Rilva Lopes de Sousa Muñoz
Antes de passar à tradução livre do referido artigo, é necessário apresentar uma breve nota da tradutora, destacando que a presente versão em português compreende a interpretação do
significado do texto original da fonte, ou seja, é uma tradução que se pode chamar de "semântica". É possível que nesta translação de tradutora "amadora", a versão transposta apresente alguns problemas relacionados às
equivalências do idioma original do artigo e sua versão para o português. Afinal, a linguagem está ligada à cultura e, além disso, o artigo traduzido está inserido na área sociológica. Entre a tradução "fiel" e a "semântica" é que a primeira
é literal, enquanto a segunda é mais flexível e admite uma exceção criativa à fidelidade de 100% ao original.
A seguir, passo à tradução do artigo (título na imagem no topo da presente postagem e referência completa ao final desta).
O artigo é de autoria de pesquisadores conhecidos da linha de estudos sobre estigma e discriminação (PHELAN et al., 2008) e será referido ao longo deste texto, e no corpo do manuscrito traduzido, como Phelan
et al. (2008) ou como “os autores”.
Neste artigo, Phelan et al. (2008) tiveram o objetivo de explorar
pontos comuns e distinções entre preconceito e estigma. Os autores afirmam que
apesar dos esforços já realizados até a data da publicação deste seu artigo, no sentido de consolidar as construções (constructos*) de estigma e
preconceito na teoria e na pesquisa, ainda não tinha havido uma comparação dos modelos
conceituais para explicar o estigma e o preconceito. Este artigo apresenta,
então, uma análise de 18 modelos conceituais de preconceito e estigma. Eles codificaram
cada modelo em várias dimensões e compararam os modelos em busca de pontos em
comum e também das distinções entre eles, concluindo que os modelos de estigma
tendem a se concentrar nos alvos (target, em inglês - como eles denominaram as pessoas estigmatizadas), enquanto
modelos de preconceito tratam mais dos processos relacionados aos agressores (estigmatizadores) e às
ações discriminatórias individuais. Os autores encontraram, no entanto, muita
sobreposição entre os modelos.
Os modelos de estigma geralmente enfocam características individuais, como doenças ou desvios do denominado "normal", enquanto modelos de preconceito geralmente enfatizam características no âmbito do grupo,
como raça/cor. Assim, o estigma e o preconceito são processos sociais de
exploração/dominação (manter as pessoas em baixo), impor normas sociais (manter
as pessoas dentro – das normas) e evitar doenças (manter as pessoas afastadas).
Os autores entendem, a partir
deste artigo que, embora existam aspectos únicos para cada um, para estigma e
para preconceito, a análise atual indica que a teoria e a pesquisa sobre estes
constructos refletem um "único conceito”, ou seja, segundo os autores, empregando uma metáfora, constituem “um
único animal". Esforços para reduzir o estigma e o preconceito poderiam se
beneficiar se prestássemos atenção a quem e ao quê esses processos servem e também
às características dos estigmatizados.
Como epígrafe, o artigo apresenta
duas citações diretas dos autores pioneiros no enquadramento teórico dos
dois constructos - do estigma e do preconceito (Gordon Allport e Erving Goffman).
“O preconceito étnico é uma antipatia baseada em uma generalização defeituosa e inflexível. Pode ser sentido ou expresso. Pode ser direcionado a um grupo como um todo ou a um indivíduo porque ele é um membro desse grupo” (Gordon Allport 1954 : 9).
"Estigma é a situação do indivíduo que é desqualificado da plena aceitação social" (Erving Goffman 1963: prefácio). O indivíduo estigmatizado é "reduzido em nossas mentes de uma pessoa comum e habitual para uma pessoa contaminada e diminuída" (Goffman 1963:3).
Phelan et al. (2008) afirmam neste artigo que
os termos "preconceito" e "estigma" são definidos pelos pensadores que deram vida a cada um - Allport, publicando The Nature of Prejudice,
em 1954, e Goffman, no seu livro Stigma: Notes on the Management of Spoiled Identity, em
1963. Desde a publicação desses trabalhos, conjuntos de publicações separadas têm se desenvolvido em
torno dos dois conceitos. No entanto, há evidências de que os trabalhos realizados a partir das obras desses sociólogos pioneiros, começaram a se fundir. O aumento da atenção dos pesquisadores do preconceito
aos alvos (pessoas estigmatizadas) deste na década de 1990 trouxe maior sobreposição ainda aos trabalhos
sobre estigma e preconceito.
Os conceitos de estigma,
preconceito e discriminação são cada vez mais utilizados pelos mesmos pesquisadores da área e nos mesmos textos. Em 2006, o Instituto Nacional de Saúde Mental (principal agência federal de pesquisa sobre transtornos mentais dos EUA), reuniu
pesquisadores que estudam preconceito e estigma para tratar do problema do
estigma em relação às pessoas com doença mental. Nesta conferência, reuniram-se conceitos e pesquisas identificados sobre estigma, preconceito e discriminação. Contudo, argumentam os autores deste
artigo que está sendo traduzido, que até onde sabiam eles, ainda não haviam sido comparados modelos conceituais sobre preconceito
e estigma (ou seja, até até 2008, ano da publicação do seu ensaio teórico e de revisão analítica). Assim, eles consideraram que era necessário buscar diferenças essenciais entre os
modelos de preconceito e estigma, por meio de uma comparação entre os dois constructos, para aprimorar a compreensão dos conjuntos de modelos e revelar o espaço
conceitual mais amplo no qual ambos residem.
Então. os autores Phelan et al. (2008) perguntam como questão norteadora doseu artigo: “Estigma
e preconceito são uma consequência da aplicação de termos diferentes pelos teóricos pioneiros em diferentes campos para descrever basicamente os mesmos processos, ou existem
diferenças mais fundamentais nos processos que foram rotulados de estigma e preconceito?”
Para responder a essa pergunta, os
autores revisaram 18 modelos conceituais-chave nos domínios do estigma e do
preconceito, que resumiram na Figura 1, um mapa conceitual dos estudos revisados por eles. Alguns dos trabalhos que os autores revisaram são
teorias, enquanto outros não – outros são metodológicos e empíricos. Como o
preconceito geralmente lida com raça, e esta e o racismo são
reconhecidos como conceitos intimamente relacionados, eles incluíram modelos de
racismo na categoria de preconceito. Os autores incluíram também modelos que julgaram serem
particularmente conhecidos ou influentes ou que contribuíam de maneira única
para conceituar estigma ou preconceito. Além disso, quatro deles foram adicionados por
sugestão de revisores. Segundo Phelan et al. (2008), o conjunto de 18 modelos que elaboraram "não é exaustivo" (grifo nosso).
