O paciente ficou extremamente agressivo
durante uma desavença com sua parceira. A raiva foi desproporcional ao teor do evento e
ele começou a gritar, jogar objetos a esmo e quebrou seu celular. A seguir, usou
uma lâmina de barbear para fazer vários cortes superficiais bilaterais na parte
interna dos seus antebraços. Nesse momento, os pais adotivos dele, preocupados,
ligaram para a unidade de crise de saúde do serviço comunitário de
funcionamento 24 horas, Centro de Atenção Psicossocial (CAPS-III).
Durante a avaliação para a
internação, o paciente referiu já ter se machucado várias vezes antes,
inclusive se esmurrando e queimando várias partes do corpo com um isqueiro em
ocasião anterior. Quando questionado sobre o que o deixou perturbado a ponto de
querer fazer essas coisas, o paciente afirmou: "Todo mundo me odeia, e sempre
me abandonam!" A seguir hostilizou o avaliador, dizendo: "O outro
orientador de internação era muito melhor do que você. Pessoas como você me
deixam assim!" Uma breve revisão dos registros do hospital revelou que o
paciente teve vários episódios semelhantes nos últimos anos.
Na avaliação de acompanhamento, o paciente revelou que os conflitos são
comuns nas suas relações interpessoais. Ele disse: "Nem sei mais quem eu
sou. Todas as pessoas estão apenas me usando". O paciente informou que
costuma ser irrefletido em seu comportamento, explicando: "Às vezes eu
saio e fico com gente que conheci em algum aplicativo só para sentir alguma
coisa. Eu sempre me sinto vazio depois."
O paciente reconhece que ocasionalmente não come quando “não está em um
dia bom”. Seu humor é significativamente instável. Ele explica: "Alguns
dias, parece que tudo é incrível, mas em poucas horas ou em um dia eu acordo e
percebo que nada presta." Quando indagado há quanto tempo isso acontece,
ele responde: "Eu sempre fui assim."
O paciente tem dificuldade ocasional de conciliar o sono; no entanto,
afirma que sempre sente necessidade e vontade de dormir, mas às vezes
simplesmente não consegue. Quando perguntado se já teve ideação suicida antes,
ele conta: “Uma vez, tomei 10 comprimidos de ibuprofeno para mostrar aos meus
pais como eles são horríveis”. O paciente nega ter planos ou intenção atuais de
se matar, mas afirma: "Às vezes fico cansado e simplesmente não quero
sentir mais nada. É sempre quente ou frio, nunca nada é morno." Quando
indagado sobre seus pais e sua parceira, ele diz: "Eu não os machucaria de
verdade, mas espero que se sintam mal quando eu me corto."
Exame físico: Altura 1,73 m e peso 72,57 kg. Pressão arterial de 138/94
mmHg; temperatura de 36,8 °C; e saturação de oxigênio de 97% em ar ambiente.
O paciente parece desmazelado e agitado, tem atitude tensa e aumento da
atividade psicomotora. Tem uma equimose no lado direito da região frontal e
apresenta cicatrizes e cortes superficiais recentes bilaterais nos antebraços
(Figura no topo da postagem).
O paciente está taquicárdico, com 110 batimentos por minuto (bpm).
Ausculta cardíaca sem sopros, atrito ou galope. Ritmo cardíaco regular.
Frequência respiratória elevada de 18 incursões respiratórias por minuto
(irpm). Pulmões limpos. Abdome indolor e peristáltico, timpânico à percussão.
Não apresenta assimetria facial e o exame dos pares cranianos está normal.
Ao exame do estado mental, o paciente está vigil e orientado no tempo e
no espaço. Parece deprimido e ansioso, e exibe algum excesso de atividade
motora. Sua fala varia amplamente em volume, ritmo e tonalidade, sendo
flutuante ao longo da entrevista. Sua capacidade de recordação é boa quando
avaliada para memória imediata, recente e distante.
Seu processo de raciocínio é ocasionalmente tangencial, mas pode ser
redirecionado; o conteúdo do pensamento é dominado pelos atuais fatores de
estresse. Ele repete sem cessar: "Não é justo". O paciente refere
depressão e história importante de automutilação. Indagado sobre o seu humor,
ele responde: "Me sinto vazio". Ele apresenta labilidade afetiva.
Parece capaz de vir à consulta, mas nem sempre coopera. Seu senso crítico é
pobre a limitado, pois aparentemente minimiza a importância do próprio
comportamento. Sua capacidade de julgamento também é pobre. O paciente nega
alucinações auditivas e visuais.
O eletrocardiograma (ECG) revela frequência cardíaca de 110 bpm, sem
outras alterações. A tomografia computadorizada de crânio sem contraste é
normal, sem indícios de acidente vascular encefálico, lesão de massa ou
sangramento. Os resultados do exame toxicológico de urina são negativos. Exame
de urina dentro dos limites normais. Hemograma completo, bioquímica e níveis do
hormônio estimulante da tireoide dentro dos intervalos de referência.
Com base nesses achados, qual dos diagnósticos a seguir é o mais
provável?
(a) Transtorno bipolar
(b) Transtorno de ajustamento
(c) Transtorno de personalidade histriônica
(d) Transtorno de personalidade borderline
(e) Transtorno de estresse pós-traumático
Caros leitores, respondam nos comentários. Quando houver um comentário, ou mais, postarei o diagnóstico e concluirei a publicação do caso clínico.