22 de setembro de 2024

ETARISMO E ATENÇÃO À SAÚDE

 

No seminário sobre etarismo e atenção à saúde, apresentado pela turma 117 do curso de Medicina da UFPB, o grupo composto por Gabriele, Maria Luisa, Luisa, Aoliabe e Maria Clara, abordou questões essenciais sobre a discriminação e os desafios enfrentados pelos idosos no acesso e no cuidado com a saúde.

Exposição 
Luisa iniciou a apresentação utilizando um recorte do filme "Up! Altas Aventuras", uma animação que conta a história de um idoso em um momento de transição de vida após a perda da esposa. A cena escolhida ilustrou o impacto emocional dessas mudanças, refletindo as dificuldades que muitos idosos enfrentam ao se depararem com novas realidades. 
Em seguida, Gabrielle deu continuidade ao tema discutindo a discriminação institucional, interpessoal e autoimposta, destacando que muitas vezes os idosos têm sua autonomia prejudicada, inclusive em consultas médicas, quando outras pessoas falam por eles, mesmo quando poderiam exercer seus direitos. Gabrielle mencionou o Relatório Global sobre Etarismo, que revela que 50% dos idosos sofrem atitudes discriminatórias que afetam sua saúde, e também discutiu a presença de idosos no mercado de trabalho, exemplificando com o caso da modelo de 73 anos chamada Rosa Saito. Ela pontuou que a discriminação contra idosos em todas as esferas é uma violação aos direitos humanos.

Maria Heloísa seguiu com uma exposição sobre os maus-tratos sofridos pelos idosos, abordando diversos tipos de violência, como abuso patrimonial e financeiro, frequentemente cometidos por familiares. Ela citou o Estatuto do Idoso e ressaltou a falta de atenção às necessidades dessa população, inclusive quanto à sua sexualidade. Além disso, mencionou o "Junho Violeta", movimento que alerta para os diferentes tipos de violência praticadas contra pessoas idosas, exemplificando com um caso recente de um idoso que morreu após ser violentamente agredido. Maria Heloísa reforçou a necessidade de suspeição nos atendimentos de saúde, alertando que negligência e discriminação podem culminar em violência psicológica e física.
Luísa abordou a exclusão digital dos idosos, mencionando um estudo que analisou os efeitos do uso do computador na cognição, estado emocional, qualidade de vida e habilidades manuais dos idosos. Ela destacou que as dificuldades enfrentadas por essa população são, em grande parte, de origem física e orgânica, com consequências significativas para a qualidade de vida. Além disso, mencionou a Fundação de Apoio ao Deficiente (FUNAD) e os desafios que os idosos enfrentam no acesso a serviços dessa instituição, principalmente relacionados ao uso de tecnologia para encaminhamentos online.

Aoliabe tratou da formação médica voltada para o cuidado com os idosos, criticando a deficiência na capacitação dos profissionais para lidar com essa população. Ela destacou que o rodízio em geriatria no Hospital Universitário Lauro Wanderley é opcional para os alunos do internato, o que pode impactar sua formação. Aoliabe compartilhou o caso de uma amiga que acompanhou a avó em uma consulta na Unidade de Saúde da Família, onde foi prescrito um ansiolítico inadequado para sua idade. Ela reforçou a importância da presença de geriatras nas equipes de atenção primária.
Por fim, Maria Clara abordou a saúde mental dos idosos, discutindo os fatores biológicos, psicológicos e sociais que influenciam o bem-estar dessa população. Ao encerrar o seminário, foi realizada uma dinâmica interativa com um quiz no aplicativo Kahoot, envolvendo todos os presentes na revisão sobre os conteúdos apresentados.
Também participei do Quiz com o nome de “Dona Anésia”, uma personagem criada pelo cartunista Will Leite. Ela é uma senhora rabugenta e franca, conhecida por suas críticas ácidas e certeiras. Os participantes do seminário não perceberam esse nome peculiar, possivelmente porque minha pontuação no teste ficou em apenas 3.999 pontos, não alcançando o pódio!...