Eles analisaram os modelos conceituais
de três maneiras. Primeiro, codificaram cada uma das seguintes dimensões:
(1)
Quais são as principais construções do modelo?
(2) Onde o modelo focaliza atenção (por exemplo, em indivíduos estigmatizados ou em estigmatizadores); em indivíduos que
são objeto de estigma ou preconceito (doravante referidos como “alvos” ou estigmatizados); nas
interações entre estigmatizadores e alvos; e/ou em estruturas sociais? Se o foco está
nos indivíduos, em quais processos o modelo se concentra (cognitivo, emocional, comportamental)?
(3) A quais características humanas o
modelo é aplicável? e
(4) Os processos de estigma/preconceito são vistos
como normais ou patológicos? Como processos comuns entre indivíduos ou que
variam entre indivíduos?
Os autores compararam cada par
de modelos em busca de contradições ou incompatibilidades - que seriam os casos em que os
modelos fazem previsões diferentes. Depois, eles questionaram se as características
humanas eram intercambiáveis no modelo (ou seja, características diferentes daquelas
explicitamente endereçadas
poderiam estar "conectadas" ao modelo?)
Essa análise poderia
potencialmente apoiar várias conclusões diferentes: (a) Modelos de estigma e
preconceito são paralelos (isto é, descrevem os mesmos fenômenos em termos diferentes)
ou complementares (isto é, descrevem partes diferentes de um processo
abrangente) - estas conclusões levariam à consideração que são “um animal”, ou seja um só conceito; ou (b) Os modelos seriam contraditórios
(ou seja, fazem previsões conflitantes) ou desconectados (descrevem processos distintos e não relacionados), o que levaria à consideração de que há "dois
animais", isto é, dois conceitos diferentes.
Sinopses de esquemas
conceituais de preconceito e estigma agrupados em modelos de preconceito e modelos de estigma
(1) MODELOS DE PRECONCEITO
(organizados cronologicamente)
A natureza do preconceito
(Allport, 1954)
"O preconceito étnico é uma
antipatia baseada em uma generalização defeituosa e inflexível. Pode ser
sentido ou expresso. Pode ser direcionado a um grupo como um todo ou a um
indivíduo porque ele é um membro desse grupo ”(p. 9). [...]"O preconceito é, em
última análise, um problema de formação e desenvolvimento da
personalidade" (p. 41). Uma ampla gama de influências afetaria o
desenvolvimento do preconceito, incluindo fatores cognitivos, sociais
estruturais, culturais e psicodinâmicos.
Modelo realista de conflito de
grupo (Sherif, 1958)
Indivíduos reunidos com objetivos
comuns formam estruturas “em grupo” com status e papéis hierárquicos. Se dois
grupos são reunidos em condições de competição e frustração, atitudes
e ações hostis e distância social se desenvolvem entre eles.
Teoria da identidade social
(Tajfel e Turner, 1979)
Os indivíduos têm múltiplas
identidades sociais correspondentes a diferentes participações em grupos. A
importância das diferentes identidades varia de acordo com o contexto. Quando a
identidade com um grupo específico é destacada, a auto-estima ficaria associada
à participação nesse grupo e o favoritismo no grupo. O preconceito resulta da
necessidade de uma identidade social positiva com o ingresso no grupo. A identidade social é a identificação do indivíduo decorrente do seu senso de
pertencimento a um grupo social, como uma percepção e assimilação do eu,
arquitetada a partir do grupo ao qual ele pertence. Essa identificação afetaria o indivíduo em
aspectos psicológicos e comportamentais, provocando mudanças em seus pensamentos,
sentimentos e ações.
Preconceito aversivo/racismo
(Gaertner e Dovidio, 1986)
“O racismo aversivo representa um
tipo particular de ambivalência em que o conflito está entre sentimentos e
crenças associadas a um sistema de valores sinceramente igualitário e
sentimentos e crenças negativas em relação à raça/cor não são reconhecidas. O efeito negativo
que os racistas aversivos exercem sobre os negros não é hostilidade ... [mas]
desconforto, mal-estar, nojo e, às vezes, medo (Gaertner e Dovidio 1986; pp.
62-3).
Perspectiva cognitiva (Hamilton e
Trolier, 1986)
Os sistemas de processos de
informação humanos inevitavelmente resultam na categorização dos indivíduos em
grupos, o que resulta inevitavelmente em estereótipos e preconceitos dentro do
grupo sob a forma de atitudes e comportamentos.
Componentes automáticos e
controlados de estereótipos e preconceitos (Devine, 1989)
O conhecimento dos estereótipos é
distinto do seu endosso (preconceito). Os estereótipos são aprendidos no início
da vida e ativados automaticamente. Crenças pessoais preconceituosas ou sem
preconceitos são adquiridas posteriormente, estão sob controle consciente e
podem substituir as respostas baseadas em estereótipos.
Racismo como estressor (Clark et
al., 1999)
"A percepção de um estímulo
ambiental como racista resulta em respostas psicológicas e fisiológicas
exageradas ao estresse que são influenciadas por fatores constitucionais, sociodemográficos, psicológicos, comportamentais e respostas de
enfrentamento. Com o tempo, essas respostas ao estresse influenciam a saúde" (p. 806).
Racismo sistêmico (Feagin, 2000;
Feagin e McKinney, 2003)
O racismo tem sido um aspecto
central da cultura e sociedade americanas desde a fundação do país. Ela está
enraizada na dependência da riqueza da elite do novo país da escravidão e é
mantida por uma ideologia racista de superioridade branca e vantagens
sistemáticas para os brancos.
Modelo de conteúdo de
estereótipos (Fiske et al., 2002)
"As duas dimensões primárias (do
conteúdo do estereótipo) são competência e calor. [...] grupos mistos frequentes
combinam alto calor com baixa competência (paternalista) ou alta competência
com baixo calor (invejoso), e emoções distintas (pena, inveja, admiração,
desprezo) diferenciam as quatro combinações competência-calor" (p. 878)
(2) MODELOS DE ESTIGMA (organizados
cronologicamente por Phelan et al., 2008)
Estigma: notas sobre a gestão da
identidade deteriorada (Goffman, 1963)
Estigma é "a situação do
indivíduo que é desqualificado da plena aceitação social" (prefácio). O
indivíduo estigmatizado é “reduzido em nossas mentes de uma pessoa comum e
habitual para uma pessoa contaminada e inferior" (p. 3). Goffman enfatiza o
estigma como promulgado em "interações mistas" entre indivíduos
estigmatizados e não estigmatizados e também como os indivíduos estigmatizados reagem nessas interações.
