmente devido a bactérias
gram-negativas comuns, que são agentes patogênicos do trato urinário.
Joanna ainda comentou que a cistite, quando sintomática, exterioriza-se
clinicamente pela presença de disúria, urgência miccional, polaciúria, nictúria
e dor suprapúbica. Febre, neste caso, não é comum, diferentemente da
pielonefrite (infecção alta). Explicou ainda que a incidência de infecção
relacionado à cateterização vesical tem relação direta com a duração da
cateterização, se a sonda vesical de demora tem sistema
fechado,
Edilza perguntou o que seria o sistema fechado de
cateterismo vesical. O uso exclusivo de coletor de urina do tipo fechado para
sondagem vesical de demora com cateter de Foley de duas vias, seguindo técnica
padronizada pela comissão de infecção hospitalar; no sistema aberto,
praticamente 100% dos pacientes apresenta infecção no 3º dia de cateterização.
Ana Carolina lembrou que a infecção do
trato urinário representa uma síndrome infecciosa comum durante a gestação, em
virtude de vários fatores, como a compressão extrínseca dos ureteres e a
redução da atividade peristáltica provocada pela progesterona provocam
dilatação progressiva das pelves renais e ureteres. Essas mudanças, junto com o
aumento do débito urinário, levam à estase urinária. A estase ainda é
favorecida pela diminuição do tônus vesical, com subsequente aumento da
capacidade da bexiga e seu esvaziamento incompleto, facilitando o refluxo
vesicoureteral e pielonefrites.
Mayara passou a explanar o que estudou
sobre a síndrome infecciosa alta do trato urinário, mencionando febre, dor
lombar no ângulo costovertebral e/ou nos flancos. A infecção do trato urinário alto (pielonefrite), que habitualmente se
inicia como um quadro de cistite, é habitualmente acompanhada de febre
geralmente superior a 38C, calafrios e de dor lombar, uni ou
bilateral. Esta tríade (febre + calafrios + dor lombar) está presente na
maioria dos quadros de pielonefrite. Os sintomas gerais de um processo
infeccioso agudo podem também estar presentes, e sua intensidade é diretamente
proporcional à gravidade da pielonefrite.
Luiz mencionou que é importante determinar se a
hematúria é total, inicial ou terminal, pois isso permite presumir o local de
origem do sangramento. No primeiro, ao começar a urinar (jato inicial); no
segundo, a quase totalidade da micção (jato médio); e no terceiro, o final da
micção (jato terminal). Hematúria inicial indica origem prostática ou uretral.
Isto ocorre porque o sangue acumulado na uretra é levado pelo primeiro jato.
Hematúria terminal, dolorosa, às vezes com sangue rutilante, é encontrada na
hiperplasia prostática benigna, em consequência da ruptura das veias
telangectásicas do colo vesical ou da mucosa prostática quando o paciente faz
esforço para urinar. Hematúria total geralmente depende de lesões situadas
acima do colo da bexiga, no ureter ou no rim, pois é necessário que haja tempo
para que se misturem na bexiga o sangue e a urina.
Felipe mencionou que nos quadros de
pielonefrite aguda, à punho-percussão da região lombar, quando o paciente sente dor aguda, em pontada, diz-se
que o sinal de Giordano é positivo.
Diego referiu que a maioria das
infecções urinárias baixas é autolimitada, regredindo sem tratamento
antibiótico. A mediadora considerou que isso é verdadeiro, porém o tratamento
medicamentoso elimina rapidamente o germe causador e os sintomas. O uso da
medicação em tratamentos breves de três dias geralmente é eficaz.
Por fim, passou-se à discussão sobre as
síndromes urinárias obstrutivas. Roberta classificou-as em obstrução alta ou
baixa, unilateral ou bilateral, total ou parcial, congênita ou adquirida. Entre
as congênitas, citou a estenose de uretra e o ureter retrocava; entre as
adquiridas, a litíase e a ligadura iatrogênica de ureteres. Mencionou ainda a
classificação das obstruções em extrínseca ou intrínseca. Lembrou que a
obstrução ao fluxo urinário pode ocorrer em diversos níveis (pelve, ureter,
bexiga, uretra). Continuou afirmando que em certas situações, as vias urinárias
podem ser bloqueadas mecanicamente por cálculos, tumores ou outros processos
patológicos. Nesses casos uma elevação acentuada da pressão hidráulica da via
urinária obstruída. Essa elevação transmite-se retrogradamente aos túbulos
renais, até que todo o sistema, incluindo o espaço de Bowman, esteja à mesma
pressão. A presença de cálculos nos rins, ureteres ou bexiga, além de causar
forte dor pode infringir sérios danos teciduais, como a hidronefrose.
Joanna mencionou que os cálculos são
precipitações como agregados de vários componentes de baixa solubilidade
normais da urina. Podem ser formados pela combinação de bactérias, células
epiteliais, sais minerais em uma matriz proteica e muco. Vários tipos de
cálculos estão associados com desordens específicas, mas a maioria é composta
por oxalato de cálcio. Outros tipos de composição são fosfato de cálcio,
fosfato de amônio-magnésio (estruvita), ácido úrico, cistina.
Dened comentou que devido à composição
cálcica da maioria dos cálculos, estes são radiopacos, mas o melhor exame
complementar de imagem para o diagnóstico é a ultrassonografia.
Encerrou-se a discussão, suspendendo-se
o tópico de síndromes hipertensivas.