Discussão
A discussão do seminário sobre etarismo na saúde começou com Sadrak relembrando o livro "O Demônio do Meio-Dia", que aborda a melancolia de uma idosa, e compartilhou uma experiência pessoal relacionada à sua avó, que sofria superproteção familiar. Rebeca complementou com a questão da geriatria, mencionada por Aoliabe, destacando a prescrição inadequada de medicamentos para idosos, como o uso automático de Memantina para déficits cognitivos. Ela também lembrou de dois livros de Ana Cláudia Quintana, que abordam o processo de envelhecimento e a importância de um acompanhamento geriátrico a partir dos 50 anos, ressaltando a melancolia no contexto da morte. Rebeca mencionou o conceito de testamento vital, em que a família, muitas vezes, toma conta da consulta, uma questão mencionada por Maria Heloísa. Felizardo levantou a questão do etarismo autoimposto, associando-o ao filme "O Pior Vizinho do Mundo", exemplificando como os idosos podem internalizar preconceitos. Um exemplo trazido foi o de um vídeo sobre uma estudante de 40 a 50 anos que apareceu em A repercussão do vídeo em que estudantes jovens do curso de Biomedicina de uma universidade particular de Bauru-SP zombaram de uma colega de 40 anos traz à tona questões importantes relacionadas ao etarismo, à cultura de bullying e ao ambiente acadêmico. Rebeca ainda falou sobre a corrida durante a velhice, relacionando com o médico e escritor brasileiro de 81 anos, Dráuzio Varela, que tem participado de várias corridas e eventos esportivos, reforçando seu compromisso com um estilo de vida ativo, enquanto Aoliabe lembrou que há alunos de 50 a 55 anos nas turmas de graduação em medicina da UFPB.
Felipe destacou a contradição entre o aumento da expectativa de vida e o aumento do preconceito contra idosos. Samuel compartilhou uma lembrança de sua avó, de 87 anos, que, após receber um elogio sobre sua beleza, rechaçou-o dizendo que "velha não é bonita", exemplificando o etarismo autoimposto. Luísa, também expositora do seminário, mencionou atrizes como Cláudia Raia, que teve uma gravidez após os 50 anos, e Mônica Martelli, que viveu momentos importantes fora do "tempo socialmente esperado". Rômulo elogiou o grupo pela apresentação e falou sobre sua convivência com a avó, que tem vergonha de se expressar nas consultas e resiste à inclusão digital. Letícia Meira reforçou a relevância do tema, lembrando como os idosos são frequentemente negligenciados e infantilizados, mencionando uma youtuber chamada Sônia Maite que aborda essas questões.
Karolina trouxe à tona a negligência em relação à dosagem de medicamentos para idosos, comparando com a atenção dada às crianças. Maria Eduarda compartilhou que as avós viúvas tendem a se autolimitar, como percebeu com sua própria avó, menos preocupada com sua qualidade de vida após a viuvez. Letícia Fonseca apontou a fragilidade dos idosos e como, muitas vezes, os próprios filhos limitam suas atividades, resultando em quadros de depressão, especialmente durante a pandemia. Emanuel falou sobre o mito envolvendo a sexualidade na velhice e os golpes contra o patrimônio sofridos por idosos. Hugo discutiu o descompasso entre a educação médica e o aumento da expectativa de vida, enquanto Ramon mencionou "A Sociedade do Cansaço", do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, argumentando que, por deixarem de produzir, os idosos são marginalizados.
Flávia relembrou que Rebeca havia comentado que sua avó foi à geriatria aos 50 anos, mas que ela não conseguia imaginar sua própria mãe fazendo isso aos 40. Mabel ressaltou que o respeito aos idosos é uma questão cultural, e Marcos observou que os jovens com sinais de calvície geralmente começam tratamentos precoces, por motivação estética e como um tipo de repulsa a aspectos relacionados ao envelhecimento. Ruth falou sobre uma blogueira de 73 anos que desafia estereótipos de vestimenta para idosos, Rose Saito, enquanto Guilherme finalizou mencionando o isolamento social e a marginalização dos idosos dentro de suas próprias famílias.