Estigma social: a psicologia dos
relacionamentos marcados (com marca, estigma) (Jones et al., 1984)
“O processo estigmatizante
envolve categorizações envolventes, acompanhadas de afetos negativos,
tipicamente ligados à ambivalência ou racionalizados através de alguma versão
de uma hipótese de mundo justo” (p. 296). Jones et al. identificaram seis
dimensões de “marcas” estigmatizantes: ocultação, curso, perturbação,
qualidades estéticas, origem e perigo.
Teoria da rotulagem modificada de
transtornos mentais (Link et al., 1989)
A socialização leva a crenças
sobre como a maioria das pessoas trata pacientes mentais. Quando os indivíduos começam um tratamento psiquiátrico, essas crenças se tornam pessoalmente
relevantes. Quanto mais os pacientes acreditam que serão desvalorizados e
discriminados, mais se sentem ameaçados ao interagir com os outros. Eles podem
empregar estratégias de enfrentamento que têm consequências negativas
para redes de apoio social, empregos e auto-estima.
Modelos de ameaça de identidade
(Crocker et al., 1998; Major e O’Brien, 2005; Steele e Aronson, 1995)
Segundo a teoria da ameaça, quando um indivíduo vai realizar uma ação em que os estereótipos de seu grupo sejam evidenciados antes da ação tencionada, o seu desempenho será enfraquecido, "confirmando", assim, a estereotipia que é aplicada ao grupo alvo.
Segundo a teoria da ameaça, quando um indivíduo vai realizar uma ação em que os estereótipos de seu grupo sejam evidenciados antes da ação tencionada, o seu desempenho será enfraquecido, "confirmando", assim, a estereotipia que é aplicada ao grupo alvo.
Na discussão do artigo, o foco da análise foi o mapeamento do terreno teórico do estigma e do preconceito. Primeiro, os autores compararam os fenômenos abordados pelos modelos existentes de preconceito e estigma. Eles começaram enumerando as construções centrais de cada modelo separado, ajustando-as no mapa conceitual mostrado na figura 1, que os autores intitularam de “fatores envolvidos no estigma e no preconceito”. Como na codificação aberta do texto, os autores afirmaram que acreditavam que essa abordagem de baixo para cima permitiria identificar áreas de foco sobrepostas e não sobrepostas nos modelos analisados de estigma e preconceito.
Figura 1 - Fatores envolvidos no estigma e no preconceito (Fonte - Phelan et al., 2008)
Cada
caixa do mapa conceitual representa uma construção (de constructo) e inclui os modelos que incluem esta
construção. Os autores não indicaram relações causais específicas entre construtos; portanto, o mapa conceitual desenhado não representa causalidade. No entanto, os autores pretenderam que
a figura representasse uma progressão aproximada de efeitos causais da esquerda
para a direita. Acima da linha pontilhada há os processos referentes a autores
de estigma e preconceito. Abaixo da linha, estão os processos relativos aos alvos. Na
linha pontilhada existem processos envolvidos pelos dois grupos.
Na
coluna 1, há fontes ou funções básicas de estigma e preconceito e de respostas
a estes processos. Acima da linha, estão as diferenças de poder, que Link
e Phelan (2001) consideram necessárias para um grupo efetivamente estigmatizar o
outro; desejo de poder e ganho econômico (por exemplo, os motivos de lucro
subjacentes à escravidão dos EUA); o desejo dos grupos sociais por ordem e
conformidade, implicado pela identificação das normas referidas por Goffman como a causa do
estigma; e pressões evolutivas, que Kurzban e Leary (2001) citam como fonte de
toda estigmatização.
Abaixo
da linha, estão os principais objetivos sociais (Fiske, 2004 ) que o estigma e
o preconceito ameaçam e influenciam as estratégias de enfrentamento por parte
dos estigmatizados (Swim e Thomas, 2006) Valores culturais amplos ou locais
influenciam quais características têm mais probabilidade de serem alvo de
estigma e preconceito e quais valores sociais são mais ameaçados por estigmatizados
(Yang et al. 2007).
Na
coluna 2, há concorrência intergrupos, que vemos como resultado de desejos
econômicos e de poder; estereótipo e rótulos, enfatizados como a base cognitiva
do preconceito e estigma na maioria dos nossos modelos; e normas (Goffman,
1963).
Na
coluna 3, há uma gama de processos cognitivos e emocionais gerados pelas forças
nas colunas 1 e 2. Esses processos são mais frequentemente incluídos quando se
referem os estigmatizadores, mas alguns modelos também atendem a esses
processos nos estigmatizados.
Na
coluna 4, há três maneiras pelas quais os processos nas colunas anteriores são
traduzidos em comportamento e outros resultados concretos que afetam os
objetivos. A discriminação estrutural refere-se a práticas estruturadas que
podem operar independentemente de atitudes preconceituosas, por exemplo,
ambientes construídos que impedem o funcionamento de pessoas com deficiência
física. O comportamento discriminatório pode ocorrer fora das interações, por
exemplo, quando um empregador descarta um pedido de emprego divulgando um histórico
de hospitalização psiquiátrica de um candidato. Finalmente, as forças nas
colunas anteriores, trabalhando tanto com os autores quanto com os alvos,
moldam os processos que se desdobram em "interações mistas" (Goffman,
1963 ) entre estigmatizadores e estigmatizados.
Na
coluna 5, estão as respostas dos alvos à discriminação e interações
problemáticas com os estigmatizadores, incluindo percepções de estigma ou
preconceito, estresse e enfrentamento. Estes, por sua vez, afetam os desfechos
da vida dos estigmatizados, como status, auto-estima, trabalho, moradia,
desempenho acadêmico e saúde, conforme descrito na Coluna 6. A Coluna 6 também
inclui esses resultados referentes aos estigmatizadores, porque conforme
sugerido pelos modelos que enfatizam conflitos e dominação (Feagin 2000 ;
Parker e Aggleton 2003), quando os estigmatizados perdem em termos de
resultados como trabalho, moradia e renda, os estigmatizadores ganham.