Feedback da Moderadora
A análise do seminário sobre etarismo na saúde revela um debate rico e multifacetado, que abrange experiências pessoais, reflexões teóricas e referências culturais, trazendo uma compreensão mais profunda sobre como o etarismo se manifesta e é internalizado na sociedade. Vou pontuar os aspectos mais interessantes e fundamentá-los teoricamente:
1. Superproteção e Infantilização de Idosos
O relato de Shadrach, sobre a superproteção familiar sofrida pela avó, e de Letícia Fonseca, sobre como filhos limitam as atividades dos pais idosos, traz à tona o conceito de infantilização, onde os idosos são tratados como incapazes de tomar decisões ou de viver de maneira independente. Isso se conecta com o que Letícia Meira chamou de negligência, onde a sociedade muitas vezes infantiliza ou ignora as necessidades dos idosos. Segundo Gullette (2004), essa infantilização reduz a autonomia dos idosos e pode contribuir para a depressão e perda de qualidade de vida, o que foi destacado por Felipe ao mencionar o aumento do preconceito contra idosos, apesar da maior expectativa de vida.
2. Prescrição inadequada e atenção médica
Rebeca e Carolina abordaram a questão da prescrição inadequada de medicamentos para idosos, como o uso automático de memantina para déficits cognitivos, e a negligência em relação à dosagem de medicamentos. Esses exemplos refletem um problema importante na geriatria, que é a iatrogenia – danos causados por tratamento médico inadequado, frequentemente relacionado à falta de formação médica sobre o envelhecimento saudável. Segundo Pilotto e Martin (2018), a educação médica precisa evoluir para lidar com a complexidade das condições geriátricas, algo que Hugo também mencionou ao discutir o descompasso entre a educação médica e o envelhecimento da população.
3. Etarismo autoimposto
O conceito de etarismo autoimposto, discutido por Rebeca e exemplificado por Samuel, quando sua avó rejeitou um elogio por acreditar que "velha não é bonita", reflete a internalização do preconceito. De acordo com Lévy (2009), quando os idosos internalizam estereótipos negativos sobre o envelhecimento, isso pode afetar negativamente a sua autoestima e saúde, levando a um ciclo de autoexclusão e retração social. Emmanuel também trouxe a questão do mito da sexualidade na velhice, outro aspecto de como os idosos internalizam limitações sociais impostas, que reforçam sua marginalização.
4. O papel das representações culturais e midiáticas
A menção a atrizes como Claudia Raia e Mônica Martelli, por Luísa, que desafiam os estereótipos de idade ao vivenciarem gravidezes e momentos importantes após os 50 anos, reflete o impacto que as representações culturais têm na percepção sobre o envelhecimento. O exemplo de uma blogueira que desafia estereótipos de vestimenta para idosos, trazido por Ruth, também destaca como figuras públicas podem romper com os estigmas associados à velhice. A gerontologia social enfatiza a importância das representações culturais em moldar percepções sobre o envelhecimento, mostrando que as normas sociais sobre o que é “apropriado” para cada idade são construções que podem ser desafiadas.
5. Isolamento social e marginalização dos idosos
Guilherme e Ramon destacaram o isolamento social e a marginalização dos idosos em suas famílias e na sociedade, temas também discutidos em A Sociedade do Cansaço, de Byung-Chul Han, mencionada por Ramon. Isso está relacionado ao conceito de invisibilidade social dos idosos, amplamente discutido em estudos sobre envelhecimento. Segundo Victor (2012), a exclusão social dos idosos muitas vezes resulta de uma sociedade que valoriza a produtividade e marginaliza aqueles que já não contribuem economicamente, reforçando o etarismo.

Considerações Finais
O seminário explorou de forma abrangente o etarismo em suas várias dimensões, com discussões baseadas em experiências pessoais, literárias e culturais. Teoricamente, os tópicos abordados remetem a conceitos fundamentais da gerontologia e gerontologia crítica, como infantilização, iatrogenia, etarismo autoimposto, invisibilidade social e a importância de representações culturais positivas na construção de novas narrativas sobre o envelhecimento. Essa discussão não só ilumina as desigualdades enfrentadas pelos idosos, mas também desafia as normas sociais e médicas que perpetuam o preconceito etário.


Referências
GULLETTE, M. M. Aged by Culture. Chicago: University of Chicago Press, 2004.

PILOTTO, A.; MARTIN, F. C. Comprehensive Geriatric Assessment. Cambridge: Cambridge University Press, 2018.

LEVY, B. R. Stereotype embodiment: a psychosocial approach to aging. Current Directions in Psychological Science, v. 18, n. 6, p. 332-336, 2009.

VICTOR, C. R. Loneliness in later life. In: Loneliness: Evidence and Interventions. Age UK, 2012.

HAN, B. C. A Sociedade do Cansaço. Petrópolis: Editora Vozes, 2017.