Este
mapa conceitual construído pelos autores do artigo revela uma variação
considerável entre os modelos em termos dos processos em que eles se
concentram. Os modelos de estigma enfatizam um pouco mais os estigmatizados,
particularmente em termos de estereótipos / expectativas, identidade e emoções
(Coluna 3). Os modelos de preconceito prestam mais atenção a esses processos
nos estigmatizadores, bem como ao comportamento discriminatório individual fora
das interações. Essas diferenças refletem os focos contrastantes nos dois
trabalhos seminais sobre preconceito e estigma: Allport (1954) claramente se
concentrou no agressor, enquanto Goffman (1963) se concentrou mais na vítima.
Contudo, a figura 1 não revela uma linha de falha clara entre os modelos de
estigma e preconceito e, de fato, mostra considerável sobreposição de foco.
Finalmente,
o conceito de preconceito refere-se especificamente às atitudes dos
perpetradores e, portanto, pode parecer mais restrito em escopo do que o
conceito de estigma. Contudo, este MC mostra que, quando se consideram modelos
explicativos de preconceito que incluem não apenas o construto em si, mas
também suas causas e conseqüências, o escopo dos modelos de preconceito e
estigma é semelhante.
Previsões
contraditórias
Em
seguida, comparamos pares de modelos em busca de previsões contraditórias. Phelan
et al. (2008) identificaram dois pontos de discórdia. O primeiro diz respeito
ao impacto do estigma ou preconceito no bem-estar psicológico dos estigmatizados.
Com base na natureza situacional do estigma e na importância do enfrentamento,
os modelos de ameaça de identidade de Crocker et al. (1998) e de Major e
O'Brien (2005) argumentam que alvos de estigma e preconceito não são
necessariamente tão psicologicamente prejudicados quanto a maioria dos modelos
sugere. O modelo evolutivo não nega que os processos sociais possam desempenhar
um papel, mas argumenta que os processos evolutivos realmente explicam a maior
parte da estigmatização. Modelos sociais e psicológicos de preconceito e
estigma geralmente não mencionam fatores evolutivos. Nenhuma dessas
discordâncias representa um cisma entre modelos de preconceito e estigma. Os
modelos de ameaça à identidade e de evolução se identificam com o estigma, e os
modelos dos quais diferem incluem os modelos de estigma e preconceito. No
geral, a revisão dos modelos separados levou os autores do artigo (PHELAN et al., 2008) a concluir que as
diferenças de foco indicam complementaridade e não contradição.
Normalidade/processos comuns versus psicopatologia/variação individual
Em
seguida, os autores consideraram se os modelos veem o estigma ou o preconceito
como sendo enraizados em processos normais que funcionam de maneira semelhante
entre os indivíduos, ou se eles se concentram nas diferenças individuais ou na
psicopatologia.
Em geral, os modelos de estigma enfatizam que o estigma está enraizado em processos normais comuns entre os indivíduos. Goffman expressa isso de maneira mais eloquente: “a gestão do estigma é uma característica geral da sociedade [...] os estigmatizados e os normais têm a mesma composição mental, e essa é necessariamente a norma em nossa sociedade; quem pode desempenhar um desses papéis [...] possui exatamente o equipamento necessário para desempenhar o outro” (referindo-se a Goffman 1963: 130-31).
Em geral, os modelos de estigma enfatizam que o estigma está enraizado em processos normais comuns entre os indivíduos. Goffman expressa isso de maneira mais eloquente: “a gestão do estigma é uma característica geral da sociedade [...] os estigmatizados e os normais têm a mesma composição mental, e essa é necessariamente a norma em nossa sociedade; quem pode desempenhar um desses papéis [...] possui exatamente o equipamento necessário para desempenhar o outro” (referindo-se a Goffman 1963: 130-31).
A
maioria dos modelos de preconceito também enfatiza processos normais comuns
entre indivíduos. Tajfel atribuiu a discriminação fora do grupo a "uma
norma genérica de comportamento" que é "extraordinariamente
fácil de desencadear" (Tajfel,1970: 102). Feagin (2000) enfatiza que o
racismo está enraizado no sistema e não nos indivíduos. Embora Allport considere o preconceito como um processo normal (o capítulo 2 de seu livro é intitulado “a
normalidade do preconceito”), ele se destaca entre os modelos.
Phelan et al. (2008) analisaram também a ênfase colocada na variação individual e na psicopatologia (isto é, personalidades preconceituosas versus personalidades tolerantes). Eles afirmam que não encontraram nada nos modelos que enfatizasse processos comuns que pudessem negar o papel de variações individuais. Por exemplo, ao enfatizar as raízes do preconceito em processos comuns, Sherif (1958) observa que "há boas razões para acreditar que algumas pessoas que crescem em circunstâncias infelizes da vida podem se tornar mais intensas em seus preconceitos e hostilidades" (Sherif, 1958: 350). Da mesma forma, Allport (1954) não nega o papel dos processos mais universais. Portanto, os autores do artigo que está sendo traduzido dizem que não viam isso como uma linha divisória entre os conceitos de estigma e preconceito.
Phelan et al. (2008) analisaram também a ênfase colocada na variação individual e na psicopatologia (isto é, personalidades preconceituosas versus personalidades tolerantes). Eles afirmam que não encontraram nada nos modelos que enfatizasse processos comuns que pudessem negar o papel de variações individuais. Por exemplo, ao enfatizar as raízes do preconceito em processos comuns, Sherif (1958) observa que "há boas razões para acreditar que algumas pessoas que crescem em circunstâncias infelizes da vida podem se tornar mais intensas em seus preconceitos e hostilidades" (Sherif, 1958: 350). Da mesma forma, Allport (1954) não nega o papel dos processos mais universais. Portanto, os autores do artigo que está sendo traduzido dizem que não viam isso como uma linha divisória entre os conceitos de estigma e preconceito.
Intercambiabilidade
de características que são objeto de estigma e preconceito
A análise de Phelan et al. (2008) sobre intercambialidade das características sugere variações nos modelos conceituais que não se alinham à distinção estigma/preconceito. No entanto, eles encontraram uma distinção que consideraram significativa e questionaram: “um determinado modelo poderia ser aplicado a características diferentes daquelas abordadas explicitamente pelo próprio modelo?” Em outras palavras, as características que são objeto de estigma ou preconceito são equivalentes?
A análise de Phelan et al. (2008) sobre intercambialidade das características sugere variações nos modelos conceituais que não se alinham à distinção estigma/preconceito. No entanto, eles encontraram uma distinção que consideraram significativa e questionaram: “um determinado modelo poderia ser aplicado a características diferentes daquelas abordadas explicitamente pelo próprio modelo?” Em outras palavras, as características que são objeto de estigma ou preconceito são equivalentes?
Todos,
exceto um dos modelos de estigma, segundo os autores do artigo, são abrangentes em termos das características
que abordam, com e exceção da teoria da rotulagem modificada de Link et al.,
que se aplica especificamente a doenças mentais; no entanto, o modelo deve ser
aplicável a qualquer característica estigmatizada sobre a qual atitudes
culturais são aprendidas antes da aquisição do rótulo estigmatizado. Por
exemplo, os estigmas tribais de Goffman, marcas de caráter individual e
abominações do corpo, parecem cobrir todas as formas imagináveis de
estigma ou preconceito. Da mesma forma, vários
dos modelos de preconceito não
estão vinculados a determinados grupos internos e
externos, e a teoria da identidade social é
baseada em pesquisas que mostram que características
arbitrariamente identificadas podem servir como base de discriminação (Tajfel,
1970). No entanto, outros modelos de preconceito são mais restritivos, como o
de Allport, que antecedeu o de Goffman, e se concentra na nacionalidade, raça/etnia
e religião. Para alguns desses modelos mais restritos, segundo Phelan et al.
(2008), é fácil imaginar a substituição de outras características humanas por
raça. Eles exemplificam com a análise de Clark et al. (1999), das consequências
estressantes da discriminação, que devem ser aplicadas a qualquer
característica que seja alvo de estigma ou preconceito. No entanto, em outros
casos, essa substituição não faz sentido. Isso é mais claro para Allport (1954)
e para Feagin (2000) no modelo de racismo sistêmico.
Embora
grande parte da análise de Allport possa se aplicar a características como
doença mental ou desvio sexual, uma afirmação chave é a seguinte: “Em todas as
sociedades do mundo, a criança é vista como membro dos grupos de seus pais. Ela
pertence à mesma raça/cor, tradição familiar, religião, casta e status
ocupacional” (Allport 1954: 31). O mesmo não pode ser dito para a maioria das
doenças e deficiências ou “desvios” da norma, como sexualidade não normativa,
que podem ser alvo de estigma ou preconceito. Elas podem ser mais comuns em algumas
famílias do que em outras, mas não são compartilhadas pelas famílias da mesma
forma que raça/cor, religião e casta. Por isso, Phelan et al. (2008) acreditam que
essa distinção entre o que chamaram de características do "grupo"
(compartilhadas por membros da família) e características do
"indivíduo" (aquelas que ocorrem mais esporadicamente nas famílias) é
uma significativa descoberta feita na sua análise de modelos
de preconceito e estigma.
Essa
distinção é reforçada por uma avaliação das características humanas que foram analisadas
em termos de “estigma” e “preconceito” na literatura publicada. Phelan et al.
(2008) pesquisaram os títulos dos artigos de periódicos indexados no Psycinfo a
cada cinco anos, de 1955 (o ano após a publicação do pioneiro “The Nature of
Prejudice”, de Allport) até 2005, e analisaram os artigos para identificar as
características humanas que eles avaliaram. Esses anos foram escolhidos como
uma amostra dos 52 anos entre a publicação de “The Nature of Prejudice” e a
data da publicação do artigo que está sendo traduzido e sintetizado aqui. Eles localizaram
162 artigos com “estigma” no título e 139 com “preconceito”. O número de
artigos relevantes aumentou constantemente ao longo do tempo; consequentemente,
46% dos artigos foram publicados em 2005 e 75% dos artigos foram publicados em
1995 ou posteriormente. Os resultados são mostrados na tabela 1.
Na
maioria dos casos (62%), o “preconceito” estava relacionado à raça,
seguido por 11% para artigos que tratavam do preconceito como um fenômeno
geral. Nesses casos, raça ou etnia seria implicitamente considerada uma característica
central dos estudos. Por outro lado, uma proporção esmagadora de artigos com
“estigma” no título - 92% - enfocava doenças, deficiências ou desvios
comportamentais ou de identidade. Phelan et al. (2008) usaram o termo “desvio” não
como um termo pejorativo, mas no sentido sociológico clássico de desvio das
normas de um grupo social específico. Eles incluíram comportamento e identidade
desviantes. Por exemplo, o desvio sexual pode ser definido em termos de
comportamento ou identidade; ambos são objetos de estigma e preconceito. Apenas
6% dos artigos de estigma tratavam de raça, etnia ou gênero.
Por
que algumas características se tornam alvo de estigma e preconceito e outras
não?
Essa
distinção entre os tipos de características estudadas em nome de preconceito
versus estigma levou Phelan et al. (2008) a outra pergunta: Por que
características particulares se tornam objeto de estigma e preconceito, se
existem diferentes razões para diferentes características? Muitos dos modelos
que eles examinaram enfatizam que o que estigma e preconceito são socialmente
construídos e variam ao longo do tempo e do local. Para os autores, este é um
aspecto importante do estigma e do preconceito. Ao mesmo tempo, a escolha de
características humanas específicas como alvos de estigma e preconceito não seria
um processo aleatório. Assim, eles acreditam que as razões pelas quais
determinadas características são selecionadas podem representar uma variação
importante que foi revelada pela comparação que fizeram no mapeamento de modelos
de estigma e preconceito.
Phelan
et al. (2008) discutiram anteriormente a associação de preconceito com “grupo”
e estigma com características “individuais”. Porém, depois eles fazem uma
distinção adicional entre o que consideraram os dois principais tipos de
características abordados na literatura sobre estigma: doença / incapacidade / identidade desviante.
Com base nessas distinções, os autores desenvolveram uma tipologia de funções
de estigma e preconceito. No entanto, eles não sugerem que um estigma e
preconceito sejam distinguidos por causa da "função", pois usaram o termo para indicar as fontes, razões ou
motivos de estigma e preconceito.
Em
seguida, os autores propõem que haja três funções de estigma e preconceito: (1)
exploração/dominação, (2) aplicação de normas sociais e (3) prevenção de
doenças. Eles também se referiram a estas categorias como formas de manter as
pessoas em posição de inferioridade, mantendo as pessoas dentro das normas e manter as pessoas afastadas.
Exploração
e dominação
Alguns
grupos devem ter menos poder e menos recursos para os grupos dominantes terem
mais. Alguns grupos fornecem trabalho que é explorado por outros ou executam
tarefas desagradáveis ou perigosas que outros preferem evitar. As
ideologias se desenvolvem para legitimar e ajudar a perpetuar essas
desigualdades e, neste ponto, os autores se referem a Marx e Engels. Phelan et
al. (2008) argumentam que a exploração e a dominação, juntamente com suas ideologias
correspondentes, são uma função básica do estigma e do preconceito. Eles destacam
que raça é um exemplo claro. Eles recorrem a Feagin, que descreve como o
racismo foi "essencial para a fundação dos Estados Unidos" Feagin,
2000: 2). Continuam citando este último autor: “No coração da Constituição estava
a proteção da propriedade e da riqueza da burguesia abastada na nova nação” (Feagin,
2000: 10). A escravidão era vista como uma ferramenta essencial para manter a
riqueza e a discriminação e, portanto, era considerada necessária. Ideologias
que viam os afro-americanos como inferiores, menos dignos e perigosos (ou seja,
vistos por meio de estereótipos) foram desenvolvidas para legitimar a
discriminação.
Por
esse raciocínio, Phelan et al. (2008) também consideraram o estigma e o
preconceito contra mulheres, pessoas de baixo nível socioeconômico e grupos
minoritários étnicos como arraigados na exploração e no domínio por meio da aplicação
de normas sociais . As sociedades também acham necessário manter a conformidade
com as normas sociais. Nesse sentido, Phelan et al. (2008) propões, então, que
o não cumprimento dessas normas, geralmente expressas em termos de moralidade
ou caráter (e citam Goffman, 1963), é um segundo fundamento para estigmatização
e preconceito. Aqui, a função do estigma e do preconceito pode ser fazer com
que os “desviantes da norma” se conformassem e se juntassem ao grupo, como na
vergonha reintegrativa, citando Braithwaite (1989), ou pode ser para esclarecer
para outros membros do grupo os limites do comportamento e identidade
aceitáveis, assim como as conseqüências
para a não conformidade (citando Erikson, 1966). Em
ambos os casos, o objetivo seria aumentar a conformidade com as normas. Esse
tipo de estigma e preconceito deveria se aplicar apenas ao comportamento ou
identidade percebida como voluntária. Por exemplo, embora as pessoas com
retardo mental possam se comportar de formas divergentes, Phelan et al. (2008)
não incluíram retardo mental no seu estudo, porque não se pode esperar que a
aplicação de estigma e preconceito mude o comportamento. Exemplos dessa forma
de estigma e preconceito são numerosos, como eles citam: comportamentos ou
identidades sexuais não normativas, como homossexualidade, poligamia ou (em
alguns contextos) sexo extraconjugal; desvios políticos; várias formas de
comportamento criminoso, como roubo, estupro ou assassinato; abuso de
substâncias; tabagismo; talvez obesidade e algumas doenças mentais, como
depressão.
Embora
haja discordância sobre se as orientações e identidades sexuais são
voluntárias, Phelan et al. (2008) afirmaram que acreditam que o estigma ou
preconceito contra pessoas com orientações e identidades sexuais não normativas
se baseia na percepção pública de que são voluntárias e, portanto, as incluímos
sob estigma e normas baseadas em normas. preconceito. Essa função de estigma e
preconceito está alinhada com a exploração/dominação, na medida em que o grupo
dominante é influente na definição do inaceitável. No entanto, difere de
maneira importante porque o grupo dominante não lucra de maneira significativa
com o trabalho dos desviantes. acreditamos que o estigma ou preconceito contra
pessoas com orientações e identidades sexuais não normativas se baseia na
percepção pública de que são voluntárias e, portanto, as incluímos sob estigma
e preconceito baseados em normas. Essa função de estigma e preconceito estaria,
segundo eles, alinhada com a exploração/dominação, na medida em que o grupo
dominante é influente na definição do que deve ser considerado inaceitável. No
entanto, a diferença está no fato de que o grupo dominante não lucra de maneira
significativa com o trabalho dos desviantes. Por isso, os referidos autores acreditam
que o estigma ou preconceito contra pessoas com orientações e identidades
sexuais não normativas se baseia na percepção pública de que são voluntárias e,
portanto, Phelan et al. (2008) as incluíram sob estigma e preconceito baseados
em normas.
Prevenção de doenças
Para
Phelan et al. (2008), um grande conjunto de características ainda precisa ser
explicado em termos de função de estigma e preconceito. Na revisão de artigos
de periódicos (tabela 1), eles agruparam esses itens como doença e incapacidade
e constituíram o maior conjunto de artigos com a palavra “estigma” no título. Entre
estas estão incluídas doenças mentais, incluindo retardo mental, doenças
físicas como câncer, doenças de pele e AIDS, deficiências físicas e
imperfeições, como falta de membros, paralisia, cegueira e surdez. Novamente, o
grupo dominante não lucra com o trabalho de pessoas com essas características; na
verdade, elas têm problemas para conseguir emprego. Phelan et al. (2008) afirmaram
que os do grupo dominante não estavam tentando controlar seu comportamento ou
dar o exemplo para os outros, submetendo-os ao estigma e preconceito. Os
autores consideraram difícil explicar essa forma de estigma e preconceito em
termos puramente sociais ou psicológicos, e se voltaram para a psicologia
evolucionária, citando Kurzban e Leary (2001) e Neuberg et al. (2000), que
argumentam que existem pressões evolutivas para evitar que membros de uma
espécie sejam “infectados por parasitas” (grifo nosso). Parasitas podem levar a
"desvios do fenótipo normal (saudável) do organismo"como assimetria,
marcas, lesões e descoloração, além de anomalias comportamentais devido a danos nos
sistemas de controle muscular. Eles argumentam que a vantagem de evitar a
doença "pode ter levado à
evolução de sistemas que consideram os desvios do
fenótipo típico
da espécie local... sem atrativos" (reticências
e aspas são dos autores); e que sistemas podem se desenvolver em que as pessoas
“desejam evitar... proximidade de indivíduos potencialmente parasitados”.
Quanto
à estética, um estudo de Jones et al. (1984) destaca seis dimensões de “marcas”
estigmatizadas. Uma explicação evolutiva para evitar doenças seria compatível com
a preferência estética dos seres humanos pela simetria facial (citam Grammar; Thornhill, 1994), que se desenvolve cedo na vida e entre culturas e de que as
anomalias físicas parecem “induzir automaticamente respostas afetivas
'primitivas' no espectador, não mediadas por rótulos ou atribuições causais” (citação
de Jones et al. 1984: 226). Eles salientam também que, consistente com Kurzban e Leary's (2001), o
argumento de que a repulsa deve ser a principal emoção associada ao estigma inclui reações afetivas ao desvio físico, incluindo repugnante, nauseante,
ofensivo, doentio, repulsivo, revoltante (citam novamente Jones et al. 1984).
A
explicação evolutiva aplica-se mais claramente a doenças visíveis, deformidades
e desvios nos movimentos físicos. Se o "fenótipo atípico da espécie"
pode ser estendido a doenças que não são necessariamente visíveis, como o
câncer, e ao funcionamento psicológico que parece "doente", como a
psicose, o modelo evolutivo pode se aplicar amplamente à categoria "doença
e incapacidade". No entanto, essa ampla aplicação depende criticamente da
força do viés em relação a falsos positivos, o que é um fator desconhecido.
Como faltam evidências para conectar muitas doenças estigmatizadas à prevenção
de parasitas, a explicação evolutiva deve ser considerada provisória.
De
acordo com esse argumento, a função do estigma e do preconceito para evitar
doenças está enraizada no passado evolutivo, e não nas atuais pressões sociais.
As pessoas podem de fato evitar conscientemente outras porque parecem estar
infectadas. No entanto, as fortes reações emocionais envolvidas nesse tipo de
estigma e preconceito, bem como sua aplicação a indivíduos que não são
realmente infectados (“falsos positivos”), são atribuídas à sobrevivência e
procriação desproporcionais de indivíduos que exibiram extrema vigilância,
resultando em em reações exageradas em atualmente observadas. Assim, Phelan et
al. (2008) salientam que quando eles se referem
à função de evitar estigma ou preconceito, estão se referindo à sua função
passada, não atual.
Os autores destacam que Stangor
e Crandall (2000) argumentaram que toda estigmatização está enraizada na ameaça
percebida ao indivíduo ou à cultura, incluindo conflitos intergrupos, ameaças à
saúde, características físicas que denotam ameaça, crença em um mundo justo e
ameaças morais. Cada um de nossos três tipos de estigma e preconceito pode ser
interpretado como ameaça (dominação/exploração defende contra a ameaça de
perda de poder e vantagem econômica; a imposição de normas defende contra a
ameaça de desordem social e danos aos membros do grupo; e a prevenção de
doenças defende contra ameaça de infecção). No entanto, particularmente para a
exploração / domínio, os modelos que enfatizam o papel de diferenças de
potência e de estado em estigma e preconceito (citam Feagin 2000; Fiske et al 2002;
Link e Phelan 2001; Parker e Aggleton 2003) fornecem uma representação mais
precisa. Consequentemente, a função do estigma e do preconceito, baseada
na exploração e na dominação, é o desejo de manter vantagem. Omitindo o conceito de
exploração/dominação e subordinando-o ao conceito de ameaça, os autores acreditam, retira-se do esquema funcional o que o marca como estigma e preconceito baseados
em grupo, como o racismo.
Os autores consideraram que o esquema funcional de Kurzban e Leary (2001) se sobrepõe fortemente ao deles e corresponde considerando-se funções de aplicação de normas, exploração dominação e prevenção de doenças. Ambos os esquemas também
correspondem intimamente aos de Goffman (1963), com três tipos de estigma - estigmas
tribais, manchas de caráter individual e abominações do corpo. Goffman, no
entanto, não os analisou em termos de suas funções. Na medida em que os comportamentos adaptativos no passado
são atualmente adaptativos, o estigma e o preconceito podem ser co-determinados
por vestígios biológicos de pressões de adaptação passadas e pelas atuais
pressões sociais e psicológicas. Por exemplo, os grupos
sociais se beneficiam agora, como no passado distante, de dominar e explorar
outros grupos. Da mesma forma, o controle de pelo menos alguns tipos de
comportamento desviante serve ao bem-estar do grupo agora como no passado.
Nesses casos, quaisquer que sejam as funções evolutivas que tenham sido
cumpridas, elas são fortemente reforçadas pelas atuais funções sociais.
Acreditamos que essas funções sociais são um foco mais produtivo para a
compreensão e, principalmente, a redução do estigma e do preconceito.
Por outro
lado, como discutido acima, achamos difícil explicar o estigma e o preconceito
para evitar doenças em termos de funções atuais. Embora seja funcional evitar
alguém com uma doença infecciosa grave, é difícil discernir a função de evitar
alguém com uma doença não infecciosa ou imperfeição física. É o ilógico dessa
evitação, bem como as reações emocionais fortes e aparentemente automáticas a
esses indivíduos que nos levam a recorrer a processos evolutivos. Atualmente, é
impossível determinar em que medida o estigma e o preconceito podem ser
atribuídos às pressões evolutivas e em que extensão podem ser devidos às atuais
pressões sociais / psicológicas: Todo ou nenhum desses tipos de estigma pode
ter raízes evolutivas. De maneira mais geral, os dados não estão disponíveis
para determinar quais das três explicações funcionais que comparamos - Todo ou
nenhum desses tipos de estigma pode ter raízes evolutivas. De maneira mais
geral, os dados não estão disponíveis para determinar quais das três
explicações funcionais que comparamos - Todo ou nenhum desses tipos de estigma
pode ter raízes evolutivas.
Distinções
e pontos comuns nos processos de estigma / preconceito nas três funções
Nossa
tipologia funcional levanta a questão de saber se o processo de estigma /
preconceito varia dependendo da função. Por exemplo, o raciocínio por trás do
estigma e do preconceito baseado na exploração / dominação sugere que a
competição intergrupos, estereótipos depreciativos e discriminação na alocação
de recursos podem ser particularmente proeminentes e
emoções de piedade ou medo e ódio também podem ser importantes.
Entretanto,
sugerimos que os processos sociais envolvidos na promulgação e manutenção do
estigma e do preconceito são mais parecidos do que diferentes quando uma
característica humana é selecionada como base para o estigma e o preconceito.
Todos envolvem categorização, rotulagem, estereotipagem, emoções negativas,
desconforto interacional, rejeição social e outras formas de discriminação,
perda de status e outros efeitos nocivos nas chances de vida dos alvos, bem
como gerenciamento e enfrentamento do estigma. As experiências de diferentes
grupos-alvo podem tornar-se "homogeneizadas" por uma confluência
dessas pressões. Os autores citam Morone (1997), que descreve como os grupos raciais, étnicos e
imigrantes se tornam estereotipados como ameaças morais e de saúde à maioria.
Aqui, o estigma e o preconceito enraizados na exploração/dominação põem em
serviço as outras duas bases do estigma e do preconceito: imposição de normas e
prevenção de doenças. Da mesma forma, embora a exploração possa não ter sido a
função original do estigma e preconceito contra pessoas com depressão ou AIDS,
essas pessoas são mais vulneráveis à exploração como resultado do status social degradado
que atende a todas as formas de estigma e preconceito. Finalmente, o estigma e
o preconceito contra algumas características cumprem mais de uma função. Por
exemplo, o estigma e o preconceito associados ao HIV/AIDS provavelmente se
baseiam no cumprimento das normas e na prevenção de doenças.
Uma
área em que as distinções baseadas na função podem ser particularmente
importantes é a questão de como prevenir ou reduzir o estigma e o preconceito.
Alguns aspectos do estigma e do preconceito podem ser reduzidos sem atenção à
função. As leis anti-discriminação diminuíram a discriminação e não dependem de
uma consideração da função. Argumentamos, no entanto, que a redução do estigma
e do preconceito será aprimorada pela atenção à função. O preconceito sutil,
mas significativo, contra os negros persiste, apesar das mudanças reais
realizadas pela lei (Gaertner; Dovidio 1986) A exploração contínua de
afro-americanos pode ajudar a explicar por que o preconceito racial tem sido
tão difícil de erradicar: A exploração continuada requer justificação contínua.
As legitimações modernas são mais sutis, mas permanecem poderosas. O estigma e
o preconceito baseados na exploração / dominação não podem ser completamente
eliminados sem mudanças na hierarquia de poder (Parker e Aggleton 200 ). Da
mesma forma, pode ser difícil erradicar o estigma e o preconceito baseados na
imposição de normas sem mudanças nas normas sociais.
Uma
base evolutiva para estigma e preconceito baseada na prevenção de doenças pode
parecer argumentar contra qualquer possibilidade de redução do estigma ou
preconceito. Mas isso não é necessariamente verdade. Os papéis sexuais também
podem ter alguma base evolutiva, mas podem ser alterados. O estigma e o
preconceito baseados em doenças podem operar amplamente através de reações
emocionais automáticas, e a familiaridade pode reduzir essas reações, assim
como a dessensibilização por exposição pode reduzir fobias baseadas na
evolução. Consequentemente, a pesquisa sugere que o contato pessoal é uma das
abordagens mais promissoras para reduzir o estigma e o preconceito associados à
doença mental (Kolodziej; Johnson 1996) Se nosso esquema particular das
funções de estigma e preconceito é ou não útil, acreditamos que os esforços
para reduzir o estigma e o preconceito serão aprimorados, considerando-se por
que a característica é alvo de estigma e preconceito.
Conclusões: Um animal ou dois?
A
conclusão de Phelan et al.
(2008) foi de que sua análise sugere algumas diferenças de ênfase e foco, mas
concluímos que modelos de preconceito e estigma descrevem um único animal. No
entanto, distinções nas funções de estigma e preconceito nos levaram a delinear
três subtipos deste animal. Os autores acreditam que pode ser feita uma
distinção útil entre estigma e preconceito, com base na exploração e dominação
(manter as pessoas em baixo), aplicação de normas (manter as pessoas dentro das
normas) e prevenção de doenças (manter as pessoas afastadas). Essa tipologia
distinguiria, segundo eles o trabalho nas tradições de estigma e preconceito.
Embora essas distinções estejam diminuindo, o trabalho na tradição do
preconceito cresceu a partir de preocupações com processos sociais
impulsionados pela exploração e dominação, como o racismo, enquanto o trabalho
na tradição do estigma tem se preocupado mais com processos conduzidos pela
imposição de normas e prevenção de doenças. A análise de Phelan et al. (2008) sugere,
no entanto, que esses processos são bastante semelhantes e fazem parte do mesmo
animal.
Phelan
et al. (2008) perguntam, então, “Como devemos chamar esse animal?” e
prosseguem: “ao longo deste artigo, emparelhamos de forma agnóstica os termos
“estigma” e “preconceito” ao investigarmos a relação entre os conjuntos
correspondentes de modelos conceituais.” No futuro, eles dizem que seguirão Dovidio
et al. (2000) [Dovídio também é coautor do estudo que está sendo traduzido) e
outros no uso do termo “estigma” ao se referir a um processo mais amplo,
incluindo muitos componentes mostrados na figura 1, e “preconceito” para se
referir aos componentes atitudinais desse processo.
Por
fim, Phelan et al. (2008) afirmam que sua comparação de modelos conceituais de
estigma e preconceito se mostrou proveitosa de várias maneiras. Primeiro, a
forte simpatia e o alto grau de sobreposição que encontraram entre os modelos
de estigma e preconceito devem incentivar os estudiosos a atravessar as linhas
de estigma/preconceito ao procurar teoria, métodos e descobertas empíricas para
orientar seus novos empreendimentos. Além disso, eles consideram que o mapa
conceitual que geraram (figura 1) pode ajudar pesquisadores a identificar novas
construções relevantes para seus pensamentos e pesquisas atuais. Finalmente, Phelan
et al. (2008) dizem que esperam que a distinção entre estigma e preconceito
baseada na exploração/ dominação e aplicação de normas e prevenção de doenças
seja útil para entender o estigma e o preconceito de maneira mais completa e
reduzir os dois animais a apenas um.
* Constructo, segundo Martins e Pelissaro (2005: 83):
"Constructos podem ser entendidos como operacionalizações de abstrações que os cientistas sociais consideram nas suas teorias, tais como: status social; custo social; inteligência; risco, etc. [...] Um constructo é uma variável – conjunto de termos, de conceitos e de variáveis –, isto é, uma definição operacional robusta que busca representar empiricamente um conceito dentro de um quadro teórico específico."
Referência do artigo traduzido: Phelan
JC, Link BG, Dovidio JF. Stigma and prejudice: one animal or two? Soc Sci Med.
2008;67(3):358-367.
Outras referências empregadas para esclarecer terminologias:
Martins GA, Pelissaro J. Sobre Conceitos, Definições e Constructos nas Ciências Contábeis. Base 2005; 2(2):78-84
Outras referências empregadas para esclarecer terminologias:
Martins GA, Pelissaro J. Sobre Conceitos, Definições e Constructos nas Ciências Contábeis. Base 2005; 2(2):78-84